quinta-feira, fevereiro 23, 2012

Pacote grego não convence - ALBERTO TAMER


O Estado de S.Paulo - 23/02/12


Saiu o novo pacote de socorro à Grécia. Ninguém acreditou nele, muito menos o Brasil, que está protegido contra a insensatez europeia que já dura dois anos. O governo grego não cumpriu antes o que prometeu mesmo depois de o Congresso ter aprovado as medidas de austeridade exigidas pela zona do euro. E por que iria aplicá-las agora, às vésperas de uma difícil eleição?

A leitura do mercado é de que nada foi feito antes e não há razão alguma para se esperar que se faça agora.

Dois anos. O pacote foi aprovado após uma reunião de quase 13 horas dos chefes de governo, o presidente do BCE, Mario Draghi, e a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde. E ela deixou claro, o FMI está cansado disso e não vai dar mais do que 13 bilhões. E isso se o conselho aprovar. Por quê? Porque a crise se tornou crônica, virou uma espécie de saco sem fundo e mesmo os 130 bilhões aprovados agora, são pouco. Estima-se que a Grécia precisará ainda este ano de pelo menos 245 bilhões, de acordo com documento oficial obtido pelo Financial Times.

Dois anos e dois meses. Outro motivo da descrença é que essa crise já dura esse tempo todo. Iniciou-se em dezembro de 2010, logo após a posse do primeiro-ministro George Papandreou. Ele encontrou o país imerso em caos. Pediu e obteve 110 bilhões em maio, mas não foi suficiente. Papandreou renunciou, entrou um governo mais técnico, mas nada mudou. A Grécia está em profunda depressão, PIB caindo 7%, desemprego de 20,9% e, no fundo, o governo sabe que não deixarão que o país declare um calote em curto prazo. Vão continuar rolando sua dívida. Afinal, se isso já dura dois anos e dois meses, por que não mais um ano? Além disso, há eleições em abril... A ideia dos governantes da zona do euro, do BCE e do FMI é ir adiando o calote.

Mas foi adiado? Esta era a dúvida, no mercado, após o anúncio do pacote. Falava-se em "moratória ordenada" e não caótica. Mas Karel Lanoo, do Centro de Estudos Políticos Europeu, discorda. Os bancos já perdoaram 107 bilhões da dívida grega. O que é isso se não um "calote voluntário", mas calote mesmo? E eles detêm 88% da dívida grega. Pedir mais é simplesmente pôr em risco o sistema, se eles também não forem socorridos.

Draghi, a diferença. Vai dar para continuar adiando? Parece que sim. O novo presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, a despeito da oposição férrea da Alemanha, está injetando liquidez no mercado, com crédito para os bancos por três anos a juros negativos. E sem limite. Para isso, está simplesmente emitindo euros, e corrigindo o erro brutal do seu antecessor, Jean-Claude Trichet, ao qual se deve atribuir grande parte do prolongamento desnecessário e evitável da crise, que chegou a ameaçar o sistema financeiro internacional. Para Trichet, o fantasma era a inflação de pouco mais de 2%; para Draghi, é a quebra do sistema. Os bancos europeus estão sendo capitalizados, vão precisar mais para rolarem a dívida grega e voltarem a emprestar. Enquanto isso, ganha-se tempo para ver o que se faz com Itália, Espanha e Portugal.

Mais liquidez. A propósito, a vigorosa expansão monetária iniciada pelo Fed no início da crise de 2008, está sendo adotada agora pelo Reino Unido e pela China. O Banco da Inglaterra anunciou a injeção no sistema financeiro de 50 bilhões de libras e indica que pode passar de 100 bilhões de libras. A política monetária continua sendo crucial para a economia, disse o ministro do Tesouro, George Osborne.

Brasil mais tranquilo. Essa nova tendência não é nova no Brasil. O BC e o Tesouro já a haviam adotado logo nos primeiros momentos da crise de 2008, liberando recursos do compulsório, além de incentivos fiscais e tributários. Temos hoje, incluindo as reservas conversíveis em reais, cerca de R$ 1,1 trilhão para estimular a demanda interna, se for preciso. Talvez por isso o novo pacote grego teve pouco impacto no Brasil. A impressão agora, no mercado financeiro, é de que a crise da zona do euro está se tornando cada vez uma crise do bloco e não mais do mercado mundial.

Há menos tensão porque, afinal, surgiu na zona do euro um presidente de BC altamente técnico e sensato. Mais uma vez, estamos preparados, sabemos que a situação é grave, mas a crise é deles. O desafio aqui é crescer sem contar com eles, mas com o mercado interno que espera mais estímulos para voltar a consumir.

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