quinta-feira, abril 05, 2012
Dá para consertar - GUSTAVO MORELLI
O GLOBO - 05/04/12
Em meio à sucessão de denúncias que envolvem o governo e tomam as páginas dos jornais, poucos arriscariam discordar de que um dos grandes gargalos para o desenvolvimento do país é a qualidade da gestão pública, tanto no Executivo, no Legislativo, como no Judiciário. Nesta primeira semana de abril está sendo realizado em Brasília o II Congresso Nacional de Gestão Pública. O momento é oportuno para a reflexão em torno dos problemas que permeiam a gigantesca e complexa estrutura da administração pública brasileira, onde as ações governamentais são implementadas por um conjunto de órgãos que interagem de forma precária entre si, mesmo quando há disponibilidade de recursos financeiros. A baixa capacidade de resposta da administração pública no atendimento às demandas da população é uma das maiores evidências de que há inúmeros desafios a serem superados.
O fato novo e portador de futuro é que a cobrança da sociedade civil por mais eficiência na gestão pública e transparência das instituições está se acentuando. A mobilização social para a aprovação da Lei da Ficha Limpa e a decisão do Supremo Tribunal Federal confirmando a competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça são sinais de que os brasileiros querem construir uma nova sociedade. Há uma maior valorização da gestão pública voltada para resultados e, felizmente, os exemplos de gestão inovadora e eficaz se multiplicam em vários cantos do país. Estados como Minas Gerais, Espírito Santo e Pernambuco e prefeituras como a de Belo Horizonte e a do Rio de Janeiro têm investido fortemente na gestão e colhido bons resultados.
Contudo, ainda não se conseguiu dar o passo decisivo e suficiente para conduzir o Brasil a um patamar mais elevado de gestão pública. O cidadão é constantemente desrespeitado na alocação do dinheiro público, compromissos assumidos nos planos de governos não são cumpridos, o saneamento básico alcança patamares inaceitáveis, a qualidade da educação e dos serviços de saúde deixa muito a desejar, os casos de desperdício de recursos públicos se repetem e a sociedade ainda convive com níveis intoleráveis de corrupção.
A gestão pública é hoje um dos condicionantes ao desenvolvimento do país. Infelizmente o Governo federal não foi capaz, nos últimos oito anos, de construir uma agenda para além dos aumentos salariais e melhorias de gestão pontuais. A adoção de um modelo de gestão profissionalizado e orientado a resultados requer método e pertinência. É preciso romper barreiras na busca de inovações capazes de ampliar a geração de valor público à sociedade.
A boa gestão exige visão de longo prazo que seja capaz de orientar, de fato, as ações governamentais e induzir projetos privados. Há bons exemplos de governos e prefeituras que adotaram uma visão de longo prazo. São administrações com planos com horizonte de 20 anos, que orientam a escolha de prioridades — evitando a dispersão dos meios financeiros, humanos e do tempo dos gestores — e que são desdobradas em projetos públicos, privados e em parceria, não limitados ao tempo dos mandatos.
A gestão intensiva orientada por metas e indicadores com impacto no reconhecimento por desempenho dos servidores felizmente está se disseminando. Contudo, no campo da gestão de pessoas, um desafio é atrair profissionais com elevado potencial para a atuação pública. Uma boa prática nesta direção é o intercâmbio de talentos com o setor privado e a sociedade civil.
A ampliação da capacidade de investimento também é parte central desta agenda. Aqui as práticas se organizam em torno de três vertentes: aceleração da execução, ampliação da produtividade do gasto e o desenho de modelos que ampliem a disponibilidade de recursos, a exemplo das parcerias público-privadas, privatizações, concessões e sociedades de propósito específico.
O salto de patamar na gestão, finalmente, requer democratizar mais o poder público, o que implica em transparência e abertura ao dialogo com a sociedade e liderança dos governantes na geração de coalizões, parcerias e mobilizações.
A reforma da gestão pública brasileira requer o estabelecimento de uma estratégia ampla e consistente e os setores estratégicos precisam ser convencidos da centralidade dessa questão. O Brasil está diante de uma grande chance de desenvolvimento que exige o estabelecimento de uma agenda com a identificação do que fazer em uma visão de longo prazo, para promover as transformações necessárias na realidade econômica e social do país. Será preciso acertar o passo no campo da gestão pública para garantir o aproveitamento desta oportunidade histórica.
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