segunda-feira, agosto 08, 2011

GUILHERME FIUZA - Dia do Orgulho Hétero: a guerra inútil do sexo


Dia do Orgulho Hétero: a guerra inútil do sexo
GUILHERME FIUZA
Revista Época 

A ideia da criação do Dia do Orgulho Heterossexual em São Paulo, apesar de idiota, é coerente. É para esse tipo de aberração que a história "progressista" caminha. O Brasil elegeu e santificou um ex-operário, o mundo achou que estava salvo com a eleição de um presidente americano negro, o Brasil se achou moderno ao passar a ser presidido por uma mulher. Obama está enrolado numa crise política (com pretextos financeiros), Dilma se debate com a corrupção herdada dela mesma e Lula fatura com palestras populistas ao lado do cadáver insepulto do mensalão. Mas o que importa são as bandeiras.

A eleição de um negro para a Casa Branca foi importante como símbolo. Mas o arrastão politicamente correto que coloniza o planeta logo a transformou numa panaceia, numa estranha apoteose étnica – como se a grande virtude de Obama fosse a cor de sua pele. Preconceito com sinal trocado. Essa espécie de "racismo do bem" não poderia dar em outra coisa: excitou a reação conservadora, fazendo emergir a ala radical do Partido Republicano e agravando a crise da dívida dos Estados Unidos.

É exatamente o mesmo fenômeno que ronda a exacerbação da cultura gay. O que poderia ser um movimento saudável, de afirmação dos que foram (e são) oprimidos por sua natureza afetiva, ganha tons de arrogância e até revanchismo. Foi assim que o MST começou a botar os pés pelas mãos: seguindo a doutrina de aprendizes de maoísmo como João Pedro Stédile, não bastava conquistar terras – era preciso depredar as instalações dos proprietários.

De repente, a moral heterossexual precisa ser confrontada. Figuras retrógradas, como o deputado Jair Bolsonaro, ganham combustível e até se declaram vítimas de "heterofobia" – miseravelmente com razão. Quem não tem orgulho gay, ou não simpatiza com a causa, está na berlinda. Como se isso fosse antídoto para a opressão passada, presente ou futura. A principal novela da televisão brasileira força a barra pela "normalidade" dos casais gays, querendo apressar a assimilação de costumes na base da militância. É um tiro que sai pela culatra (sem trocadilho, diria o filósofo Agamenon Mendes Pedreira).

O Dia do Orgulho Hétero, aprovado pela Câmara Municipal de São Paulo, é uma excrescência. Mas é herança legítima do movimento gay, ou pelo menos de sua face totalitária, difundida pelos evangelizadores do politicamente correto. Se carregar a bandeira gay significa, em alguma medida, constranger os héteros, estaremos andando em círculos no território da discriminação (não importa para que lado ela esteja apontada). É quando os progressistas se tornam, orgulhosamente, reacionários.

Quando os progressistas se tornam reacionários, nós andamos em círculos no território da discriminação

Em outra frente de "discriminação progressista", o sistema de cotas nas universidades produziu um resultado curioso. Em 15 anos de adoção da medida, com reserva de vagas para negros e provenientes de escolas públicas, a presença das classes C, D e E nas universidades federais não cresceu nem um ponto porcentual (eram 44,3% em 1996 e 43,7% em 2010).

Houve um ligeiro aumento da presença de pretos e pardos e também de estudantes vindos de escolas públicas. E por que mesmo foi implantado o sistema de cotas? Para dar oportunidade no ensino superior a minorias socialmente desfavorecidas. Como se viu pelo resultado da pesquisa por classes, as cotas não beneficiaram quem tem menor renda. Ou seja: negros ficaram com vagas de brancos de sua mesma faixa social, assim como estudantes de escolas públicas ganharam o lugar de colegas do ensino privado com o mesmo nível de renda (ou, possivelmente, até menor).

O que deveria ser uma forma de resgate social virou, portanto, privilégio racial (e curricular). A "discriminação progressista" tornou-se só discriminação.

Os politicamente corretos não descansarão enquanto pretos e brancos, ricos e pobres, gays e héteros não entrarem definitivamente em guerra.

6 comentários:

  1. Anônimo10:57 PM

    Que venha a guerra meu senhor! O senhor deve estar usando seu dicionário com a sua bundona gorda confortavelmente sentada em cima de uma revista Play-boy última edição! Lamentável... acho que o último livro que o senhor leu foi a Ilha Perdida! Sorte Sr consultante do Aurélio...

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  2. Anônimo2:45 AM

    Parabéns pelo texto, que retrata a triste realidade para a qual acredito caminharmos cada vez mais. Cabe ao Estado proteger as minorias, mas ninguém - em nenhum lado, por nenhuma causa - tem o direito de ofender o próximo.

    O infeliz comentário do anônimo acima é nada mais que uma prova de como o extremismo cega, de como o fanatismo elimina o argumento. Isso sim é lamentável.

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  3. Grande texto e no paragrafo final, finalizou bem, porque a guerra dos sexos já está ai desde o feminismo

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  4. Boa discussão crítica a respeito da discriminção no Brasil. São reflexões desse porte que nos fazem reaver o respeito humano e a necessidade de políticas educacionais para buscarmos ustiça social.

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  5. Bolsonaro vítima de heterofobia e com razão? Só por não ter orgulho gay?

    Bem, se o Bolsonaro vem sendo alvo de chacotas desde a infância por conta do seu comportamento heterossexual, talvez até tivesse algum peso essa afirmação, mas além de podermos desconsiderar essa possibilidade sem muitas chances de cometer um equívoco, ainda posso inferir que o problema com Bolsonaro está longe de ser falta de um orgulho gay, como o texto sugere, posto que o deputado faz duras críticas a homossexualidade sem apresentar argumentos convincentes. Sempre o velho clichê de que alguém é homossexual por culpa da educação, ainda que pesquisas recentes evidenciem a presença de componentes genéticos e fisiológicos na determinação da sexualidade.

    Também me confundiu o uso da expressão "não simpatizar com a causa". Ser homossexual não é uma causa, é um fato, como ser canhoto, não há cabimento para se apoiar ou não uma orientação inata. A "causa gay" só é uma causa enquanto tiver como objetivo a defesa do estado democrático de direito.

    Admitindo-se ainda uma causa gay, duvido muito que a tal face totalitária tenha atitudes comparáveis às do MST.

    Os argumentos existentes contra a homossexualidade são tão consistentes quanto os argumentos que outrora sustentaram a supremacia dos europeus sobre os demais povos ou ainda as virtudes em se escrever com a mão direita, criando a partir daí aberrações de significados antagônicos como o existente em "destro" e "sinistro.

    Às favas ao politicamente correto que não admite debate, o que não é pouco comum, mas tratar a homossexualidade como algo com que podemos simpatizar ou não, no que tange a direitos e garantias fundamentais, não parece ter muita coerência.

    Pelo trocadilho o autor parece incorrer no equívoco de associar a homossexualidade apenas ao parceiro passivo, ignorando que o parceiro ativo também tem uma ereção, ignorando que este se excita ante a visão e os odores de outro homem.

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  6. Flavia6:02 PM

    Excelente texto.È isso mesmo!Estamos na epoca do "forçar a barra". Caimos no extremo oposto, perdemos o equilibrio e situações desequilibrads nunca duram muito tempo!

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