quarta-feira, fevereiro 22, 2012

Por que a nossa internet é tão cara e ruim? - WALTER FELDMAN


FOLHA DE SP - 22/02/12


A Anatel defende as empresas, não os consumidores; permite-se que as empresas entreguem 10% da internet prometida e que vendam o patrimônio público
A privatização da telefonia aconteceu em 1998 e o governo do PT assumiu o poder em 2003. Portanto, o que se fez no período posterior à privatização? Se ela foi tão ruim, não era o caso do PT aperfeiçoá-la?
Todo mundo hoje tem uma linha de celular e o uso de banda larga está crescendo. Porém, os avanços vislumbrados na privatização não alcançaram o êxito que projetamos.
O ex-ministro das Comunicações no governo FHC, Sérgio Motta, teve uma sacada brilhante. No contrato de concessão, incluiu uma cláusula: dez anos depois, o contrato teria de ser revisto.
Ele argumentou que a tecnologia era tão veloz que não fazíamos ideia de como seria o futuro.
Em 2008, quando o contrato venceu, o PT já estava no poder desde 2003. O governo simplesmente ratificou a privatização que tanto utiliza para criticar o PSDB, assinando o contrato com as empresas de telefonia por mais 20 anos.
O governo perdeu uma oportunidade de dar um salto de qualidade nesse setor tão estratégico. O país e os consumidores saíram perdendo. A telefonia no Brasil se tornou uma das piores do mundo: falamos menos e pagamos mais.
Também pagamos caro para uma internet lenta e problemática, com quedas e instabilidade constantes. Tanto que o número de reclamações contra as empresas de telefonia no Procon é recorde todos os anos.
A Anatel defende as empresas, não os consumidores. A sua omissão é tanta que ela está revendo a sua própria decisão de implantar uma auditoria para auferir a velocidade da banda larga, depois que as operadoras reclamaram contra a medida.
O contrato das operadoras com os clientes obriga a entrega de uma banda mínima de apenas 10% da velocidade vendida. Se o consumidor comprou dez megabytes, vai receber apenas um megabyte.
A Oi protesta abertamente contra a medida. Não é por menos, a empresa ganhou poder no governo do PT, que diminuiu a competição, em vez de estimulá-la.
Os fundos de pensão das estatais apoiaram a polêmica fusão da Oi com a Brasil Telecom, em um dos lances mais confusos da história recente, como envolvimento da Polícia Federal na famosa Operação Satiagraha.
O mais surpreendente foi o apoio do governo, por meio dos fundos de pensão, aos sócios Andrade Gutierrez e Grupo La Fonte, para que eles ampliassem a sua participação e o seu controle na Oi. Esses grupos, aliás, tinham sido demonizados durante a privatização.
Para maquiar a situação, a Oi e as operadoras chegaram a um acordo com a Anatel. Elas próprias vão auditar a si mesmas, por meio de uma entidade do setor, o SindiTeleBrasil.
O descaso da Anatel e do governo com os consumidores não para por aí.
Um dos termos no contrato de concessão era que a concessionária poderia deveria devolver os bens da União depois do final do contrato ou então repassá-los para um novo concessionário.
Em 2008, ao ratificar o contrato, o governo poderia pegar alguns bens de volta para beneficiar a população
A Anatel, porém, permitiu que as operadoras vendessem o patrimônio público. Só a venda de um terreno (em frente ao Palmeiras, em São Paulo) rendeu um valor na casa do bilhão. O local poderia servir para construir um imenso parque, escolas e creches.
Nós vamos chamar o presidente da Anatel para fazer cobranças. Vamos convidar o Ministério Público para nos ajudar a conferir a lista de imóveis vendidos. Também exigiremos que a própria agência conduza as auditorias das operadoras, por meio de entidades qualificadas.
Queremos saber: por que a internet continua tão cara e o serviço é tão ruim? Essa não é uma exigência nossa, é uma exigência de qualquer usuário de internet, telefone fixo ou celular no Brasil. A população está farta de tanto desrespeito.

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