FOLHA DE SP - 02/12/11
"A patente é um direito outorgado pelo governo a pessoas ou companhias para impedir outras pessoas ou companhias de produzir, vender ou usar um produto ou um processo que foi inventado por outrem." Acho que foi Perelman, em seu tratado sobre argumentação, que nos ensinou que, sempre que uma afirmativa não ficar clara em sua forma positiva, é conveniente reformulá-la na forma negativa.
É o que fizeram A. B. Jaffe e J. Lerner com a definição acima de patente. E, de fato, a patente tem sido usada antes para impedir a produção de um bem do que para realizá-la.
A indústria de semicondutores, em seus primórdios, ou seja, até meados da década de 80, não tinha a patente como objetivo importante, talvez devido à crescente velocidade de obsolescência de suas tecnologias. Um filme recente exemplifica essa condição.
Após oito anos de prisão, o personagem encarnado por Michael Douglas em "Wall Street 2" recebe os pertences entregues quando ali se apresentou. Dentre eles, o seu celular, um tijolo de um quilograma que não caberia no bolso e que não seria capaz de nada a não ser chamar um outro telefone.
Ora, de que serviria patente de 20 anos se o tempo de obsolescência médio de uma inovação no setor é inferior a um ano, senão para impedir a evolução e o progresso?
Foi a "Texas Instrument" que, no início da década de 80, percebeu o maná que poderia ser a legislação patentária. Formou legião de advogados especializados em litígio, depositou uma imensidão de pedidos de patentes e logo viu suas receitas provenientes de litígios devidos à propriedade intelectual suplantarem aquelas relativas à produção.
O exemplo foi logo seguido por uma coorte de empresas, e viu-se a proliferação de advogados de patentes, firmas e consultorias. Quanto mais aplicações de patentes, mais litígio, mais legislação e, consequentemente, mais advogados, mais parasitas, constituindo um círculo vicioso cuja única consequência é o retardamento do desenvolvimento tecnológico.
Para setores em que intensivas pesquisas predominam, o benefício proporcionado pela introdução da inovação no mercado é suficiente como retribuição pelos investimentos em pesquisas e eventuais mudanças de processos de produção que possam ter exigido investimentos expressivos.
Diferentes setores têm diferentes tempos de vida de suas tecnologias, desde a área de construção civil, em que uma tecnologia resiste por séculos, até a de telecomunicação e informática, ou aeronáutica, por exemplo, em que esse período pode ser, em média, de um semestre.
É óbvio, portanto, que ter um mesmo rígido período de monopólio de 20 anos serve principalmente para retardar a evolução tecnológica e rechear os bolsos de advogados, burocratas e outros parasitas do tráfico patentário.
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE, 80, físico, é professor emérito da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), membro do Conselho de Ciência e Tecnologia da República e do Conselho Editorial da Folha.
QUANTA MERDA NUM SÓ ARTIGO!
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