domingo, setembro 04, 2011

BARBARA GANCIA - A vez do estrupício

A vez do estrupício
BARBARA GANCIA
FOLHA DE SP - 04/09/11 

Parece um tanto exagerado escrever duas colunas quase seguidas sobre cães, mas o que posso fazer se um mascote se foi e sobrou outro que precisa ser apresentado? Até o nome do pobrezinho que ficou eu tive de adaptar ligeiramente para ver se o torno mais palatável ao leitor acostumado ao galante Pacheco Pafúncio (1996-2011).

Da homenagem feita a David Bowie, o salsicha de pelo duro Ziggy Stardust acabou virando Ziggy Zagallo, gorducho que você, meu caro leitor, vai ter de engolir. Aliás, não só o leitor, mas todos os donos de abrigos para cães abandonados que me escrevem insistentemente nos últimos dias oferecendo seus inquilinos para ficar no lugar do meu velhinho que partiu desta para melhor.

Tenho para mim que os cães, ao contrário dos humanos, podem ser substituídos. Mas calma lá com o andor. Não estamos o Ziggy e eu correndo para pegar um trem. Ambos somos do parecer de que cães, amores, empregos (e o Titanic com o iceberg) trombam na gente na hora certa.

Ficamos, o estrupício e eu, extremamente compungidos com as mais de 600 mensagens recebidas entre Facebook, Twitter e e-mail, uma mais carinhosa do que a outra, assinadas em nome de gente que praticamente se considera da família e que me conta ter crescido junto com o Pacheco e ter chorado comigo na semana passada quando meu cão e personal trainer foi sedado depois de uma parada cardíaca.

Obrigada Bilau, Buddy, Cindy, Naomi, Teteco, Spike, Pituka, Mel, Thor, Balu, Hanna e tantos outros animais que formaram um mutirão de afeto com seus donos para nos confortar. Agradeço à Zuleida pela música canina, à Edelweiss pelas imagens e a todos aqueles que me contaram histórias de cães passados e do temor que sentem pelos velhuscos que vão pelo mesmo caminho do Pachecão.

Já estou selecionando um de vocês (vou sortear o e-mail) para passar o fim de semana tomando conta do Ziggy enquanto eu relaxo no spa, que tal? Brincadeiras à parte, a primeira semana sem o Pacheco foi dura para o gorducho. Tentei levá-lo comigo para todo canto, mas ele é o que os franceses chamam de "insortable" (impossível de sair com). O Ziggy já vai fazer quatro anos e eu nunca tinha me dado conta do quanto eram diferentes, como podiam dois animais de temperamentos tão distintos se dar tão bem?

Pacheco era a personificação, ou melhor, a canificação da serenidade. Ziggy Zagallo é caos e explosão, um Big Bang que grunhe para expressar frustração e grita como uma araponga quando alegre. Obeso, ofegante, ansioso, fisicamente ele lembra o Kung Fu Panda sem a parte da arte marcial.

Fui vaciná-lo recentemente e aproveitei o ensejo para saber do veterinário por que o Ziggy é tão exagerado. "Se ele fosse um humano", disse-me, "seria do tipo que fala, fala e não mexe o traseiro do sofá".

Fez-se um silêncio no recinto. Perguntei quanto devia, o doutor me encaminhou para a saída e assim, sem dizer mais nada, fomos os dois gorduchos rebolando em direção ao meu carro como naquela cena de "101 Dálmatas" em que donos e cães idênticos passeiam no Hyde Park.

Engraçado que, quando ganhei o Ziggy, ele era quietinho. Nada indicava que seria uma Maria Callas do mundo animal. Não consigo entender o que houve. Pensando bem, acho que certos cães não podem nunca ser substituídos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário