quarta-feira, maio 25, 2011

ELIO GASPARI - Saúde de presidente é coisa séria


Saúde de presidente é coisa séria
ELIO GASPARI
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/05/11

No dia 30 de maio, uma segunda-feira, Dilma Rousseff foi atendida no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, e seu médico particular, Roberto Kalil, informou que ela teve "uma leve pneumonia". A doença seria consequência de uma gripe contraída semanas antes, na volta de sua viagem à China. Logo retomaria sua rotina, mas deveria tomar antibióticos por dez dias.

Durante as três semanas seguintes, a presidente cancelou uma viagem ao Paraguai, duas ao Rio de Janeiro e passou quase todo o tempo no Palácio da Alvorada. O que era uma "pneumonia leve" mostrou-se coisa diversa.

Passadas duas semanas do diagnóstico de Kalil, soube-se que Dilma não aceitara uma recomendação para ficar internada no Sírio-Libanês. Mais: a pneumonia, diagnosticada em Brasília dois dias antes, determinara sua viagem a São Paulo.

Na última sexta-feira, a repórter Renata Lo Prete informou: "As informações inicialmente divulgadas sobre a pneumonia de Dilma se revelaram improcedentes não apenas quanto ao fato de a infecção não ter sido ''leve''. Agora, assessores da presidente admitem que foram atingidos os dois pulmões, e não somente um."

No mesmo dia, o repórter Ancelmo Gois avisava:

"Foi muito mais grave do que o governo divulgou a pneumonia de Dilma."

O que é que houve com Dilma Rousseff? Neste artigo não há uma única informação capaz de responder a esta pergunta. Com certeza, a presidente caiu (ou colocou-se) numa armadilha velha, perigosa, e geralmente inútil. Seja qual for o governo, seja qual for o regime, sempre haverá cortesãos prontos para informar que nada há de anormal com o doente.

O mascaramento começa com um movimento quase ingênuo, bem-intencionado. O problema é "leve" e passageiro, não havendo motivo para intranquilizar o público. No lance seguinte, criam-se uma realidade virtual e um círculo protetor do sigilo. Sucedem-se agendas com "despachos internos" ou mesmo reuniões de trabalho que não aconteceram. Quem protege o segredo persegue prestígio, mas desgasta a própria credibilidade e estimula inevitáveis indiscrições que alimentam boatos. (Em 1969, quando a Junta Militar dizia que o marechal Costa e Silva, paralisado por uma isquemia, estava melhorando, corria na rua que ele estava embalsamado no Palácio Laranjeiras.)

Talvez a doutora Dilma acredite que o Planalto foi de transparência exemplar em 2009, ao contar que ela padecia de um câncer linfático. Não foi bem assim. O quadro foi reconhecido no dia 25 de abril, horas depois de a repórter Mônica Bergamo ter revelado que ela recebera um cateter para administração de medicamentos quimioterápicos. Ela fora operada no dia 28 de março e já passara por uma primeira sessão de quimioterapia. Tudo em segredo. Deu certo, mas precisava?

Dois anos depois, a pneumonia "leve" não foi confirmada, a especulação sobre a saúde da presidente tornou-se um esporte e os exageros foram liberados. Tudo ficaria melhor se um assunto desse tamanho fosse administrado publicamente, com médicos que só falam de medicina, em notas oficiais (responsabilizando-se profissionalmente), e por autoridades da Presidência da República que, de medicina, não falam. Assim, protegem-se os médicos, o governo e, sobretudo, os pacientes.

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