sábado, julho 30, 2011

MERVAL PEREIRA - Mudança de enfoque


Mudança de enfoque
MERVAL PEREIRA
O Globo - 30/07/11

Há uma alteração importante de enfoque na discussão das mudanças das regras da distribuição das chamadas “participações governamentais” da produção de petróleo, que incluem bônus de assinatura; royalties; participação especial e participação na partilha de produção.

A ganância com que a distribuição dos royalties vinha sendo debatida, a partir de propostas de parlamentares de estados não produtores, está sendo substituída por uma ação política mais organizada que coloca estados produtores – Rio, São Paulo e Espírito Santo – em condições de negociar com os demais estados uma divisão mais equânime que permita um ganho razoável sem que os produtores sejam prejudicados.

O que levou a essa posição mais equilibrada foi a compreensão por parte dos litigantes de que a questão poderia parar no Supremo Tribunal Federal, adiando indefinidamente uma solução, e mais que isso, retirando dos Estados o poder de decisão sobre um assunto que interessa a todos.

Ao mesmo tempo, os Estados e Municípios enfrentam uma difícil situação fiscal, agravada pela redução dos seus respectivos Fundos de Participação, fundamentais para a sustentação financeira.

O Supremo já determinou que os Estados não podem fazer a chamada “guerra fiscal”, utilizando-se de incentivos para atrair empresas, e também mandou que a distribuição do dinheiro dos Fundos obedeça a critérios mais lógicos.

Se os Estados não se acertaram entre si, mais uma vez deixarão que o STF decida sobre a distribuição de impostos federais, permitindo que as negociações políticas sejam ultrapassadas pelas decisões judiciais.

Como lembrou o senador Francisco Dornelles em recente discurso, o Rio sempre apoiou sistemas de distribuição da renda dos impostos nacionais com base no critério inverso da renda per capita.

Por esses critérios, o retorno para o Rio de Janeiro dos impostos aqui arrecadados foi de apenas 2,4%, enquanto no conjunto dos estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste foi de 56% e nos estados do Sul foi de 17%.

Por outro lado, o ICMS tem sua receita destinada na maior parte para o Estado onde se realizou a produção, com a exceção do petróleo, quando o imposto é cobrado no estado de destino, o que retira do Rio de Janeiro R$ 5 bilhões por ano.

Se todos esses assuntos forem levados para o Supremo, o que certamente ocorrerá se persistir a tentativa de retirar dos Estados produtores a receita dos royalties do petróleo que já lhes pertence de direito nos campos do pós-sal já em produção no modelo de concessão e nos do pré-sal já licitados também no regime de concessão, haverá um impasse jurídico que prejudicará a todos, produtores e não-produtores, a começar pelo atraso da exploração dos campos do pré-sal.

O primeiro prejuízo dos estados produtores de petróleo foi, na mudança do sistema de concessão para o de partilha, o fim das participações especiais, que resultaram, em 2010 em um ganho aproximado de R$ 6 bilhões para os Estados produtores, montante que passou a ser um ganho adicional da União.

Além disso, houve a criação da Participação da Partilha de produção, que será totalmente apropriada pela União. Com base nos ganhos extras que a União terá, tanto pela mudança de modelo de exploração quanto pelo aumento das reservas de petróleo no pré-sal, os Estados fizeram um documento com uma série de propostas que, preservando o direito adquirido dos Estados produtores, redistribuiriam as participações governamentais para os demais Estados, ajudando inclusive no fortalecimento dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios.

No período de transição, até que os campos do pré-sal entrem em produção, os Estados não-produtores receberiam antecipações da parte da União dos royalties e Participações Especiais dos campos em produção do pós-sal.

Para tanto, bastaria que a União cumprisse o que já está determinado na legislação. Do que o Ministério de Ciência e Tecnologia tem direito, por exemplo, a lei manda destinar 40% no mínimo em programas de fomento à capacitação e ao desenvolvimento científico e tecnológico das regiões Norte e Nordeste. Esses recursos são estimados entre R$ 500 e 600 milhões.

Da mesma forma, a legislação prevê destinação específica para a parcela de Participações especiais, que no entanto, não está sendo repassada para estados e Municípios por que está sendo contingenciada para fazer o superávit primário.

Nos campos do pré-sal já licitados, sob o modelo de concessão, a proposta é que o Fundo Social que será formado com a parcela de royalties e participações especiais da União redistribua esse dinheiro aos Estados e Municípios.

A União, através de ministros da área e até mesmo da própria presidente da República, está recusando abrir mão de seus lucros para redistribuí-los, alegando que os Estados devem se entender entre si para essa nova redistribuição dos lucros do petróleo.

Para sanar essa suposta sangria nos cofres do governo central, a proposta dos Estados inclui o aumento da receita da União através de duas medidas.

A primeira seria a revisão das alíquotas das Participações Especiais, que foram introduzidas no modelo de concessão para taxar os campos de alta lucratividade, de modo a obter um equilíbrio entre os ganhos empresariais e os da Nação.

As tabelas em vigor foram feitas em 1977, quando o preço do barril de petróleo estava a U$ 16, e a produção era muito menor. Hoje o barril de petróleo está acima de U$ 100, e as reservas brasileiras cresceram incrivelmente.

Simulações indicam que um aumento de 30% nas alíquotas, aplicado na produção atual, resultaria em aumento de arrecadação da ordem de R$ 3 bilhões.

Governos como dos Estados Unidos e Grã Bretanha estão fazendo o movimento para aumentar a taxação das operadoras, devido ao aumento do preço do petróleo.

O governo poderia também cobrar bônus de assinatura para os campos do pré-sal, mesmo no sistema de partilha.

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