segunda-feira, dezembro 26, 2011

Programas em série - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 26/12/11


Dilma Rousseff tem dito aos ministros que é hora de se concentrar na realização dos projetos que anunciaram e arrumar recursos para aqueles recebidos de Lula - afinal, o governo é de continuidade. Em 2012, o Planalto não será mais o "Cabo Canaveral", uma base de lançamentos


Brasil Maior, Brasil sem Miséria, programa de combate ao crack, de atenção à pessoa com deficiência e por aí vai. Ao longo de 2011, o Palácio do Planalto mereceu o apelido de “Cabo Canaveral”, recebido ainda no governo Fernando Henrique Cardoso. Foi uma verdadeira base de lançamentos. Para 2012, a previsão é de menos novidades desse porte. A ordem da presidente Dilma Rousseff é que todos se dediquem a realizar o que foi apresentado à população. E, francamente, se isso for seguido à risca, sem dúvida teremos um 2012 mais ao gosto do contribuinte.

Afinal, o Brasil não carece de programas. Em cada ministério, há uma infinidade deles, nas mais diversas áreas. Só no catálogo de programas do governo federal destinado aos municípios são 180. E isso não inclui muitas ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ou seja, há mais projeto por aí. Talvez nem a presidente Dilma Rousseff saiba dizer com segurança, se perguntada de sopetão, quantos programas existem em cada ministério de seu governo ou se há muitas ações sobrepostas a serem enxugadas.

Muitos desses programas vêm de governos anteriores. Alguns, dos tempos de Fernando Henrique Cardoso, ou mesmo de antes disso. O Bolsa Família, talvez o mais emblemático da era Lula, foi concebido juntando o Bolsa-Escola do Ministério da Educação com o Bolsa-Nutrição, do Ministério da Saúde; e o Vale-gás, do Ministério de Minas e Energia. Todos do período de Fernando Henrique. E muitos desses se basearam no tíquete do leite, lá dos anos 80, ainda no governo Sarney.

Até o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), deste século, não pode ser visto como uma invenção genial do último governo. Apresentado ao país em 2007, no início do segundo mandato do presidente Lula, o PAC é quase que mais do mesmo, se comparado ao que houve em alguns governos. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, comandou algo parecido, o “Brasil em Ação”, no qual cada setor tinha um gerente encarregado do acompanhamento dos projetos. O país foi dividido em eixos de desenvolvimento, com obras estratégicas em vários setores. Assim como o PAC, o “Brasil em Ação” também passou por uma solenidade palaciana — ou várias. E, assim, a cada dia, solenidades e mais solenidades ocorrem nos salões do Planalto. Em temporada de presidente candidato à reeleição, o movimento por ali é frenético.

É natural que cada presidente se considere melhor do que seus antecessores para conceber programas e projetos governamentais. Faz parte do script. Também é até compreensível — embora não seja algo digno de aplausos — que um presidente queira mudar os projetos de nome para não deixar os louros ao antecessor. No mundo da política, onde os partidos se engalfinham por um naco de poder, essa atitude é corriqueira. Mas é chegada a hora de dar um basta nisso, nessa prática de lançar programas todos os anos, como se determinada área estivesse começando do zero.

Alguns técnicos contam muito reservadamente que, todas as vezes em que um ministério ganha um programa novo, os antigos são meio que deixados de lado. Ocorre com os projetos governamentais, guardadas as devidas proporções, o mesmo que acontece com algumas crianças, quando recebem um brinquedo novo. O antigo, já surrado de tanto levar trancos para lá e para cá, fica esquecido no fundo do baú, sem a menor atenção — o que, no caso dos projetos, se traduz em falta de recursos, de fiscalização e de controle.

Desativar o “Cabo Canaveral”, ou parar de dar “brinquedo novo” à burocracia governamental, talvez seja a única forma de fazer acontecer os projetos lançados até agora. Não por acaso a presidente Dilma Rousseff tem dito a seus ministros que é hora de todos eles se concentrarem na realização dos programas que o governo lançou neste ano e na reserva de recursos para levar adiante tudo o que ela recebeu do presidente Lula — afinal, o governo é de continuidade. E, se lançar mais algum programa novo, Dilma pode, sem querer, passar a impressão de que os do antecessor não serviam. E isso será mais uma intriga para a oposição usar no sentido de desconstruir o governo Lula. Já chega os ministros herdados, que mudaram quase todos. Mas essa é outra história.

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