domingo, abril 29, 2012

O sonho de Dilma - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 29/04/12


Todos os presidentes quando assumem o poder passam horas acordados apenas pensando no que será possível deixar como um legado às futuras gerações ou aos seus sucessores. No Brasil, desde a redemocratização, os presidentes deixaram claro seus sonhos. E nenhum deles, mesmo no caso de governos de continuidade, deixou de conjugar o verbo mudar. Nem mesmo Dilma Rousseff.

Mas, antes de entrar nos sonhos de mudança da presidente, vale lembrar os de seus antecessores. O de José Sarney era consolidar a democracia e acertar a economia. Cumpriu o primeiro, mas, por conta da política e do embalo de seu partido na onda boa da primeira etapa do Plano Cruzado, adiou decisões e deu no que deu. A inflação voltou e o prestígio de Sarney foi pelo ralo à época. Fernando Collor, que chegou querendo mudar tudo, sonhou modernizar o Brasil, deixando para trás as “carroças” como ele se referia aos carros nacionais. Mas, como não mexeu nas relações políticas que construiu nos tempos de Alagoas, terminou fora.

Itamar Franco, que teve pouco tempo de governo, sonhou em estabilizar a economia, resgatando a história do ponto em que Sarney falhou. Conseguiu com a ajuda de Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda. FHC, quando presidente, sonhou em entregar um país organizado do ponto de vista administrativo, econômico e social. Mais leve do ponto de vista da gestão pública, com agências reguladoras técnicas. Conseguiu em muitos pontos, mas o projeto era tão amplo e os interesses políticos de sua base de apoio tão diversos que parte do sonho ficou pelo caminho.

Depois, veio Lula. Já chegou declarando que, se ao fim de seu governo, os brasileiros conseguissem ter três refeições por dia, ele se daria por satisfeito. Investiu tudo o que pôde nessa construção, de redistribuir renda. Outro sonho que ele tentou realizar tão logo assumiu o poder, em 2003, foi justamente mudar a relação política. No início do governo, Lula se deu ao luxo de dispensar o PMDB de Michel Temer em grande estilo, recuando num acordo fechado pelo então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Por falar em PMDB…
O sonho de Lula na seara política teve que ser interrompido pela circunstância do mensalão. Quando o caso veio à tona, não sobrou alternativa, a não ser reforçar a base parlamentar atraindo a parte do PMDB que havia sido preterida no início do governo. Não por acaso, Dilma seguiu para a Casa Civil e Edison Lobão acabou no Ministério de Minas e Energia. Lula governaria com tanta intimidade com o PMDB e a relação ficou tão boa que Temer assumiu a vaga de vice na chapa de Dilma.

Diante de tanta união, Dilma não teve meios de dar uma de Lula e dispensar o PMDB na largada. Nem poderia. Afinal, o partido foi seu parceiro na vitória e queria ser também no governo. Mas, ela deu um jeitinho de deixar esses “homens meigos” com menos espaço do que detinham na época de Lula. E, desde o início do governo, vai, aos poucos, tentando mudar — olha a palavra aí de novo — a relação com os partidos. (Inclua-se aí também o próprio PT).

Por falar em mudança…
Entre os desejos de Dilma, além de dar continuidade e reforço aos projetos sociais, está o de retomar o projeto de Lula do ponto anterior ao período do mensalão, de não precisar ceder tanto espaço aos partidos aliados ou mesmo ao PT. Basta ver as recentes mudanças na administração da Petrobras, com a troca de diretores indicados por partidos políticos. Sabe-se que a área do petróleo concentra muitas pessoas de fora do quadro para cargos de direção — caso de Sérgio Machado no comando da Transpetro. Mas, aos poucos, e dentro do possível — não dá para alterar tudo —, Dilma vai mudando essa realidade. Se para melhor, o futuro dirá.

Da mesma forma que Lula se viu obrigado a ceder quando do mensalão, ainda é cedo para dizer se Dilma não será levada pelo mesmo caminho, por conta da CPI do Cachoeira, ou por outra circunstância. Até aqui, ela não precisou abrir tanto espaço aos partidos, embora ceda um cargo aqui, outro ali — como foi o caso da direção-geral do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) há alguns dias. E, nesse estilo de liberar cargos a conta-gotas às indicações partidárias ao mesmo tempo em que tira outros, a presidente só viu crescer a sua popularidade. Mas o dito popular “sonhar não custa”, em política não se aplica. Às vezes, o preço pode ser alto. Vejamos o que acontecerá com o de Dilma.

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