sábado, maio 19, 2012

A bomba grega - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 19/05


Ruim para os gregos, ruim para todos. Se a Grécia for para o desastre, não irá sozinha. Se o país deixar o euro e partir para o calote completo, o custo para os credores públicos e privados será muito alto e o impacto poderá ultrapassar os limites da Europa. Cálculos assustadores começam a circular, divulgados por fontes oficiais e do setor financeiro. Estimativas indicam perdas de centenas de bilhões de euros para bancos e governos de países-membros da união monetária. A especulação mais alarmante apontou danos próximos de 1 trilhão. Há incerteza quanto aos números, mas dois pontos parecem muito claros: 1) é muito importante manter a Grécia vinculada ao euro ou, no mínimo, evitar uma saída atabalhoada; 2) na pior hipótese, nenhum país europeu ficará imune aos danos e as consequências poderão atingir outras partes do mundo.

A Grã-Bretanha poderá ser empurrada para uma recessão se a Grécia abandonar o euro e as dificuldades do sistema financeiro se agravarem, disse o chefe do Escritório para Responsabilidade Orçamentária, Robert Chote. Esse escritório, criado originalmente pelo Partido Conservador em 2009, foi oficialmente vinculado ao Tesouro em 2011 e é responsável pelas previsões econômicas do governo. Esse temor talvez seja a principal motivação do primeiro-ministro David Cameron para cobrar dos governos da zona do euro uma solução mais rápida e segura para o problema grego. Também partiram de instituições financeiras britânicas várias estimativas dos possíveis prejuízos de um calote desordenado.

Houve uma inequívoca mudança na conversa a respeito da situação da Grécia, depois de fracassadas, em Atenas, as tentativas de formação de um governo. Em primeiro lugar, começou-se a falar mais abertamente sobre a hipótese de uma fratura na união monetária. Até funcionários vinculados ao Banco Central Europeu reconheceram haver discutido o assunto. Em segundo lugar, alterou-se o tom dos comentários. As pressões sobre os gregos continuaram fortes e o recém-eleito presidente francês, François Hollande, entrou no coro, ao lado da chanceler alemã, Angela Merkel. Mas, ao mesmo tempo, os sinais de temor ficaram bem mais fortes.

Até há pouco, o tom era dado pelo ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäeuble, num estilo um tanto arrogante: a saída da Grécia custará muito mais para os gregos do que para os demais povos da Europa. Essa afirmação pode continuar verdadeira, mas os demais europeus se mostram muito mais intranquilos, agora, diante dessa possibilidade. Na sexta-feira, a chanceler da Alemanha telefonou ao presidente da Grécia, Karolos Papoulias, "para esclarecer a posição alemã". Além disso, sugeriu ao primeiro-ministro interino, Panagiotis Pikramenos, um referendo sobre a permanência na zona do euro. O ministro de Relações Exteriores, Guido Westerwelle, telefonou ao colega grego, Petros Molyviatis, também para um esclarecimento: cobrou o dever de casa, mas reafirmou o apoio de seu país à Grécia.

O desastre só será evitado se os cidadãos gregos, na eleição parlamentar marcada para 17 de junho, escolherem o cumprimento dos acordos com os credores e a permanência na zona do euro. Já foram beneficiados com o perdão parcial da dívida com os bancos - algo entre 50% e 70% do valor real -, mas ainda terão de fazer muito sacrifício para arrumar suas contas. Talvez nem sejam capazes de ir longe, nesse caminho, sem algum crescimento econômico nos próximos dois anos. Mas a Comissão Europeia tem dado sinais de alguma flexibilidade, se os acordos forem mantidos.

Também do lado grego há indícios de reavaliação dos custos de uma saída desastrada. Uma pesquisa divulgada na quinta-feira mostrou o partido conservador Nova Democracia com 26,1%, pouco à frente do esquerdista Syriza, o mais importante defensor do rompimento dos acordos. Se o Nova Democracia mantiver a vantagem, poderá provavelmente compor um governo com o socialista Pasok e manter o país na união monetária. Se essa expectativa for desmentida, será difícil conter os danos. A corrida aos bancos em vários países, nos últimos dias, foi apenas uma amostra das possíveis consequências.

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