sábado, abril 07, 2012

Hiperativismo cego na política industrial - SANDRA POLÓNIA RIOS e PEDRO DA MOTTA VEIGA


O Estado de S.Paulo - 07/04/12


A discussão sobre a crise da indústria de transformação no Brasil vem evoluindo num sentido positivo. O mesmo não se pode dizer das respostas do governo para lidar com os problemas da indústria. Até muito pouco tempo, a apreciação cambial parecia ser, na visão dos economistas próximos ao governo, a grande, se não a única, responsável pelas dificuldades da indústria e pelo que apressadamente e sem maior critério se identifica como um processo de desindustrialização. Mais recentemente, mesmo esses economistas passaram a reconhecer a existência de outros fatores, de natureza estrutural, que contribuiriam para o fraco desempenho da indústria nos mercados doméstico e externo. Haveria problemas de competitividade, fragilidades intra e intersetoriais de diversas ordens, problemas sistêmicos, como o alto custo tributário - reconhecido pela própria presidente. Finalmente, o tema da baixa e pouco dinâmica produtividade da indústria reapareceu nos debates.

Constatada a relevância de fatores não conjunturais para o desempenho recente e as perspectivas futuras da indústria, poder-se-ia supor que a agenda de competitividade e produtividade da indústria, submersa há alguns anos, voltaria à tona. Isso pode ser até verdade no que se refere ao debate público sobre o tema, mas a panóplia de medidas sucessivamente lançadas pelo governo em nome da defesa da indústria brasileira segue uma lógica de "emergência" que tudo justifica, inclusive a desconsideração dos impactos no médio prazo das medidas de curto prazo. Mesmo medidas voltadas para atacar um problema estrutural - o alto custo dos encargos sociais na indústria - são incluídas no menu governamental em bases ad hoc e sob modalidades que implicam importantes subsídios do Tesouro e aumento de proteção à indústria.

A linha de defesa da política do governo pode até admitir a presença de fatores não conjunturais por trás da crise da indústria, mas justifica o hiperativismo dos últimos meses em nome da "emergência" e da necessidade de agir rapidamente, "antes que seja tarde".

É possível que uma bateria de subsídios, isenções e proteções alivie a situação de curto prazo de algumas empresas ou setores. Mas essa é uma política custosa, sob vários pontos de vista, e não só sob a ótica fiscal. Afinal, como revelou um recente estudo da Secex, os maiores exportadores são também os maiores importadores. E uma enorme parcela das importações brasileiras é constituída de insumos, matérias-primas, bens intermediários e de capital. Ou seja, são importações feitas pelo próprio setor produtivo para as suas necessidades (de produção). Nada a ver com uma farra de compras de "supérfluos".

Portanto, essas medidas "emergenciais" não são neutras em relação a objetivos de médio e de longo prazos, como o aumento da produtividade e da competitividade da indústria - única solução para que esta sobreviva e cresça num cenário diferente do modelo argentino atual. Além de não empurrarem a indústria em direção a um ajuste compatível com uma abertura da economia, que continua a ser muito limitada sob qualquer critério, elas desestimulam esforços de busca de eficiência e de maior produtividade.

As novas medidas do Plano Brasil Maior, anunciadas esta semana, são mais uma mostra do hiperativismo cego que tem caracterizado a política industrial brasileira. É uma combinação de medidas requentadas de pacotes anteriores, com expressiva ampliação de subsídios e medidas de proteção. Os codinomes dados às medidas de defesa comercial incluídas no documento de divulgação do pacote são reveladores: Operação Panos Quentes III; Operação Passos Largos e - a melhor de todas - Operação Fronteira Blindada. Parece que estamos numa cruzada contra as importações.

Ao fim e ao cabo, a questão é: alguém realmente acredita que a enxurrada de medidas governamentais de fomento e proteção ajudará a indústria brasileira a se modernizar e tornar-se mais eficiente para enfrentar os desafios da competição externa e da moeda apreciada - que também são fenômenos estruturais e não nos abandonarão no médio prazo?

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