sábado, maio 07, 2011

PAULO R. HADDAD - BC - eficiência e confiabilidade


BC - eficiência e confiabilidade
PAULO R. HADDAD
O ESTADO DE SÃO PAULO - 07/05/11
O que poderá ocorrer quando, ao longo das próximas semanas, a taxa anualizada de inflação começar a superar o teto da meta programada pelo Banco Central (BC)? Provavelmente, um perigoso e persistente processo de indexação informal dos preços de bens e serviços e dos próprios ativos, restabelecendo-se assim a marca de um passado que parecia superado na nossa história recente.

Tudo indica que esse processo deverá ser mesmo inevitável, por três motivos pelo menos. No campo das ideias, estão retornando as concepções equivocadas de que as opções para a política monetária se limitam a quem deseja uma recessão no Brasil versus quem deseja um combate radical à aceleração inflacionária. No campo político, embora não pareça, o controle dos gastos públicos ainda é inexpressivo e de natureza incremental, tornando a contribuição da política fiscal para a redução das taxas de inflação pouco intensa. No campo das expectativas, à medida que se adentrar no segundo semestre, os agentes econômicos irão precificar os prováveis impactos inflacionários da política salarial de 2012, que é extremamente relevante para a formação de preços relativos de uma economia onde a contribuição direta e indireta dos serviços é cada vez mais expressiva.

Do lado do Banco Central, parece estar ocorrendo um equívoco de percepção da importância da dimensão da confiabilidade em sua atuação. O que, na verdade, reflete uma postura profissional dos economistas, muito atentos às normas de eficiência e muito desatentos às normas de confiabilidade. E, num momento como o atual, dominado por inflexões e incertezas econômicas em escala nacional e global, as normas de confiabilidade devem ser dominantes.

Os economistas, quando convocados para elaborar e implementar uma política econômica, quase sempre se deixam guiar pelos princípios da eficiência. Definem os objetivos da política; quantificam esses objetivos em metas; selecionam os instrumentos de intervenção mais apropriados para que os objetivos sejam atingidos; e estabelecem mecanismos de controle e avaliação para acompanhar a eficiência e a eficácia da política.

Tudo isso produz um sistema coeso e exato, que lhes permite falar sobre a política com otimismo sobre os resultados esperados. Esse otimismo os leva quase sempre a despir a política econômica de redundâncias protetoras. As redundâncias, que normalmente são interpretadas como formas de desperdício, são, na verdade, salvaguardas corretivas dos rumos menos adotados inicialmente.

Os economistas, cada vez mais, estão trabalhando profissionalmente com modelos abstratos, que incorporam, cada vez menos, componentes institucionais e psicossociais da realidade sobre a qual intervêm e, portanto, diminuem significativamente a sua capacidade de predizer as mudanças que podem ocorrer a partir dos instrumentos que controlam.

Por isso, é sempre recomendável que, na concepção das políticas econômicas, se complementem as normas de eficiência com normas de confiabilidade, as quais se orientam mais para evitar o fracasso do que para garantir um retumbante sucesso. O uso das normas de confiabilidade estimula uma participação mais ampla de atores com formação profissional diferenciada para abrir os horizontes dos economistas, com suas ideologias primárias da realidade social. Permite, também, cobrir as políticas econômicas de redundâncias protetoras, tornando-as mais resistentes a choques exógenos, a efeitos inesperados e às falhas comuns nas predições condicionais.

Assim, se o BC, por absoluta incapacidade política de influenciar os rumos da política fiscal como um insubstituível componente de redundância da política monetária, desejar conduzir a política anti-inflacionária baseado apenas em normas de eficiência, tenderá a caminhar em cima "de um fio de navalha" e assistir à erosão do grau de confiabilidade em suas ações.

Paulo R. Haddad PROFESSOR DO IBMEC/MG, FOI MINISTRO DO PLANEJAMENTO E DA FAZENDA

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