domingo, março 11, 2012

Drogas invadem agenda da América - CLÓVIS ROSSI


FOLHA DE SP - 11/03/12

Até os Estados Unidos já aceitam ao menos discutir a questão do narcotráfico


A burocrática agenda preparada para a 6ª Cúpula das Américas (Cartagena, Colômbia, 14 e 15 de abril) está sendo subvertida por temas bem mais candentes, o que não quer dizer que sejam melhores ou piores. Apenas provocam emoções mais fortes do que, por exemplo, discutir a integração das Américas.
A primeira subversão é dada pela presença do ausente, Cuba, tema que atualizei para a Folha.com (folha.com/no1059632). O segundo ponto é mais candente: drogas.
Coube ao presidente da Guatemala, Otto Pérez Molina, introduzir o tema na agenda com uma proposta concreta: queria discutir a despenalização das drogas na América Latina. Pérez Molina tem autoridade, ao menos geográfica, para levantar o assunto porque a Guatemala está se tornando um Estado falido justamente pela penetração das gangues do narcotráfico.
Depois, a chanceler anfitriã, María Ángela Holguín, usou um argumento imbatível para apoiar a discussão: "Definitivamente, a luta contra as drogas não foi tão bem-sucedida como deveria ser e é um tema sobre o qual os países têm que conversar".
Na sexta-feira, até os Estados Unidos -firmemente contrários à legalização das drogas- aceitaram ao menos debater o tema, segundo Mike Hammer, subsecretário interino de Assuntos Públicos do Departamento de Estado.
Em todo caso, Hammer reafirmou o veto à despenalização que, antes, o vice-presidente Joe Biden já havia manifestado aos governantes centro-americanos com o argumento de que a liberação "é mais custosa para a sociedade do que a proibição".
Mesmo assim, o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, festejou a disposição dos Estados Unidos "de se abrir à discussão do tema das drogas".
Santos, como Molina, é indicado para levantar a questão porque, como ele próprio afirmou sexta-feira, "se há um país que sofreu o flagelo do narcotráfico e que pôs mais sangue que qualquer outro, esse país é a Colômbia". É bom ressaltar que, ultimamente, o México tem derramado mais sangue que a Colômbia, o que serve para dar relevância à discussão: o governo Felipe Calderón, desde a posse, há seis anos, jogou o Exército no combate ao narcotráfico e parece estar perdendo.
Ou seja, nem escalar a repressão, utilizando as Forças Armadas, está funcionando. Convém, pois, debater se a despenalização é de fato mais custosa do que a repressão, como acha o vice-presidente Biden.
Santos quer, ao menos, discutir alternativas com base em uma metodologia em que trabalha juntamente com os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Ricardo Lagos (Chile). A metodologia, sempre segundo o presidente anfitrião, monta cenários para mostrar como as Américas estarão dentro de 20 anos se as coisas seguirem como estão ou se for adotada alguma política alternativa.
Se as coisas seguirem como estão, a América Latina acabará superando a África em número de assassinatos por 100 mil habitantes: em 2010, último ano para o qual há dados comparativos, foram, na média do subcontinente, 15,6 contra 17,4 na África, área pontilhada de conflitos civis selvagens.

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