segunda-feira, abril 30, 2012

Canto da sereia dos juros - MARIA INÊS DOLCI

FOLHA DE SP - 30/04/12


Como o consumidor deve agir frente à anunciada -mas não tão ampla quanto faz parecer a propaganda governamental- redução de juros na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil e nas instituições privadas? Com cautela e bom-senso.

Aos que comemoram a redução da Selic para 9%, recordo que somos vice-campeões mundiais em taxas de juros.

E, pior do que isso, os bancos não seguem a taxa básica, que é somente uma referência.

Outro lembrete: os menores juros estão disponíveis para quem põe mais dinheiro no banco.

Aos clientes com menos recursos, as ofertas são escassas e as condições, pouco atraentes.

A propósito, os banqueiros voltaram a pedir a regulamentação do cadastro de bons devedores, como argumento para baixar o custo de suas operações. Na verdade, eles já têm acesso a todas as informações possíveis sobre os correntistas.

Mas voltemos à questão das taxas. Justifica-se solicitar dinheiro ao banco para trocar uma dívida impagável (crédito rotativo dos cartões ou cheque especial) por outra com taxas bem menores (Crédito Direto ao Consumidor ou consignado).

Para isso, a primeira recomendação é pesquisar bem antes de firmar qualquer contrato, a fim de não cair no "canto da sereia" dos juros raquíticos. Bancos não são dados à filantropia creditícia.

Ao contrário, eles exigem contrapartidas aos empréstimos, inclusive ilegais, a "venda casada", na qual empurram pacotes de tarifas, seguros, cartões de crédito e investimentos para quem necessite de empréstimo.

Avalie, também, se o ganho com menores juros não será engolido por tarifas mais caras.

Uma boa opção pode ser a portabilidade de crédito.

Assim como você tem o direito de mudar de operadora de telefonia celular, prezado leitor, pode procurar recursos financeiros mais baratos em outros bancos e transferir seu contrato, se as novas condições forem mais adequadas.

Não se esqueça de exigir o Custo Efetivo Total (CET) -a soma de tudo o que será cobrado no empréstimo ou financiamento-, os preços das tarifas e a exigência de aquisição de outros produtos e serviços.

E faça as contas, para ver se a mensalidade caberá em seu orçamento. Sim, porque sobre mensalidades vencidas vão incidir correção, juros e multas. Depois de algum tempo, o devedor será inscrito em um cadastro negativo, o que "sujará seu nome", definição popular para a perda de crédito no mercado.

Antes de assumir um compromisso financeiro, então, responda às seguintes perguntas:

1) Gasto mais do que ganho?

2) Posso cortar os gastos para pagar dívidas?

3) Vou usar o dinheiro emprestado para uma compra urgente, muito importante (por exemplo, compra de imóvel para moradia) ou adiável (eletrodomésticos, automóvel etc.)?

4) O empréstimo consumirá quantos por cento de minha renda líquida (o que sobra de salários, aposentadorias, pensões ou rendimentos após o pagamento de contas como aluguel, escola, supermercado, condomínio, planos de saúde, telefones etc.)?

5) Tenho confiança em que terei renda por todo o período em que pagarei as parcelas do empréstimo?

É importante lembrar, também, que financiamentos ou empréstimos não aumentam o poder aquisitivo. Somente solucionam situações emergenciais e facilitam a aquisição de bens de maior valor.

O governo pressiona as instituições financeiras a reduzir as taxas das operações financeiras para que o consumidor compre mais, o comércio desove seus estoques e aumente as encomendas à industria.

Esse círculo virtuoso move a economia, amplia a arrecadação, as ofertas de emprego e pode até melhorar os salários.

Mas não elimina a necessidade de uma reforma tributária e fiscal, de combate ao desperdício do dinheiro público e à corrupção.

Também teremos de expandir a poupança interna, a produtividade e desburocratizar o Brasil.

Somente dessa forma o desenvolvimento do país será duradouro e sustentável.

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