quarta-feira, maio 16, 2012
As amarras - ANTONIO DELFIM NETTO
FOLHA DE SP - 16/05
O problema da taxa de juros acompanha a sociedade há ao menos 4.000 anos! Já no Código de Hamurabi, quase 2.000 anos antes da nossa era, encontramos taxas fixadas porque registravam grande variabilidade: 33,33% para empréstimos de cereais e 20% para empréstimos de prata -ambos, naquele tempo, exercendo a função de meio de pagamentos.
Quinze séculos depois o juro foi estigmatizado por Aristóteles, que o condenou duramente porque ele era "moeda parida pela própria moeda", um fato contra a natureza...
Apesar de condenado pelos canonistas medievais, nunca deixou de existir. O laxismo da igreja em relação à contradição de condenar o juro, mas aceitar que seus amigos, os banqueiros florentinos, enriquecessem com ele, levou Lutero a atacá-los para atingir o papa.
Foi só nos meados do século 19 que se reconheceu explicitamente -com o apoio da economia política nascente, que acreditava em leis naturais- que a lei dos homens é impotente para impor limite fixo permanente à taxa de juros.
O nível da taxa de juros real não é uma constante da natureza. Ela depende fundamentalmente das instituições que garantem a segurança do credor, da política monetária e do comportamento fiscal do governo.
O Brasil construiu condições para deixar de ter a taxa de juro real teratológica produzida pelo desespero de alguns momentos e que se perpetuou pela cômoda política monetária equivocada que a seguiu.
É por isso que devemos apoiar a firme decisão do governo de enfrentar o problema do juro real. Primeiro, com a mudança da política monetária e, agora, pela correção dos fatores impeditivos de sua livre determinação pelo mercado.
Ter como objetivo uma taxa de juro real parecida com a internacional é mais do que saudável, é absolutamente necessário para uma melhor e mais eficiente organização produtiva geradora do crescimento econômico. Isso não tem nada a ver com "guerra" contra banqueiro. Tem a ver com as restrições institucionais construídas pelo próprio governo e que hoje vão sendo superadas.
A coragem de enfrentar com firmeza o falso dilema das cadernetas de poupança com medidas cuidadosas e sem traumas, depois de ter resolvido o grave problema da aposentadoria do setor público, sugere a disposição do governo de prosseguir na superação das outras "amarras".
Entre esses entraves estão: o aperfeiçoamento do sistema tributário, a efetiva criação de um mercado de capitais, a ampliação das concessões, o fortalecimento da liberdade dos trabalhadores para que a livre negociação de acordos coletivos prevaleça acima das leis sem violar os seus direitos constitucionais etc.
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