sexta-feira, março 02, 2012

A política ferve - DENISE ROTHENBURG


Correio Braziliense - 02/03/12


Os peemedebistas já perceberam, in loco, que o objetivo maior do PT - além de conquistar São Paulo - é tentar tirar o PMDB do lugar mais alto do pódio em número de prefeituras



Se alguém tinha alguma dúvida de que a eleição municipal fará ruir parte da relação amistosa entre PT e PMDB, elas estão prestes a se dissipar. O primeiro sinal de que nada vai bem é o manifesto assinado por 45 peemedebistas, a ser entregue na segunda-feira aos caciques do PMDB. Ali, a turma de Michel Temer vem com a conversa de sempre, que está excluída das definições de governo. Entre um enunciado e outro do documento, a leitura política é de recados a vários personagens.

A primeira mensagem não escrita está endereçada à cúpula do próprio PMDB: ou os caciques (leia-se o presidente em exercício do PMDB, Valdir Raupp, e os líderes Renan Calheiros, no Senado, e Henrique Eduardo Alves, na Câmara) passam a jogar para o time ou, aos poucos, não terão uma grande turma sob seu comando a lhes respaldar as ações.

Muitos no PMDB têm hoje uma sensação cristalina de que Raupp, Renan e Henrique — inclua-se aí o presidente do Senado, José Sarney — jogam por seus projetos pessoais. E não se preocupam em defender um projeto partidário, que inclua a massa de deputados e senadores, por enquanto, a maior do parlamento. Diante de um manifesto assinado por mais de metade da bancada, é bom esse grupo passar a reunir mais os parlamentares, tirar posições conjuntas e evitar o toque de caixa como deseja o governo. Ou seja, dar, ao menos, uma sensação de discussão dos temas, o que não ocorreu, por exemplo, na votação do fundo de previdência do servidor público federal, uma atitude que ajudou a engrossar o manifesto.

O segundo recado do tal documento também está nos meandros. Até aqui, todos os grandes e bons projetos do governo são considerados do PT, e o PMDB fica sempre no prejuízo. O partido está incomodado de votar a favor de tudo o que o Executivo deseja e não receber sequer um muito obrigado na hora em que a proposta é sancionada com festa no Planalto. Cansou-se do desprezo com que Dilma trata o partido, sem esconder uma preferência pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, citado inclusive como um possível futuro candidato a vice-presidente.

Por falar em prejuízo...
O recado explícito do manifesto é a ansiedade do PMDB. Os deputados participam ativamente da formatação dos palanques da eleição municipal no interior. Os peemedebistas já perceberam, in loco, que o objetivo maior do PT — além de conquistar São Paulo — é tentar tirar o PMDB do lugar mais alto do pódio em número de prefeituras. O PMDB elegeu pouco mais de 1,2 mil prefeitos. Hoje, tem 1.175. E, pelo andar da carruagem no interior, está cada vez mais claro que o PT trabalhará para reduzi-los. Não por acaso, dos ministérios que lidam diretamente com os municípios, só restou ao PMDB a Agricultura, enquanto o PT comanda Saúde, Educação e Comunicações.

As prefeituras são consideradas cruciais para a eleição de deputados e senadores. Quem tem mais prefeitos, na prática, tem mais força para eleger deputados. O PMDB vê seu poder se reduzindo lentamente nas eleições. E agora, na avaliação de muitos, chegou ao limite: se não gritar já, chamando inclusive seus caciques para o jogo, o PT vai tomar espaço e aí não adianta chorar depois.

Por falar em chorar...
O PMDB, em seus encontros mais reservados, tem dito com todas as letras que a "faxina" surge na imprensa como obra de Dilma Rousseff e do PT. Enquanto ao PMDB e demais aliados ficam com o status de "faxinados". Diante disso, muitos acham que o manifesto pode ser visto como o início da hora da verdade. No caso dos caciques do PMDB, ou eles passam a ter uma visão mais executiva, em vez de centrar fogo apenas na conquista de poder no Legislativo, ou vão acabar perdendo esse poder lá na frente para o PT. Em relação ao governo Dilma, também não tem meio-termo: ou o PMDB passar a ter mais influência ou seus deputados vão começar a espalhar armadilhas para Dilma no parlamento. E, nessa Legislatura, eles são muitos.

Por falar em verdade...
Dentro do Planalto, entretanto, há quem diga que cão que late não morde. O mais provável é que o governo Dilma dê um afago aqui e outro ali ao PMDB e deixe tudo como está, até a próxima crise. Afinal, se tem uma coisa que sempre ocorreu foi o PMDB reclamando disso e daquilo, o governo dizendo que entende a situação, e o PT fingindo que não é com ele. Resta saber o que essa fervura trará de diferente. Até o momento, a trama segue a receita normal das novelas. Se vai começar a engrossar o caldo ali na frente, aí é outra história.

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