sábado, janeiro 28, 2012

A vazão no guichê - ANTONIO MACHADO

ESTADO DE MINAS - 28/01/12


O mapa das operações de crédito em dezembro, divulgado pelo Banco Central, acumula-se a outras evidências - já vistas no déficit das contas externas e na redução da Selic em meio à taxa de desemprego em recorde de baixa, representando 4,7% da população economicamente ativa (PEA) -, de que a economia, em linhas gerais, vai muito bem. O problema que preocupa é como tais dados interagem entre si.

O estoque do crédito total, que o BC previa no início de 2011 que crescesse entre 12% e 15%, pressionando menos a demanda e, assim, a inflação, avançou 19%, pouco abaixo do aumento de 20,6% em 2010.

Pode-se dizer é que, na falta das medidas acionadas em dezembro de 2010 para conter a expansão do multiplicador bancário, sobretudo do crédito ao consumo, e já parcialmente revogadas, além de instruir o BNDES a se conter, a inflação teria terminado 2011 bem acima de seu resultado no ano, 6,5%, superando o teto do intervalo de variação.

Mais certo é inferir que o governo jamais desejou que o BC mirasse a convergência da inflação para o centro da meta, 4,5%, conforme já havíamos dito, nesta coluna, em janeiro de 2011. A desinflação mais suave, vê-se agora pelo retrovisor, foi providencial para preservar o ritmo de crescimento da economia, sem leva-la a capotar.

A passagem de 2010 (quando o Produto Interno Bruto, PIB, progrediu desestabilizadores 7,5%) para 2011 ensejava duas rotas: a típica do governo passado, em que o BC de Henrique Meirelles nunca deu margem a laxismos antes de relaxar em 2010 para dar o tal Pibão a Lula, ou um caminho inovador. O BC de Alexandre Tombini orientou-se pelo GPS da presidente Dilma Rousseff e do ministro Guido Mantega - e não se pode dizer que levou a economia a um mato sem cachorro.

O resultado do PIB em 2011 será divulgado pelo IBGE em 6 de março, mas já se sabe por indicadores antecedentes que a redução do ritmo de crescimento foi significativa. O consenso é que o PIB cresceu em torno de 3%. Provavelmente teria entrado em recessão, se a política monetária fosse operada conforme os padrões anteriores.

Ainda assim, era o que se delineava ao fim de agosto, quando o BC intuiu que pisara demais no freio e começou a desinchar a Selic, então a 12,50%, além de afrouxar as amarras do crédito ao consumo.


A origem e o destino

A redução seriada da taxa básica de juro já a trouxe, desde então, a 10,50%, e o BC seguirá desinflando-a, como explicitou na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada na quinta-feira. O próximo piso está estimado pelo mercado entre 9% e 9,5% até maio.

Já o crédito - embora vá de vento em popa, em termos de estoque, tendo chegado a 49,1% do PIB, contra 45,2% em 2010 e 43,7% em 2009 - evolui de modo distinto, conforme a sua origem e o seu destino.


Propensão à cautela

O crédito direcionado (normalmente subsidiado) cresceu 2,9% sobre novembro e 23,2% sobre dezembro de 2010. E o crédito livre, 1,9% no mês e 16,8% no ano. No estoque, portanto, não houve retração.

As coisas se invertem no fluxo, a medida relevante para acelerar a produção e consumo. Em dezembro, os novos créditos a pessoas caíram 3,4% em relação a novembro e subiram 8,9% sobre igual mês de 2010. E às empresas, recuaram 0,3% no mês e cresceram 7,8% sobre dezembro de 2010. A menor propensão a dividas segurou a inadimplência, após cinco meses em alta. Para pessoa física, está em 7,3%, maior nível desde janeiro de 2010. Para empresas, em 3,9%.


Sempre o velho dilema

Em geral, detectam-se dois vieses: rigor maior da banca no exame de novos créditos, e interesse menor da clientela em ampliar o seu grau de endividamento, mesmo com a redução dos juros efetivos. Tal comportamento contraria a expectativa do governo, que quer agitar a demanda, temendo outro ano de PIB girando a 3%. E, para tal fim, o jeito mais fácil é induzir o consumidor a se endividar.

Na condição atual, a projeção é que o aumento do saldo do crédito em 2012 repita a taxa de 2011. Não é ruim, se a banca, sobretudo a privada, servir mais a produção que o consumo, aliviando a pressão sobre o BNDES, que será intensa devido ao maior comprometimento do governo com o investimento, especialmente em infraestrutura. O mix entre o curto e o longo prazo é o dilema de sempre da economia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário