sábado, dezembro 17, 2011

Inclusão financeira - ROBERTO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 17/12/11

A democracia só é completa quando as oportunidades são iguais para todos, e isso as cooperativas fazem bem


Sempre que há alguma crise mundial no setor financeiro, as cooperativas de crédito sofrem menos que os bancos comerciais, por causa da maior exposição de ativos que estes têm. Cooperativismo é uma doutrina socioeconômica cujo conceito tradicional é o da busca da melhoria das condições sociais dos associados por meio de seu progresso econômico.

Isso faz do cooperado a qualquer tipo de cooperativa um cidadão com três funções: ele é ao mesmo tempo dono, investidor e usuário da instituição que é dele, pertence a ele e aos seus companheiros de atividade profissional.

A cooperativa de crédito tem uma característica adicional: ela opera principalmente nas regiões ou setores em que os bancos convencionais não têm muito interesse, seja porque não existem grandes valores de recursos disponíveis, seja porque os recursos estão dispersos em um número elevado de pessoas mais pobres, cujo mutualismo paga pouco.

E essa é outra razão pela qual as cooperativas de crédito e seus bancos de cúpula (os bancos cooperativos) sofrem menos que os demais bancos: porque os ativos são pulverizados entre milhões de pequenos mutuários que têm aversão ao risco -e são os proprietários da instituição financeira.

Na atual crise, a situação não mudou. No mundo todo, os sistemas cooperativos de crédito têm reagido melhor que os bancos, suportando os problemas dela derivados com certa tranquilidade. No Brasil, esse movimento ainda é pequeno, apesar de representar uma forma mais acessível ao crédito de menor custo. As cooperativas de crédito têm apenas 2% de participação no Sistema Financeiro Nacional.

Segundo o Woccu (Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito), em 2010 já existiam no mundo mais de 53 mil cooperativas de crédito operando em cem países, com 190 milhões de cooperados. E, no seu conjunto, representavam 7,5% do mercado financeiro, quase quatro vezes a participação das nossas. E isso sem contar os bancos cooperativos, cujo "market share" na Europa (segundo a Associação Europeia dos Bancos Cooperativos) chegava a 20% já em 2008, na grande crise daquele ano.

Ainda de acordo com o Woccu, em 2010, em cerca de quatro países as cooperativas de crédito já tinham ativos superando US$ 1 trilhão: França (US$ 4,2 trilhões), Alemanha (US$ 1,46 trilhão), Japão (US$ 1,05 trilhão) e Itália (US$ 1,03 trilhão), seguidos de perto por mais três países com ativos acima de US$ 900 bilhões (Estados Unidos, China e Holanda). O Brasil, mesmo com movimento ainda jovem, já é o 13º país com maior volume de ativos no setor: US$ 54 bilhões em 2010.

Mas aqui também o movimento vem crescendo de forma notável. Até outubro deste ano, os empréstimos realizados pelas cooperativas às pessoas físicas chegaram a US$ 30 bilhões (segundo o BC), com crescimento de 24% ante o ano passado, quando a crise não era pronunciada como agora.

A Organização das Cooperativas Brasileiras calcula que esse setor crescerá mais de 30% em 2011. Temos 1.370 cooperativas de crédito operando em 45% dos municípios brasileiros em 4.529 pontos de atendimento, com 5,1 milhões de associados e 56 mil funcionários. São quatro os setores centrais de crédito cooperativo no Brasil: o Sicoob, o Sicredi, o Unicred e o sistema Ancosol, da economia solidária. O primeiro cresceu 35% em 2010, enquanto os bancos cresceram 17%.

Trata-se de uma notícia alvissareira. O cooperativismo de crédito representa "inclusão financeira".

Boa parte das cooperativas está em municípios com baixa densidade demográfica, com média de 20 habitantes por km², e que não têm acesso a nenhuma outra instituição financeira.

Que cresça esse movimento: afinal, democracia não é apenas política; ela somente é completa quando as oportunidades são iguais para todos, e isso as cooperativas fazem muito bem.

Aliás, já dizia Mário Kruel Guimarães, ideólogo das cooperativas de crédito rural no Brasil: "Com esse instrumento, podemos caminhar com nossas próprias pernas". E tomara que os quatro sistemas se juntem num só para terem mais poder.

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