sexta-feira, outubro 14, 2011

CELSO MING - Impossível sem eles


Impossível sem eles
CELSO MING
O Estado de S. Paulo - 14/10/2011

A opinião pública mundial tem hoje sobre o mercado financeiro uma percepção ambígua e, muitas vezes, confusa.

De um lado, como desde todo o sempre, tende a demonizar banqueiros, bilionários do mercado de capitais, especuladores e rentistas (como os preferem chamar certos observadores das esquerdas brasileiras). E não falta quem peça sua ruína definitiva, seja qual for a categoria em que se enquadrem: banco comercial, de investimento, financeira, administradora de cartões de crédito ou de fundos de hedge.

De outro lado, sabe que não pode provocar a perdição dessa gente. Não só porque a poupança popular pode evaporar, mas também porque, sem ela, não seria possível a vida moderna.

Não são apenas os indignados dos Estados Unidos, da Espanha e de tantas capitais do mundo que querem ocupar Wall Street. A maioria dos atuais dirigentes da União Europeia, com ou sem razão, já lançou seus mísseis contra o mercado financeiro e os especuladores. Dentro da área do euro, o campeão das declarações contra o jogo dos banqueiros é o presidente da França, Nicolas Sarkozy. A todo momento fala em botar freio neles, mas agora admite despejar colossal volume de dinheiro público para fortalecê-los, "porque não podem quebrar".

Até quem deveria conhecer melhor como as coisas funcionam pede ação contra excessivas volatilidades. Segunda-feira, por exemplo, 461 economistas, até mesmo das universidades de Oxford, Califórnia e Berkeley, assinaram documento dirigido às autoridades do Grupo dos 20 (G-20) em que pedem intervenção contra os especuladores do mercado futuro de commodities agrícolas – como se o que acontece aí fosse causa da crise, não consequência. Poderiam pedir o mesmo para o câmbio, para o mercado de ações, para o comércio mundial, para o emprego.

O mercado financeiro ficou gigantesco e operou solto demais. Mas não dá para identificá-lo como inimigo da sociedade e dos Estados nacionais. Ele se transformou no que é porque a poupança cresceu no mundo rico e no emergente, porque as sociedades os toleraram assim.

Há 40 anos, quase não havia fundos de pensão. Hoje, são proprietários de cerca de US$ 13 trilhões em ativos ao redor do mundo. Nesse período, as dívidas dos Estados nacionais se multiplicaram. Só entre as economias mais ricas (OCDE), passa de US$ 42 trilhões (61% do PIB global). Boa parte da prosperidade dos países avançados e dos benefícios distribuídos para a população mais pobre foi obtida com aumento do endividamento, em grande parte, proporcionado pelos bancos e Tesouros dos emergentes. Somente os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) detêm reservas de US$ 4,6 trilhões, a maior fatia investida em títulos de dívida dos Tesouros dos países ricos.

O mercado financeiro não é culpado pela regulação insuficiente e pelo baixo volume de capital próprio em relação a seus ativos que a maioria dos bancos hoje ostenta. Foram os governos de todo o mundo que o quiseram assim ou nada fizeram para que fosse de outra maneira.

Há somente três meses, autoridades da Europa e dos Estados Unidos repeliram advertências de que deveriam capitalizar os bancos. E os testes de estresse providenciados pelas instituições reguladoras da Europa pediram apenas uma fração do aumento de capital hoje pretendido.

Regulagem neles, sim. Mas não dá para fugir desta sina: ruim com o mercado financeiro, impossível sem ele.

CONFIRA

PIB mais fraco. Não foi surpreendente a queda de 0,53% na evolução de agosto (sobre julho) do Índice de Atividade Econômica do Banco Central, já descontados os fatores sazonais, como o gráfico acima mostra. O indicador procura antecipar a tendência da evolução do PIB. Essa queda reflete, especialmente, a atividade mais fraca da indústria. E sugere que o avanço do PIB do Brasil no terceiro trimestre pode ser negativo. Não dá para apostar que a inflação também perca ímpeto enquanto o mercado de trabalho e o setor de serviços continuarem tão aquecidos.

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