REVISTA VEJA
É pouco provável que exista no mundo algum outro país em que juízes, desembargadores, ministros de tribunais superiores e integrantes do Poder Judiciário em geral apareçam tanto na impressa como acontece hoje no Brasil. Bom sinal com certeza não é, sobretudo quando se considera o tipo de noticiário em que costumam aparecer. Ora é porque estão em greve, ou ameaçando entrar em greve , por aumento de salário. Ora é porque estão processando o governo, em açõpes que serão julgadas por colegas nas instâncias acima deles, para receber equiparações, compensações e outros benefícios em dinheiro. Vivem, através das suas associações de classe, publicando manifestos a favor de si próprios. Vão a resorts de luxo, com despesas pagas por gente de quem deveriam estar longe, e ficam revoltados quando a imprensa publica informações sobre isso.
Com frequência inquietante, e pelo país inteiro, saem notícias sobre magistrados investigados ou processados por ofensas ao Código Penal. Episódios de conduta incomparável com a função judicial tornam-se cada vez mais comuns.
Não causaram nenhuma estranheza, por exemplo, as informações, reforçadas por fotos, que a Folha de s.Paulo publicou há pouco sobre a campanha feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, em favor de sua cunhada Suzana Camargo, candidata a uma vaga na corte presidida por ele. O mesmo aconteceu com a notícia, divulgada no começo de dezembro, revelando que dezessete desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo estão sendo investigados pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça sob a acusação de receber pagamento ilegais; há investigações, também, sobre magistrados paulistas suspeitos de ter patrimônio incompatível coom a sua renda. Brasília, então, é um capítulo à parte. Como descreveu recentemente uma reportagem de VEJA, juízes das mais altas instâncias do país vivem em estado de aberta promiscuidade com advogados dos grandes escritórios do Rio de Janeiro, de São Paulo e de lá mesmo, políticos envolvidos em processos de corrupção e grandes empresários enrolados com a Justiça - para não falar de réus com processos em andamento. Cruzam-se em festas de aniversário, casamentos, feijoadas, torneios de golfe. em vez de esconderem, advogados exibem em público sua amizade com magistrados, deixando correr a impressão de que podem ganhar qualquer causa; seus honorários não sofrem nada com isso.
Todo esse caldo vem sendo consideravelmente engrossado, de uns tempos para cá, pela ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal deJustiça e atual titular da Corregedoria Nacional de Justiça. Essa ministra tem um problema sério: acredita que deve cumprir, realmente, suas obrigações de corregedora, segundo determina a lei. Solicita investigações. Ouve denúncias. Tenta apurar delitos, violações éticas e outras malfeitorias atribuídas a autoridades judiciárias. É apenas o seu dever - mas por fazer o que manda a lei, a ministra Eliana está com índices de popularidade próximos a zero entre os seus colegas. Em nada a ajudam, é claro, sua inclinação a falar exatamente o que pensa e sua pouca paciência para adoçar o que falta. Recentemente, por exemplo, disse que o Judiciário sofre de "gravissímos problemas" causados pela "infiltração de bandidos escondidos atrás da toga", referindo-se ao fato notório de que a todo momento, e em todo o Brasil, vêm a público denúncias de corrupção entre juízes, desembargadores ou ministros dos tribunais superiores. O presidente do Supremo Tribunal Federal,Cezar Peluso, declarou-se "indignado" - não com os bandidos, mas com Eliana. Disse que suas palavras eram uma "ameaça à democracia", e assegurou que em quarenta anos de carreira nunca tinha visto "coisa tão grave".
O minisro poderia ter dito que em seus quarenta anos de carreira a situação do Judiciário brasileiro nunca foi tão calamitosa como hoje - e que, no caso, o que realmente ameaça a democracia é a impunidade para juízes criminosos. Mas é claro que não disse. Como acontece com tantos outros magistrados hoje em dia, ele acredita que seus deveres de solidariedade com a categoria vêm antes de seus deveres como juiz. É uma pena que esse apoio não se estenda aos milhares de juizes honestos que existem no Brasil - e que podem perder a vida por causa de sua integridade, como ocorreu com a juíza fluminense Patricia Acioli, assassinada com 21 tiros e em agosto último por aplicar a lei contra o crime organizado. Nenhum ministro do STF se deu ao incômodo de comparecer ao enterro.
"É uma pena que o apoio do ministro Peluso não se estenda aos milhares de juízes honestos do Brasil, e que podem perder a vida por causa de sua integridade"
Com frequência inquietante, e pelo país inteiro, saem notícias sobre magistrados investigados ou processados por ofensas ao Código Penal. Episódios de conduta incomparável com a função judicial tornam-se cada vez mais comuns.
