sexta-feira, outubro 07, 2011

CLAUDIA SAFATLE - A cacofonia que ensurdece


A cacofonia que ensurdece 
CLAUDIA SAFATLE
VALOR ECONÔMICO - 07/10/11

Despontam no mercado projeções que reproduzem o IBC-BR do Banco Central e que indicam crescimento muito próximo de zero no terceiro trimestre, comparado ao segundo. Conforme alguns desses cálculos, feitos com base em indicadores parciais e considerando indícios de desaceleração do setor de serviços, o nível de atividade em agosto pode ter registrado até ligeira contração, algo próximo a -0,3%.

O BC divulga o IBC-BR, que é uma "proxi" do PIB, na próxima semana. A reação do governo ao resultado, se ele for de fato ruim, deverá ser importante para moldar os rumos da política monetaria. Depois de um vaivém de expectativas sobre o corte dos juros na próxima reunião do Copom, dia 19, no momento as apostas do mercado se concentram mais em redução de 0,5 ponto percentual. Já foi de 1 ponto. Ontem, o presidente do BC, Alexandre Tombini, reiterou que os juros passarão por um processo de "ajustes moderados". Em solenidade no BC, disse: "Olhando para frente, nas atuais condições, ajustes moderados na taxa de juros são convergentes com o IPCA no centro da meta no final de 2012".

Banco Central reitera moderação na queda dos juros

Passados nove meses do governo Dilma Rousseff, os juros internos aumentaram, começaram a cair, cresceu o risco de recessão nos EUA e Europa, a China desaquece, a economia mundial está sob ameaça de uma hecatombe e a brasileira dá sinais de enfraquecimento. As expectativas de inflação no país, porém, só pioraram.

Quando Dilma assumiu, as expectativas de inflação eram de 5,34% para 2011 e de 4,5% para 2012. A pesquisa Focus de janeiro indicava para este ano taxa Selic de 12,25%, expansão de 5,03% da indústria e crescimento do PIB de 4,5%. Hoje, a inflação esperada aumentou. É de 6,52% para 2011 e de 5,53% para 2012. A última pesquisa Focus, do BC, revela taxa Selic menor, de 11%, o crescimento da indústria murchou para 2,45% e o do PIB caiu para 3,51%.

As expectativas de inflação, no entanto, continuam desancoradas, distantes do centro da meta de 4,5%. E isso não começou agora. O descolamento entre a meta e as projeções colhidas no mercado vem de abril do ano passado e, de lá para cá, com interrupções aqui ou ali, só foram se distanciando.

O regime de metas para a inflação é fundamentado na coordenação das expectativas dos agentes econômicos. Para que o BC consiga exercer bem essa função, o que facilitaria sua missão de levar a inflação para o centro da meta, duas premissas são cruciais: credibilidade e transparência.

Por essa razão, os bancos centrais desenvolveram nas últimas décadas um ritual de comunicação e prestação de contas que envolve as atas do Copom, os relatórios trimestrais de inflação, o comparecimento periódico do presidente do BC ao Congresso. Alguns foram mais adiante, como os bancos centrais da Escandinávia, que, quando decidem a taxa de juros de curto prazo, apontam também os cenários mais prováveis para vários meses à frente.

A autoridade monetária transmite suas mensagens ao mercado por esses instrumentos de comunicação. Para isso há estratégias e escolhas criteriosas até no uso das palavras. Vez por outra, o Copom toma uma decisão mais dura e, em contrapartida, suaviza na linguagem sobre o horizonte na ata, que é divulgada uma semana após a reunião, ou vice-versa.

Se bem compreendidas, essas mensagens levam os agentes a ajustarem a curva de juros mais rapidamente aos padrões indicados pelo BC, acelerando os canais de transmissão da contração ou expansão monetária para a economia.

No regime de metas, portanto, a comunicação também é um importante instrumento da política monetária. Para cumprir a função de ajudar a coordenar as expectativas inflacionárias, ela tem que ser crível, consistente com os objetivos do BC. Ao contrário, se os agentes do mercado suspeitarem que por trás das decisões do Copom há voluntarismo ou pressão política, a dispersão das expectativas será maior e mais oneroso será o custo para o controle da inflação

Embora pareça difuso, esse preço será cobrado de toda a sociedade, sob a forma de menor crescimento do país, menos emprego e perda de renda.

Nos dois últimos documentos do BC, a ata da reunião de agosto do Copom e o relatório de inflação, consta a expressão "ajustes moderados" da taxa de juros. Uma mensagem que transmitiria a ideia de que os cortes da Selic devem prosseguir na base de 0,5 ponto percentual.

Informações em desalinho foram surgindo nos últimos dias. Elas sugerem que o Planalto introduziu novas metas a serem perseguidas pelo BC: juros básicos de 9% em 2012; juros reais de 2% a 3% no médio prazo; um piso para o crescimento, a partir do qual a autoridade monetária estaria incapacitada de agir, independentemente do curso inflacionário.

São ainda muitas as dúvidas sobre o real compromisso da presidente Dilma com a convergência da inflação para o centro da meta de 4,5%. Em todos os pronunciamentos, ela realça a manutenção do crescimento, mas pouco menciona o controle da inflação. Colhe-se das conversas com economistas oficiais a impressão de que foi feita a escolha de um pouco mais de inflação para um pouco mais de crescimento, como se essa fosse uma troca possível. Analistas e operadores do mercado ainda estão em desconforto com o corte de juros de agosto e já projetam inflação acima da meta para 2013.

Certas ou erradas, o fato é que as mensagens do BC têm se perdido em meio à cacofonia.

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