terça-feira, julho 12, 2011

ALON FEUERWERKE - Pastel de vento


Pastel de vento
ALON FEUERWERKE
Correio Braziliense - 12/07/2011

Dilma Rousseff está colocada diante do risco real de preencher pelo menos três quartos do governo dela com crescimento econômico abaixo da inflação. Crescimento medíocre com elevação pouco saudável de preços

E aconteceu. Pela primeira vez em semanas, o mercado financeiro subiu as previsões de inflação, para este ano e o próximo. As projeções vinham recuando havia dois meses. Mas agora a subida foi expressiva. A aposta para 2011 cresceu de 6,15% para 6,31%. A de 2012 algo menos, de 5,10% para 5,20%.

Ou seja, o governo volta à desvantagem na guerra das chamadas expectativas, que numa economia ainda muito indexada — como a nossa — têm maior capacidade de autorrealização. Vem aí uma época de negociações salariais pesadas e a tendência sindical será trabalhar com índices mais altos.

Índices assentados tanto nos resultados do passado quanto na tentativa de adivinhar o futuro. Se os bancos podem apostar, igualmente os trabalhadores.

E não vai ser diferente na guerra entre os fornecedores e a indústria. E entre ela e o comércio.

O governo começou o ano vendendo uma estratégia que parecia fazer sentido. Perseguir a meta de inflação apenas no médio prazo, para não comprometer o crescimento econômico. Os preços tocariam ou mesmo furariam o teto da meta, 6,5%, em algum momento de 2011, mas convergiriam para o centro, 4,5%, em 2012.

A viabilidade desse nado sincronizado começou a colher dúvidas ainda na largada e o Banco Central concluiu que precisava estender no tempo e na quantidade a terapia de mais juros. Estamos exatamente no meio dessa etapa do tratamento.

Por isso, é alarmante que as expectativas tenham sofrido alguma deterioração bem agora. E o número mais problemático nem é o de 2011. É o do ano que vem. De duas uma: ou o BC adia para 2013 a pretendida convergência para o centro da meta ou vai ter que apertar o juro ainda mais.

E sem a certeza de sucesso, pois o crédito continua bombando.

Dilma Rousseff está colocada diante do risco real de preencher pelo menos três quartos do governo dela com crescimento econômico abaixo da inflação. Crescimento medíocre com elevação não saudável de preços. Pelo menos no Brasil, tem sido receita de dificuldades.

A presidente enfrenta certa turbulência na política, mas até agora o governo dela não perdeu substância. Espantoso seria se tivesse perdido, pois são apenas seis meses e pouco na cadeira, menos de 13% do percurso total.

As tendências centrípetas neste período são fortíssimas. Quase sempre dão conta do recado até a administração entrar em voo de cruzeiro e as insatisfações darem as caras.

Dilma precisa cuidar para não ser colhida pela tempestade perfeita. Desconforto em alta no Congresso, desarranjos crescentes na relação com os aliados, incertezas na economia. A presidente está ainda distante do tornado, e ele pode até ser evitado, mas o governo precisará agir.

Nas diversas frentes. O otimismo retórico é bom. Mas divorciado da ação corre o risco de virar pastel de vento.

Na prática
Impressionante o relato do jornalista acreano (ou acriano) Altino Machado sobre a desesperança econômica na Xapuri de Chico Mendes, no seu Acre.

Apenas confirma que o movimento verde ainda tem uma longa caminhada até conseguir materializar, na vida prática, as boas ideias sobre economias tão prósperas quanto sustentáveis.

A reportagem está no blog altino.blogspot.com, aliás uma fonte especial de notícias independentes sobre a Amazônia.

Quem ganhou
O ambiente no Senado tende a produzir um Código Florestal de consenso. Será na essência a proposta aprovada na Câmara dos Deputados, com ajustes.

Mas se o governo decidir pelo confronto, como na Câmara, a tendência é nova derrota.

A condução do tema resultou numa situação curiosa. Ninguém discorda tanto assim de ninguém, mas todo mundo exige aparecer como tendo derrotado alguém.

Num assunto de alta complexidade, como é o Código, trata-se de risco sempre presente. Uma coisa é o que vai acontecer. Outra coisa é o que vão dizer que aconteceu.

Como a esmagadora maioria, no Congresso e fora dele, não tem a menor ideia dos detalhes, acreditará que ele é bom ou mau conforme os portadores da verdade sentenciarem ao final.

A esta altura, é disso que se trata.

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