Não causaram nenhuma estranheza, por exemplo, as informações, reforçadas por fotos, que a Folha de s.Paulo publicou há pouco sobre a campanha feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, em favor de sua cunhada Suzana Camargo, candidata a uma vaga na corte presidida por ele. O mesmo aconteceu com a notícia, divulgada no começo de dezembro, revelando que dezessete desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo estão sendo investigados pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça sob a acusação de receber pagamento ilegais; há investigações, também, sobre magistrados paulistas suspeitos de ter patrimônio incompatível coom a sua renda. Brasília, então, é um capítulo à parte. Como descreveu recentemente uma reportagem de VEJA, juízes das mais altas instâncias do país vivem em estado de aberta promiscuidade com advogados dos grandes escritórios do Rio de Janeiro, de São Paulo e de lá mesmo, políticos envolvidos em processos de corrupção e grandes empresários enrolados com a Justiça - para não falar de réus com processos em andamento. Cruzam-se em festas de aniversário, casamentos, feijoadas, torneios de golfe. em vez de esconderem, advogados exibem em público sua amizade com magistrados, deixando correr a impressão de que podem ganhar qualquer causa; seus honorários não sofrem nada com isso.
Todo esse caldo vem sendo consideravelmente engrossado, de uns tempos para cá, pela ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal deJustiça e atual titular da Corregedoria Nacional de Justiça. Essa ministra tem um problema sério: acredita que deve cumprir, realmente, suas obrigações de corregedora, segundo determina a lei. Solicita investigações. Ouve denúncias. Tenta apurar delitos, violações éticas e outras malfeitorias atribuídas a autoridades judiciárias. É apenas o seu dever - mas por fazer o que manda a lei, a ministra Eliana está com índices de popularidade próximos a zero entre os seus colegas. Em nada a ajudam, é claro, sua inclinação a falar exatamente o que pensa e sua pouca paciência para adoçar o que falta. Recentemente, por exemplo, disse que o Judiciário sofre de "gravissímos problemas" causados pela "infiltração de bandidos escondidos atrás da toga", referindo-se ao fato notório de que a todo momento, e em todo o Brasil, vêm a público denúncias de corrupção entre juízes, desembargadores ou ministros dos tribunais superiores. O presidente do Supremo Tribunal Federal,Cezar Peluso, declarou-se "indignado" - não com os bandidos, mas com Eliana. Disse que suas palavras eram uma "ameaça à democracia", e assegurou que em quarenta anos de carreira nunca tinha visto "coisa tão grave".
O minisro poderia ter dito que em seus quarenta anos de carreira a situação do Judiciário brasileiro nunca foi tão calamitosa como hoje - e que, no caso, o que realmente ameaça a democracia é a impunidade para juízes criminosos. Mas é claro que não disse. Como acontece com tantos outros magistrados hoje em dia, ele acredita que seus deveres de solidariedade com a categoria vêm antes de seus deveres como juiz. É uma pena que esse apoio não se estenda aos milhares de juizes honestos que existem no Brasil - e que podem perder a vida por causa de sua integridade, como ocorreu com a juíza fluminense Patricia Acioli, assassinada com 21 tiros e em agosto último por aplicar a lei contra o crime organizado. Nenhum ministro do STF se deu ao incômodo de comparecer ao enterro.
"É uma pena que o apoio do ministro Peluso não se estenda aos milhares de juízes honestos do Brasil, e que podem perder a vida por causa de sua integridade"
Li, como sempre , o texto Aparecendo demais do J.R.Guzzo e senti uma uma grande frustração !Não que o assunto fosse novidade p/ mim, porque acompanho pelos jornais , revistas , rádio e tv assuntos de interesse à todos os brasileiros. Leio , ouço e vejo diariamente colunistas,comentaristas, pessoas de destaques pela seriedade e confiabilidade denunciando podridão que assola o Brasil de norte a sul : antes esses acontecimentos se limitava a funcionários públicos de alguns orgãos , mas hoje vemos roubalheira em todos os orgãos em todos os níveis , principalmente nos mais altos escalões . Alguns podem dizer; você tem o seu voto para mudar : Acho que perdemos a capacidade de nós nos indiguinarmos e só vai mudar quando todos os brasileiros se sentirem na miséria de tanto sertem roubados e não terem aonde recorrer; Não é possível que isso continue sem que apareça uma força que consiga acabar com tanta podridão. É muito frustrante !
ResponderExcluirJ. R. Guzzo "falou e disse" por todos nós, brasileiros indignados mas amordaçados pela falta de um canal sério em que possamos "botar a boca no trombone". Se hoje o CNJ encontra-se com suas funções reconhecidas pela mais alta corte, isso se deve, em parte, também a esse artigo muito bem escrito, em que nosso herói vai direto ao problema, sem recurso de meias-palavras. Ora, se um juiz não tem malfeitos a esconder - e é isso que se espera de todo juiz! -, por que se esconder atrás da toga? Quem não deve não teme. J. R. Guzzo, sinto-me representada, com honra, por você nesse artigo. Abraços! (Artigo: Aparecendo Demais).
ResponderExcluir