sábado, janeiro 07, 2012
Evolução permanente - CLÁUDIO J. D. SALES
O Estado de S.Paulo - 07/12/11
O setor elétrico brasileiro exige planejamento de longo prazo e investimentos de grandes quantidades de capital que só são remunerados em décadas. Entender essa dinâmica é fundamental para fazer "balanços" do passado e "agendas" para o futuro. É com esse espírito que são destacados a seguir, com a lente de formulação de políticas públicas de longo prazo, os principais avanços e retrocessos de 2011 e os maiores desafios de 2012 para o setor.
Um dos eventos mais marcantes de 2011 foi a definição da nova metodologia do chamado Terceiro Ciclo de Revisão Tarifária Periódica. A conta de luz é definida por meio de cálculos que expressam o seguinte princípio: as receitas tarifárias das 63 concessionárias que atendem 99% da população brasileira devem ser suficientes para cobrir custos eficientes e investimentos prudentes. Isso dito, a Aneel (agência reguladora responsável pela nova metodologia) foi muito profissional no que se refere à transparência e respeito ao processo regulatório (audiências públicas e inúmeras rodadas de interação com as empresas e consumidores). Entretanto, o regulador poderia ter sido mais prudente na proposição de novos modelos teóricos ainda não testados e na assunção de algumas premissas baseadas em bancos de dados muito frágeis.
No cenário de expansão de oferta, o setor foi caracterizado pela sobreoferta "confortável" de energia, afastando as ameaças de racionamento verificadas em 2008. Mas a arena competitiva foi abalada pela atuação verticalizada da Petrobrás no leilão regulado de agosto (o chamado "Leilão A-3"), em que a estatal favoreceu sua própria termoelétrica por meio de condições mais vantajosas de oferta de gás natural, corrompendo o ambiente competitivo dos leilões, um dos pilares do setor. E o problema será agravado em 2012, uma vez que a Petrobrás já disse não ser capaz de garantir o insumo para os próximos leilões. Na prática, o consumidor de eletricidade está sendo prejudicado por um agente dominante que não está cumprindo sua missão. As autoridades governamentais e os órgãos de defesa da concorrência precisam atuar.
Outra dimensão que ainda preocupa é a interface socioambiental com a geração e transmissão de energia elétrica. Apesar de avanços que merecem comemoração - como a publicação de portarias do Ministério de Meio Ambiente que agilizam o licenciamento ambiental e a aprovação de lei que define as competências ambientais da União, Estados e municípios -, o setor continua sendo ocupado por grupos de pressão econômica, política e até ideológica que, à margem da lei e valendo-se inclusive da violência, criam obstáculos artificiais e aumentam o custo da energia. Como símbolos extremos desse tipo de ação, listo a assustadora ação de indígenas da tribo Kayabi que mantiveram sete técnicos da Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) como reféns durante uma semana, incomunicáveis e com ameaças de "colocá-los na fogueira". Na mesma linha, assistimos estarrecidos a vídeos de um procurador da República orientando índios xikrin a exigir mais dinheiro pela construção da Usina de Belo Monte. Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), o procurador "extrapolou as atribuições previstas em lei" e "promoveu sentimento de revolta e luta ilegal contra a construção de usinas hidrelétricas".
Olhando para 2012, os desafios do setor não mudam de natureza: promover a expansão da oferta com competição saudável e isonômica, proteger a tarifa de ações populistas, diminuir a carga de tributos e encargos que totaliza quase metade da tarifa, e bloquear os ataques de grupos que veem neste setor tão organizado e estruturado uma plataforma para obter vantagens políticas e econômicas com base no princípio "criar dificuldades para vender facilidades".
Um setor elétrico eficiente e transparente é um ativo para todo o País. Que assim seja em 2012.
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