sábado, maio 28, 2011

MÍRIAM LEITÃO - Trégua e risco


Trégua e risco
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 28/05/11

Nos próximos meses haverá boas notícias em relação à inflação. Em maio, o IPCA deve ficar em 0,5% e cairá mais. Depois de ter subido 3,23% de janeiro a abril, a taxa poderá ser de apenas 1% no acumulado de junho, julho e agosto. Será o trimestre da trégua e do risco de se acreditar que tudo está resolvido. O Ministério da Fazenda não poderá dar a batalha por vencida.

Esse recuo será resultado de uma soma de fatores: não há reajustes programados de preços administrados, a gasolina deve cair na bomba pelo efeito da diminuição do preço do álcool, os preços dos alimentos caíram no atacado e podem diminuir nos supermercados. Mesmo assim, a inflação será maior do que no mesmo trimestre do ano passado que ficou em zero. Em 12 meses, continuará subindo.

Depois do período de trégua de junho a agosto, novas pressões virão como reajustes de energia em grandes centros e as negociações salariais de categorias fortes. Como a demanda continua aquecida e foram criadas barreiras às importações em algumas áreas, a tendência das grandes empresas será de repassar para os preços aumentos nos custos trabalhistas.

A grande incógnita continua sendo o ano que vem. O BC prometeu a taxa para o centro da meta no fim de 2012. A dúvida é como. No início do ano haverá um forte choque de custos na área de serviços com a elevação do salário mínimo em 14%. Se o IPCA encerrar este ano em 6,5%, no teto da meta, isso significa que o BC terá de derrubar dois pontos percentuais na taxa de inflação durante o ano que começará com essa pressão.

O economista Luis Otávio Leal, do Banco ABC Brasil, lembra que a inflação de serviços está em 8,6%. Ela é muito influenciada pelo salário mínimo. "Nos próximos dois meses, o BC verá dois números bem diferentes: um caindo e um subindo. Ele não pode se deixar levar pelo canto da sereia. Precisa olhar para a frente tentando reduzir a inflação de serviços, porque neste patamar, ela, sozinha, terá um impacto grande no IPCA de 2012."

Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse também se preocupa exatamente com este ponto. "Apesar de a desaceleração da atividade contribuir para reduzir a inflação, julgamos que a forte elevação do salário mínimo em 2012 e o provável aumento da persistência inflacionária compensarão os benefícios para a inflação advindos da desaceleração da atividade. Nesse sentido, julgamos ser baixa a probabilidade de a inflação de serviços recuar significativamente em 2012", escreveu Teixeira em relatório. Ele nos disse que acredita que a taxa anual subirá até 7% nos próximos meses e que a inflação de serviços permanecerá alta. É a mesma convicção de outros economistas ouvidos pela coluna.

Em entrevista concedida esta semana ao jornal Valor Econômico , o ex-presidente do BC Ibrahim Eris disse que a instituição vive atualmente o teste mais duro do sistema de metas de inflação. Ele acha que o governo subestimou a pressão de demanda, um dos elementos que elevaram a taxa este ano.

O processo inflacionário vive momento bem específico. O que era sazonalidade na inflação cederá agora, mas as outras causas vão continuar. Além do mais, há problemas já contratados como a crise do álcool que é mais estrutural, tornando a oferta instável.

O governo teve um bom resultado primário nas contas públicas nos primeiros quatro meses, mas porque o IOF e a demanda forte elevaram a arrecadação. Não cortou nos seus gastos e está reduzindo o ritmo dos investimentos; o oposto do que deveria fazer.

Os juros subiram comparados com a inflação dos últimos doze meses, os juros reais estão em queda apesar de o País ter uma das taxas de juros mais altas do mundo. Se a conta for feita olhando-se a expectativa de inflação, os juros estão em alta, mas apenas se forem confirmadas as previsões de queda da inflação no ano que vem. Para isso, não pode ocorrer nenhum imprevisto ou pressão extra, o dólar não pode subir, o governo tem de neutralizar o impacto do salário mínimo na inflação de serviços. Há riscos pela frente. E haverá uma trégua. É aproveitar a trégua para reforçar os esforços contra outras causas da inflação.

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