Novos desafios para o Fed
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
FOLHA DE SÃO PAULO - 06/05/11
O Fed precisa mudar o discurso de que a atual política monetária será mantida por longo tempo
O FEDERAL Reserve, em sua última reunião, reafirmou a decisão de ir até o fim em sua política de inundar o mercado de dólares baratos, chamada de Quantitative Easing 2.
O banco central americano, sob a liderança firme e decidida de seu presidente, vem seguindo à risca a leitura feita por Lord Keynes, ainda na primeira metade do século passado, sobre como evitar uma depressão econômica em um ambiente de pânico financeiro.
Ben Bernanke tem o reconhecimento hoje, mesmo no grupo mais ortodoxo de analistas, de ter evitado o pior na maior economia do mundo. Mas começa a enfrentar novos desafios para consolidar definitivamente suas vitórias.
Os dados mais recentes mostram que alguma vida já voltou à economia, a recessão é coisa do passado e a geração de empregos parece ter voltado de forma perene.
Para 2011, os analistas de mercado trabalham com crescimento de mais de 3% e queda significativa na taxa de desemprego.
Mas partes importantes da economia -o setor imobiliário e o bancário, principalmente- ainda sentem as consequências da crise que começou em 2008. Por isso, ainda é frágil a confiança dos agentes econômicos em uma superação perene.
Por essa razão, o Fed já avisou que prefere errar na direção de uma política monetária expansionista, mesmo com o risco de inflação mais elevada mais à frente, do que permitir uma nova recaída da atividade econômica.
Mas seus principais instrumentos de ação -juros próximos de zero e compras maciças de títulos emitidos pelo governo americano para financiar seus exorbitantes deficit- estão provocando tensões imensas em outras economias, principalmente via canal cambial.
O dólar não para de cair, provocando valorização cambial quase insuportável em vários países e criando uma bolha de liquidez no mundo todo. Na busca desordenada por investimentos financeiros de maior risco, os grandes detentores de capitais exportam o excesso de liquidez nos EUA para países que não sofrem do mesmo mal americano. O Brasil é um exemplo dessa armadilha, com inflação em aceleração e a moeda pressionando a indústria.
Por outro lado, a fraqueza da moeda americana está provocando aumento expressivo dos preços em dólares de produtos primários como alimentos, metais e, principalmente, o petróleo. Como a inflação ex-petróleo não sobe por conta da imensa capacidade ociosa na economia americana -principalmente no mercado de trabalho-, o Fed segue em frente com sua política e acaba exportando inflação para as outras economias.
Mas o aumento dos preços do petróleo começa também a atrapalhar a ação do BC americano. Preços bem mais altos dos combustíveis nos EUA estão corroendo a renda do consumidor e diminuindo sua confiança na recuperação econômica.
Uma espécie de ciclo vicioso perverso se formou, com o excesso de liquidez e juros muito baixos enfraquecendo o valor do dólar nos mercados de câmbio, o que leva a preços do petróleo sempre mais altos, que corroem a renda do consumidor norte-americano, que pressiona a economia para baixo, que obriga o Fed a manter a política monetária frouxa e expansionista, que enfraquece o valor do dólar, que....
O Fed precisa entender que medidas heterodoxas -por mais corretas que sejam em um momento de crise- mantidas por um tempo muito longo provocam efeitos colaterais danosos à economia.
Volto sempre à minha comparação entre uma economia de mercado e o organismo humano para entender o momento por que estão passando os EUA. A partir de certo momento, os efeitos negativos de uma medicação agressiva -e esse é o caso do Quantitative Easing 2- passam a ser maiores do que seus benefícios. Temo que já chegamos a esse ponto.
Talvez já seja a hora de uma mudança nos discursos do Fed, com a retirada da mensagem de que a política monetária atual será mantida por um longo período de tempo e, com isso, um primeiro sinal de normalização seja dado.
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