segunda-feira, abril 16, 2012
Políticas de Estado - EDITORIAL O GLOBO
O Globo - 16/04/12
Ainda é muito cedo, do ponto de vista da História, para uma análise sólida deste período de 17 anos em que blocos políticos liderados pelo PSDB e PT têm conduzido o país. A luta político-partidária dificulta a visão serena necessária para o entendimento do processo de transformação em curso. Mas há algumas constatações que, mesmo sem serem consensuais, não deverão ser revistas. Uma, óbvia, é que tucanos e petistas, com origem na esquerda - na social-democracia europeia e no obreirismo comunista-cristão -, para chegarem ao poder precisaram construir amplas alianças, com a atração de legendas conservadoras de todos os naipes.
Outra constatação é sobre a política econômica. Coube aos dois grupos políticos manejar com a herança de problemas deixados pela ditadura militar e não resolvidos no primeiro governo da redemocratização, de José Sarney. Caberia aos dois governos de Fernando Henrique Cardoso debelar a superinflação - um fato histórico - e lançar as bases para a estabilização econômica. O engenhoso Plano Real conseguiu quebrar a espinha da inércia inflacionária - o aumento de preços do passado garantia as remarcações no futuro -, mas ficou, em certa medida, prisioneiro de um regime de câmbio quase fixo, um perigo, como ficaria demonstrado na explosão da Argentina em 2001. E, no momento, pela crise grega, espanhola, italiana etc. A ruptura abrupta com este regime no início de 1999, quando o país aportou mais uma vez nas enfermarias do FMI, permitiu a adoção do sistema de câmbio flutuante e a fixação de metas de superávit primário, para impedir o descontrole das contas públicas. Vêm daí, também, as metas de inflação. Como fecho, foi criada a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), para conter a gastança histórica dos entes federativos.
O crescimento da candidatura de Lula, na campanha de 2002, agitou os mercados, pois o PT sempre fora contra "tudo isso que está aí". O dólar disparou e gerou grandes pressões inflacionárias. Para sorte do país e do governo petista, Lula assumiu tendo assinado a Carta ao Povo Brasileiro, em que se comprometia a não fazer alterações radicais, romper contratos. A LRF, mesmo tão criticada, foi mantida, felizmente. Foi possível, então, debelar as pressões inflacionárias, devido ao uso de instrumento clássico de política econômica, tão demonizado por petistas: controle de gastos. O reconhecimento implícito do governo petista de que não havia - e não há - alternativa melhor ao modelo de gerenciamento da economia via câmbio flutuante, metas de inflação e a obtenção de superávits primários marcou um grande amadurecimento na política brasileira. Surgiram políticas de Estado e não só de governos.
Com a crise mundial deflagrada em 2008, os pendores estatistas dos quadros do PT no governo ganharam espaço. Foi ressuscitada a política de transferência de dinheiro público subsidiado para grandes grupos nacionais via BNDES, adotada no governo Geisel, na ditadura, com maus resultados. Mas há sérios constrangimentos, nas próprias contas públicas, a um modelo alternativo, de figurino intervencionista. Mesmo o projeto de gastos assistenciais, grande marca da Era Lula, pode naufragar se a estabilização da economia for abalada por qualquer voluntarismo fiscal. Agora, por meio do governo Dilma Rousseff, a aliança política sob liderança petista precisa dar sequência às mudanças por meio de reformas inevitáveis. A da previdência do funcionalismo, recém finalizada, é apenas uma delas.
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