terça-feira, outubro 18, 2011

REGINA ALVAREZ - Política errática


Política errática 
REGINA ALVAREZ
O Globo - 18/10/2011

Um mês depois da elevação em 30 pontos percentuais do IPI dos carros importados, ainda existem muitas dúvidas sobre a medida. O viés protecionista está claro, mas tudo indica que não é só esta a explicação para uma decisão tão polêmica adotada pelo Ministério da Fazenda. O consenso no governo é só fachada. Nos bastidores, as demais áreas tentam decifrar as entrelinhas dessa decisão.

Do ponto de vista jurídico, o aumento do IPI dos carros não se sustenta, como está mostrando a enxurrada de liminares obtidas na Justiça pelas montadoras contra o imposto. O governo não levou em conta o prazo de carência de 90 dias para a cobrança, como determina a Constituição no artigo 150, o que abriu a brecha para as liminares.

O aumento do IPI pega uma parcela muito pequena do mercado de automóveis importados, entre 4% e 8%. Sem dúvida, teve como alvo as montadoras asiáticas. E são estas que já avisaram ao governo que vão entrar com reclamações na OMC contra a medida. O primeiro passo nesse sentido foi o pedido de explicações na reunião do comitê de acesso a mercados da Organização, na sexta-feira.

Assim, enquanto para o resto do mundo o governo está dizendo "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço", já que o ministro Guido Mantega adora protestar contra o protecionismo dos outros, internamente, a medida só está agradando mesmo a um segmento da indústria, as montadoras instaladas aqui. Os demais setores continuam a esperar por uma política industrial que faça sentido e reflita as promessas oficiais. Ou seja, voltada para o aumento da competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Isso depende da prometida desoneração de tributos, da redução do custo da logística e de outros custos. O governo não avançou nessa direção e ainda tem contribuído para elevar a carga das empresas.

Fábio Faria, vice-presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil, informa que a taxa de utilização do Siscomex foi reajustada em 517% em maio, sob o argumento que estava congelada desde 1998; a inflação do período foi de 214%. Além disso, a Secretaria do Patrimônio da União criou em janeiro uma taxa sobre o uso de águas públicas, que atinge as operações portuárias e onera as exportações.

- Até agora vimos muita intenção, mas pouca coisa prática acontecendo para melhorar a competitividade do produto brasileiro. Essa medida do IPI não ajuda e ainda cria um complicador, que são esses questionamentos - destaca o dirigente.

Se existem dúvidas sobre a real motivação do Ministério da Fazenda com o aumento do IPI dos carros: proteção à indústria nacional, aumento da arrecadação ou uma trava para que determinadas montadoras se instalem aqui, uma coisa é líquida e certa. A política industrial continua errática e o governo sem um comando firme nessa área.

Viés inflacionário
Desde a última reunião do Copom, no dia 31 de agosto, o preço das commodities em reais teve valorização de 2,8% (vejam no gráfico). O índice CRB, que mede uma cesta de preços de matérias-primas, caiu 6,8% em dólares, mas a desvalorização do real foi mais intensa, de 10,15%. Então, os preços cotados em dólares quando convertidos para reais acabaram ficando mais caros, mesmo com a crise internacional.

Academia
O ministério da Fazenda criou um canal para se aproximar do meio acadêmico. Alunos de doutorado e pós-doutorado poderão passar até dois anos fazendo a tese dentro do ministério, em parceria com a Capes. Trabalhos inéditos também serão publicados no site do órgão.

Dever de casa
O resultado das empresas americanas no terceiro trimestre tem agradado os investidores. As companhias têm conseguido aumentar a produtividade, segurando gastos e contratações. Também tem contribuído o dólar fraco, que estimula exportações, e as remessas de filiais que estão fora dos EUA.

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