quarta-feira, março 21, 2012
Jogo fisiológico - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 21/03/12
Fruto de garantias oferecidas à Fifa pelo presidente Lula, Lei da Copa transformou-se em trunfo na peleja entre Dilma Rousseff e o Congresso
Em meio às pressões e chantagens que dominam as relações entre o governo federal e sua base parlamentar, a tramitação da Lei Geral da Copa no Congresso ganhou renovada projeção.
Embora suas consequências tendam a ser limitadas e transitórias, as normas que disciplinam a realização do Mundial de 2014 no país tornaram-se objeto de discussões acaloradas, que parecem pautar-se, ao menos em parte, pela máxima fisiológica de "criar dificuldades para vender facilidades".
Como esta Folha já teve oportunidade de comentar, não havia razão para o Brasil apressar-se em fazer mesuras e concessões à Fifa -que pretendia, por exemplo, responsabilizar a União "integralmente e independentemente de culpa" por eventuais prejuízos relacionados à competição.
É preciso considerar, porém, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando da confirmação do país como sede do Mundial, em 2007, ofereceu à Fifa garantias relativas a 11 tópicos, entre os quais figurava a comercialização de produtos.
Como se sabe, a entidade máxima do futebol mundial tem como um de seus patrocinadores uma marca de cerveja -e pretende vendê-la nos estádios. Tal intenção tornou-se o principal ponto de desacordo em torno da legislação.
Não existia em 2007, todavia, norma federal que proibisse o consumo de bebidas alcoólicas em praças esportivas. O veto passou a integrar o Estatuto do Torcedor em 2010, em decorrência de um protocolo firmado, em 2008, pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais -uma associação dos procuradores-gerais de Justiça dos Ministérios Públicos dos Estados e da União.
O texto incorporado ao Estatuto, diga-se, não prima pela precisão. Estabelece que "acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo" não poderão ocorrer caso ele porte "objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência". A regra, aliás, foi suspensa na Bahia por decisão liminar da Justiça.
Uma vez que a Presidência assumiu compromissos, é razoável que sejam cumpridos, desde que não se trate de despropósitos óbvios. Não parece ser esse o caso da venda de cerveja em bares situados em estádios durante o período de competição -soa como um exagero ver em tal medida uma ruptura da soberania nacional.
É preciso, no entanto, que as concessões se restrinjam ao evento. Não cabe, a título de cumprir promessas à Fifa, revogar em definitivo as restrições do Estatuto do Torcedor à comercialização de bebidas alcoólicas, uma ferramenta de combate à violência nos estádios.
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