quarta-feira, abril 25, 2012
CPIs, Titanics e canoas - DENISE ROTHENBURG
Correio Braziliense - 25/04/12
Espera-se que a CPI descubra onde a política está falhando ao ponto de precisar se envolver com o crime %u2014 afinal, todos sabem que Cachoeira flerta há tempos com a ilegalidade. Nesse sentido, vamos torcer para que não seja um Titanic, que zarpou com tanta pompa para naufragar num poderoso iceberg
Os congressistas bem que tentaram, mas não conseguiram escapar da CPI. Você leitor mais atento, já tem ouvido por aí que Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) não servem para nada, que só atrapalham o governo e por aí vai. Mas não é sempre assim. Há exemplos de CPIs para todos os gostos. Elas são como barcos. Uns zarpam de forma esplendorosa, caso do Titanic, mas naufragam diante dos obstáculos. Em outros casos, alguém olha e pensa: "Xiiii, essa balsa não chega". E a embarcação atravessa muita maré contrária.
As CPIs das ONGs e a das empreiteiras são exemplos de Titanics. Começaram cheias de pompa e foram sumindo ao longo do processo. O oposto ocorreu com a CPI dos Bancos. Todos achavam que era uma canoa furada. Foi uma das poucas que gerou a prisão de um banqueiro, Salvatore Cacciola, dono do banco Marka, acusado de gestão fraudulenta na época da maxidesvalorização do Real, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso.
Por falar em prisão...
As Comissões Parlamentares de Inquérito não existem para colocar A, B ou C na cadeia. Para isso, há os tribunais e a investigação policial. A CPI "pega" justamente onde o sistema judiciário falha. Na CPI do Orçamento, por exemplo, a ordem dos fatores foi invertida. Primeiro, prendeu-se o economista José Carlos Alves do Santos, acusado de portar dólares falsos e, à época, suspeito do assassinato da própria mulher. Encarcerado, ele decidiu trazer à luz os desmandos que muitos já tinham ouvido falar e, assim, surgiu a CPI.
Geralmente, os escândalos que deságuam em CPI são velhos conhecidos, antes mesmo de instalada uma investigação. A do Orçamento, por exemplo, que surgiu em 1993, poderia ter sido instalada em 1992. Antes da CPI que derrubou o então presidente, Fernando Collor, houve uma série de reportagens a respeito de desvios nas contas da União. Uma pequena cidade no interior da Bahia, Serra Dourada, foi campeã na recepção de recursos para a construção de casas populares. À época, a prefeitura declarou ao governo a utilização de materiais e acabamentos dos quais os casebres entregues à população não sentiram nem o cheiro. E os valores foram pagos. Coincidentemente, a maioria dos vereadores haviam recebido um din-din para fazer campanha ao então deputado João Alves.
Por falar em conhecidos...
O caso Cachoeira não é diferente. Há muito se conheciam suas peripécias com o mundo da política, mais precisamente desde o início do primeiro mandato de Lula, quando surgiu o vídeo de Cachoeira e o então subsecretário de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro Diniz. O que não se sabia era da extensão de suas ligações políticas.
É por aí que a CPI vai. Na política. Espera-se que ela descubra onde a seara está falhando ao ponto de precisar se envolver com o crime — afinal, todos sabem que Cachoeira flerta há tempos com a ilegalidade. Nesse sentido, vamos torcer para que não seja um Titanic, que zarpou com tanta pompa para naufragar num poderoso iceberg. Afinal, se todos os personagens suspeitos a serem investigados nessa comissão se juntarem, é bem capaz de eles conseguirem mesmo transformar a CPI num Titanic. Por isso, prefiro ficar com aqueles que a veem como uma canoinha meio chinfrim. Quando eles acham que as CPIs não apuram nada, é que elas vão longe. O neoinvestigador Fernando Collor que o diga. Ninguém acreditava na CPI do Paulo César Farias e ela deu no que deu.
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