terça-feira, abril 10, 2012

Hora da verdade - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 10/04/12


O documento divulgado no último domingo pelo Correio mostra que o país precisa da Comissão da Verdade e logo, enquanto alguns personagens ainda estão por aí para contar o que sabem

Se há algo que todos devem persistir quando se trata especialmente da história de um país é a verdade. E, geralmente, só conseguimos chegar a esse estado das coisas quando confrontamos diversas fontes e verdades de cada segmento envolvido num determinado fato. Por isso, ninguém entende por que dentro do governo a demora em instalar a Comissão da Verdade.

Do jeito que a coisa vai, a ela parece ter sido votada apenas para “inglês ver”, como se diz por aí. Houve muita pressa em aprová-la, para que a presidente pudesse chegar à Conferência Anual das Nações Unidas, ainda no ano passado, levando o texto na bagagem. Não foi possível, mas, assim que ela regressou de Nova York, não demorou muito e os congressistas lhe entregaram o que o governo parecia querer tanto: a Comissão da Verdade.

Lá se vão quatro meses da criação da Comissão e ela continua no papel. O golpe de 1964 fez mais um aniversário, completou 48 anos, e aqui estamos nós, esperando... O documento divulgado no último domingo com exclusividade pelo Correio mostra que o país precisa da Comissão da Verdade e logo — enquanto alguns personagens ainda vivem com saúde para contarem o que sabem. A desculpa de que não há mais nada a investigar, ou que os documentos já são todos conhecidos, não cola. Prova disso foi a peça divulgada no último domingo.

Vem a calhar a comissão a ser instalada hoje dentro do Congresso Nacional, com o intuito de começar o trabalho que já deveria estar em curso pela Comissão da Verdade. Assim, quem sabe, ajuda a diluir resistências para que o trabalho seja feito de forma natural, dando a todos a verdadeira história. Pelo menos, não custa nada tentar.

Por falar em Congresso e em verdade...
Entre os parlamentares há quem considere insustentável deixar de instalar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os negócios e as relações do empresário do jogo do bicho Carlos Cachoeira. Isso porque o Congresso precisa tentar tomar alguma atitude para ficar de bem com o eleitorado, depois da série de reportagens publicadas pelo Correio a respeito dos 14º e 15º salários e, para completar, as notícias que apareceram na tevê sobre as Assembléias Legislativas.

Todas essas notícias, avaliam os políticos, só fazem com que o eleitorado dê razão à presidente Dilma Rousseff na hora de negar nomeações aos partidos. Ou eles entram na onda e buscam a verdade de seus próprios colegas ou continuará como está: apenas Dilma Rousseff brilhando como a estrela do show e os congressistas, de maneira geral, na berlinda.

Há quem, no entanto, não deixe de martelar o passado recente: enquanto Itamar Franco brilhava como o presidente brasileiro mais popular de sua época, os congressistas empreenderam a CPI dos Anões do Orçamento, que cortou cabeças no Congresso. Naquele período, o Plano Real, o carisma do então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, e a popularidade de Itamar tiraram a oposição da ribalta. À época, o campo oposicionista era representado pelo PT de Lula, que perdeu a eleição para Fernando Henrique no primeiro turno.

Esse raciocínio tem levado um grupo dentro do Congresso a ver na CPI uma jogada de risco. Ninguém se esquece da CPI do Orçamento ou CPI dos Anões, como você preferir. Naquela época, houve uma tentativa de envolver o governo. O então chefe da Casa Civil, Henrique Hargreaves, foi chamado a depor. Pediu afastamento do cargo, prestou depoimento, e, pouco tempo depois, estava de volta ao governo. Seu caso é lembrado até hoje como exemplo de conduta política.

Diante disso, há quem conclua, olhando o cenário atual, que, se a CPI passar à margem do governo, a popularidade da presidente continuará colossal e a comissão desgastará apenas os congressistas. O problema é que, pelo andar da carruagem, o Congresso não tem como escapar da CPI como mecanismo de autodefesa. E isso, conforme alguns já concluíram, é uma grande verdade.

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