quarta-feira, março 28, 2012

Tsunami e nova política cambial: a conta virá - NATHAN BLANCHE


O Estado de S.Paulo - 28/03/12


A principal reação dos agentes econômicos ao Decreto Presidencial n.º 7.698, de 9/3/2012, que estendeu de 3 para 5 anos o pagamento de 6% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para empréstimos externos, foi de insegurança. As empresas, inclusive as de médio porte, estão tentando se defender desse aumento de custo, uma vez que têm financiamentos para serem rolados.

As projeções da Tendências não indicam um quadro de abundância de dólares no País neste ano. A expectativa para as necessidades de financiamento externo em 2012 é de US$ 115 bilhões, ou seja, 4% do PIB, e, para a rubrica "Amortização de médio e longo prazo da dívida externa", a projeção é de US$ 55 bilhões. A sobra de dólares na economia é estimada em US$ 25 bilhões, ante quase US$ 60 bilhões em 2011. Ou seja, os efeitos do tal "tsunami" não devem ser exatamente o que se tem alardeado.

O fato é que as dívidas de empresas brasileiras ao longo dos últimos anos precisam ser amortizadas ou roladas. Neste contexto, os principais afetados por esse decreto serão bancos e empresas de médio porte que demandarem crédito para rolagem da dívida por um prazo inferior a cinco anos. O custo dessa rolagem será composto pelos juros do empréstimo adicionados de 6% de IOF, o que deve totalizar entre 10% e 12% no primeiro ano. Para as empresas de maior porte, que têm acesso a crédito de mais longo prazo, os efeitos são nulos. Como reflexo das medidas cambiais adotadas em todo o passado recente, inclusive, tais empresas já buscaram o alongamento de prazo em suas captações. Neste ano, créditos acima de sete anos já representam 71,5% do total.

De qualquer forma, os riscos estão aumentando para todos, inclusive para o consumidor brasileiro. O objetivo explícito do governo, de usar uma artilharia pesada contra a suposta "guerra cambial", é apenas um aspecto de um conjunto de ações que se vem configurando numa nova política econômica, que carrega riscos elevados para a economia brasileira no médio e no longo prazos, em termos de inflação e crescimento.

O "tsunami" e a "guerra cambial" podem ser entendidos como uma cortina de fumaça usada pelo governo para implementar uma nova política econômica calcada em maior intervencionismo do Estado na economia. É bom lembrar que, se não fosse a atuação dos bancos centrais, a economia mundial estaria em situação muito pior, e a economia brasileira também.

O fato é que, com (a) o aumento do uso de medidas cambiais, em conjunto com o fechamento da economia para administrar a taxa de câmbio dentro de certo intervalo, (b) uma política de juros baixos para incentivar a atividade econômica, não tendo mais como objetivo a convergência da inflação para o centro da meta e (c) mudanças constantes dos normativos e das regras do jogo, gerando insegurança jurídica, pode-se chegar a um cenário de reações adversas do investidor externo, o que geraria aumento do prêmio de risco país e restrições ao financiamento do balanço de pagamentos. Neste caso, são imprevisíveis o nível de estresse e o tamanho da desvalorização cambial. Mas um resultado é claro: o aumento substancial da inflação, pois seria um advento doméstico não compensado por queda nos preços das commodities, como o ocorrido em 2008. Assim, haveria um efeito relevante sobre a renda real das famílias.

Enfim, as medidas cambiais são apenas um aspecto de um espectro mais amplo que se traduz em aumento de risco para a economia brasileira. Especificamente, em relação à política cambial - que deveria voltar a ser conduzida e formulada apenas pelo Banco Central -, o recado é que o Brasil não deve ser arrogante com o capital externo, afinal precisa dele, porque o nível de poupança do País é baixo e o único jeito de crescer é por meio de aquisição de poupança externa.

Os que acreditam que juros e câmbio são fatores geradores de riquezas obtidas por decreto, e não por resultado dos fundamentos econômicos, acreditam em histórias da Carochinha. A fatura não tardará a chegar e todos nós seremos chamados a pagar a conta.

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