sexta-feira, agosto 12, 2011

VINÍCIUS TORRES FREIRE - A crise oferece um presente


A crise oferece um presente
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 12/08/11
Lerdeza na economia do mundo rico permite ao Brasil baixar inflação e juros com menos custo

SERIA CONVENIENTE o governo de Dilma Rousseff explicar com clareza como pretende reagir à recaída do mundo rico no tumulto econômico.
Supõe-se, assim, que a presidente e seus economistas já saibam como reagir pelo menos no caso do prognóstico ora mais provável, de quase estagnação nos EUA e na Europa. Isto é, excluídas as hipóteses de recessão ou colapso à la 2008.
O governo, porém, sabe, mesmo, como vai reagir à neocrise?
Em público, a mensagem do governo é um pouco confusa.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem repetido quase diariamente que vai controlar o gasto público e que o "fiscal terá surpresas positivas" mês a mês.
O ministro parece dizer, pois, que o governo não recorreria a aumento extra de gasto a fim de conter eventual redução do crescimento, reflexo da leseira euroamericana.
Gente do governo, próxima de Dilma, vaza para nós, jornalistas, que a presidente tem dito a seus ministros e a líderes no Congresso (existem?) que quer segurar despesas e passar imagem de austeridade.
Porém, a presidente tem repetido, de modo algo estereotipado, a campanha de Lula na crise de 2008: "Não vamos parar de consumir".
Diz ainda que não aceita que a crise produza recessão no Brasil. Na verdade, tem dito em público e nas internas que gostaria de manter o crescimento em pelo menos 4% ao ano, em 2011 e em 2012.
Talvez seja possível manter o crescimento em 4%, por aí. Mas ao custo do aumento de desequilíbrios que já perturbam a nossa economia; ao custo de perder a oportunidade de reduzir a taxa de juros e sair da crise com as contas públicas e a economia mais em ordem.
A taxa básica de juros no Brasil está alta (embora menor que logo antes do colapso de 2008, em termos reais -descontada a inflação). Ficaria alta até o final do ano que vem, provavelmente, pois a economia se desacelerava muito devagar e a inflação mal vinha se movendo.
Mas o Brasil acaba de ganhar uma recessão de crescimento, uma desaceleração da atividade econômica -ou melhor, é provável que vá ganhar esse "presente".
Por que "presente"? Porque a desaceleração do crescimento necessária para derrubar a inflação talvez não careça de taxas de juros altas por muito mais tempo.
Taxa de juro menor (Selic) implica redução da despesa adicional com juros, melhoria do balanço nominal do setor público (menos deficit) e menos transferência de renda indesejável (juros altos transferem renda para quem está mais bem de vida e tem para emprestar, óbvio).
Para "merecer o presente", porém, o governo tem de abrir mão da obsessão de manter o crescimento a 4% a qualquer custo (no curto prazo). Não pode aumentar o gasto, empurrar os bancos estatais a emprestar mais. Por falar nisso, seria adequado fazer com que o BNDES segurasse seus empréstimos.
Parece esquisito pedir que o governo tome atitudes que permitam ao país crescer menos. Não é. Trata-se apenas de pedir ao doente que repouse um pouco, enquanto está febril (com a infecção da inflação).
O repouso pode permitir recuperação mais rápida, talvez reduzindo a quantidade de remédio que o doente deve tomar. Enfim, podemos sair da crise com uma taxa de juros mais baixa e as contas em ordem.

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