quarta-feira, fevereiro 22, 2012

Taxa neutra - ANTONIO DELFIM NETTO

FOLHA DE SP - 22/02/12

Há uma intrigante questão no ar. Resulta da provocação do Banco Central do Brasil aos analistas do sistema financeiro, alguns dos quais se veem arrogantemente como os portadores da verdadeira ciência econômica.

Cada um deles deve explicitar a sua opinião sobre qual é a taxa de juros neutra que deve balizar as manobras da política monetária de forma a atingir um equilíbrio "ótimo":

1º) Manter o sistema econômico funcionando sempre no seu nível "potencial", um conceito de determinação empírica duvidosa.

2º) Como consequência no mercado de trabalho, todos os que desejam e podem trabalhar com o salário real nele fixado estarão empregados, o que significa que, por construção, não existe desemprego "involuntário".

3º) Permitirá ao Banco Central, com manobras da taxa de juro nominal de curto prazo, manter a taxa de inflação em torno da meta fixada pelo poder incumbente.

Para essa construção, basta que se aceite que a demanda global da economia (o consumo e o investimento) diminui quando aumenta a taxa de juro real (o que parece razoável), e que a oferta global seja o "produto potencial".

Com essas duas condições, deve existir uma taxa de juro real que iguale a demanda total à oferta total. Esta será a taxa "neutra" que o Banco Central levará em conta no estabelecimento da sua taxa básica, a Selic. O problema é que a taxa neutra está longe de ser uma constante. Ela é tão variável quanto a de-manda global!

Trata-se da discussão que nos acompanha há pelo menos duas décadas e para a qual têm contribuído muitos dos mais bem apetrechados economistas brasileiros e estrangeiros, com grossa artilharia econométrica. Infelizmente, sempre produziram resultados mais do que discutíveis. Nas explicações econométricas, só faltou introduzir o "desmatamento da Amazônia" como fator explicativo. Todo o resto já foi tentado.

Nada se sabe de concreto sobre as respostas à consulta do Banco Central. A provocação mais parece um daqueles avisos de que "vovó subiu no telhado". Circulam, porém, entre pessoas normalmente bem informadas, que a "dispersão" das avaliações da taxa de juro real neutra diminuiu e que elas andam agora no imenso intervalo entre 4,5% e 6%!

É de se esperar que o Banco Central tenha pedido aos informantes que explicitem o processo de como chegaram à taxa neutra. Conhecer os modelos e a metodologia das estimativas é uma informação mais rica do que a sua magnitude. A pesquisa pode dar indicações de como o "mercado" supõe que funciona o sistema econômico, de como se criam as "expectativas" e de como ele reage à manipulação da política monetária.

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