terça-feira, dezembro 20, 2011

Interesse nacional - REGINA ALVAREZ

O GLOBO - 20/12/11


A radiografia das seis empresas privadas que o governo decidiu elevar à condição de multinacionais verde-amarelas, abrindo as portas do BNDES para financiamentos bilionários, apresentada na excelente reportagem de domingo dos colegas Bruno Rosa e Henrique Gomes Batista, estimula um bom debate sobre o papel do banco estatal no desenvolvimento do país e suas escolhas.

A reportagem mostrou que o banco destinou R$ 40,8 bilhões em cinco anos às companhias "eleitas" - os frigoríficos JBS e Marfrig, a Oi, a BRF Brasil Foods, a Fibria e a Ambev. E revelou que a performance dessas empresas deixa muito a desejar, com um quadro de endividamento elevado, prejuízos, cortes de custos, demissões e pouco avanço no mercado externo.

O BNDES segue orientação do governo ao incentivar a criação de potências nacionais privadas, inspirada no modelo de desenvolvimento dos tigres asiáticos, mas o dinheiro que financia essas empresas é público. Vem de tributos como o PIS/Pasep ou do aumento da dívida pública, recurso que o governo tem usado com desenvoltura para ampliar o poder do banco.

Se o dinheiro é público, o Congresso e a sociedade não deveriam ser informados, por exemplo, sobre o valor dos subsídios embutidos nessas operações? Não é o que acontece na prática. Os subsídios, que equivalem à diferença entre as taxas de captação dos recursos e as taxas dos empréstimos, se misturam com a conta de juros. E como essas operações não passam pelo Orçamento, o Congresso não tem chance de discuti-las, como faz com o financiamento da saúde, da educação e da infraestrutura.

- Se o BNDES utiliza recursos públicos para financiar o desenvolvimento, as operações não deveriam ser direcionadas prioritariamente para projetos de elevado retorno social, como os investimento em infraestrutura? - pergunta o economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.

Apesar da forte expansão recente do crédito do BNDES, o Brasil tem perdido competitividade no ranking mundial devido à piora da infraestrutura, o que está evidenciado em relatórios recentes do Banco Mundial e do World Economic Forum.

Almeida considera legítimo que o governo queira fazer política industrial e influenciar de forma mais direta o aumento da taxa de investimento em alguns setores. Mas questiona o volume que o banco desembolsou para umas poucas empresas privadas, considerando que a economia brasileira ainda tem uma taxa de poupança baixa e os recursos do BNDES são limitados.

O economista Samuel Pessoa, do Ibre/FGV, é um crítico desse modelo, mas a questão que considera chave é a transparência.

- Por que a discussão do financiamento da saúde e da educação precisa passar pelo Congresso e os empréstimos subsidiados ao Friboi e à Ambev não precisam? - pergunta.

Em baixa
O total de famílias endividadas no Brasil caiu pelo sétimo mês consecutivo, passando de 59% em novembro para 58,6% este mês. A boa notícia faz parte da pesquisa que a Confederação Nacional do Comércio (CNC) divulga hoje.

Ainda assim, esse patamar continua um pouco acima do registrado em dezembro de 2010. A economista Marianne Hanson, da CNC, lembra que, no começo do ano, com o crédito crescendo forte, havia grande preocupação com o aumento do endividamento das famílias. Mas esse indicador começou a cair e preocupar menos, embora encerre o ano acima do nível de dezembro passado.

- A tendência é que em 2012 o endividamento comece em alta, porque tradicionalmente é assim. Há muitas contas para pagar no começo do ano e algumas famílias não conseguem se planejar.

Em alta
O que chamou a atenção na pesquisa é o percentual de famílias que se declarou muito endividada. O endividamento nesse grupo encolheu entre novembro e dezembro, mas ainda está bem acima do nível registrado ao longo de 2010. É um dado que requer atenção, tem de ser acompanhado, segundo a CNC.

A maior parte das famílias pesquisadas - divididas em dois grupos, um com renda familiar mensal de até 10 salários mínimos e outro com rendimento acima desse patamar - está endividada no cartão de crédito.

- Elas usam o cartão como forma de financiamento, parcelando as compras. Não significa que todas estão pagando os juros altos do rotativo - destaca Marianne Hanson.

NA MESA: O IPCA-15 deve acelerar para 0,54% em dezembro, puxado pelos alimentos. É o que estima o Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco. O resultado sai amanhã.

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