quinta-feira, abril 14, 2011

CORA RÓNAI - Ninguém pensou nos jovens


Ninguém pensou nos jovens 
CORA RÓNAI

O GLOBO - 14/04/11

Não, eu não fui ao Teatro Municipal no dia da abertura da temporada da OSB. Muito me arrependo: perdi um espetáculo histórico, uma lição de cidadania e de lealdade dada por jovens instrumentistas solidários com seus mestres e colegas.
Recapitulando, para quem estava de férias em Marte: a nossa Orquestra Sinfônica Brasileira, tal como a conhecíamos, acabou. Metade dos músicos foi demitida pela Fundação, por se recusar a passar por uma avaliação, se não mal intencionada, pelo menos muito mal explicada pelos diretores. A questão é que um bom maestro tem a possibilidade de avaliar seus músicos a cada ensaio, assim como, digamos, um bom editor avalia a sua equipe a cada edição do jornal. Mal comparando, propor a avaliação de toda uma orquestra, nos moldes propostos pela FOSB, equivale a mandar uma redação inteira fazer vestibular de jornalismo.
Bom. Com a OSB no limbo, a abertura da temporada caiu em cima da OSB Jovem, que fez tudo direitinho. Entrou em cena com seus instrumentos, sentou-se e, assim que o maestro, debaixo de vaias, ergueu a batuta, levantou-se em peso e retirou-se do palco, deixando o senhor Minczuk colher a tempestade que tinha plantado.
Representantes da OSB Jovem retornaram ao palco pouco depois, para ler um manifesto, mas a palavra lhes foi negada. O que queriam dizer os jovens? Leiam o que escreveu Matheus Moraes, um dos membros dessa valente e correta orquestra:
"Por que nós fizemos o que fizemos? Antes de responder a essa pergunta, eu gostaria de fazer uma outra, que me consumiu por noites inteiras: por que o concerto não foi cancelado? As razões pelas quais o concerto deveria ter sido cancelado não cabem numa carta. A OSB está passando por uma crise de proporções nunca vistas. Praticamente toda a comunidade musical se manifestou contra o que está sendo feito pela FOSB. Só de cabeça, a UniRio, a UFRJ, a Fundação Villa-Lobos, a Petrobras Sinfônica, a Sinfônica do Teatro Municipal, a Ordem dos Músicos do Brasil e o SindMusi publicaram notas oficiais em repúdio. Artistas de calibre internacional se recusaram a se envolver com a orquestra nesse período, como Nelson Freire, Cristina Ortiz, Roberto Tibiriçá, Ana Botafogo, Alex Neoral, Fabiano Segalote e Marina Spoladore, ou manifestaram-se por carta aberta contra as atitudes da FOSB, caso de Isaac Karabtchevsky, Alex Klein, Ricardo Rocha, Allison Balsom e dúzias de outros.
"Nós, músicos jovens e (pelo menos no meu caso) pouco experientes, nos vimos na posição de substitutos involuntários de nossos colegas - e em inúmeros casos, também nossos professores, mentores, amigos, exemplos profissionais. Nós sofremos com isso, e não foi pouco. Nós fomos colocados como defensores das atitudes de nossos superiores. Afinal de contas, se continuamos tocando sob suas ordens e acatando suas decisões, como poderíamos estar a favor de nossos colegas demitidos?
"Fora tudo isso, havia o acúmulo de carga em volta do concerto em si. Mais de uma vez, os assinantes das séries da OSB vieram a público manifestar que não queriam, nem haviam pago, para assistir a uma orquestra jovem. É fato sabido que músicos da OSB estariam tocando do lado de fora do teatro em protesto; e que músicos de outros grupos e localidades entrariam no teatro com o único intuito de protestar contra Minczuk e vaiar os músicos.
"Coloquem-se, por um minuto, na situação em que a OSB Jovem se via: seu público dividido entre assinantes desconfiados e músicos hostis, e, do lado de fora, nossos ofendidos colegas e mestres tocando em protesto ao concerto que nós estaríamos executando. Daí a minha pergunta: por que o concerto não foi cancelado? Por que esse concerto foi levado a cabo, até às últimas consequências, se tudo e todos estavam contra ele?
"A OSB Jovem é um projeto pedagógico; nós estamos ali para aprender. O que poderia ser aprendido sob essas condições? Por que nem um único dos 11 membros do Conselho levantou a questão de o quanto estar naquele palco, naquele dia, seria prejudicial para nós? Colocando de outra maneira, entre maestro, fundação, conselho, patrocinadores, produção e público; por que ninguém pensou na gente?"
Parabéns, Matheus, parabéns, meninos e meninas. Ninguém pensou em vocês, mas vocês souberam pensar por si próprios, e deram aos adultos uma linda aula de coragem e lealdade.
A esta altura, não há uma só orquestra no mundo que ignore o que está acontecendo no Rio. Entre as centenas de e-mails que circulam à velocidade da luz pela internet, destaco um trecho de Ole Bohn, spalla da Orquestra Nacional da Noruega, enviado para a garotada da OSB Jovem:
"Como vocês sabem, o único responsável por esta situação é o senhor Minczuk. Ele usou mal o seu próprio instrumento, que são seus músicos. Quando tentou tocar outro instrumento - vocês - ele o maltratou igualmente. Mas vocês se mantiveram firmes e merecem a nossa maior consideração. (....) O que vocês fizeram terá grande impacto no futuro de músicos em todos os países. Vocês nos deram esperança e a prova de que dignidade e respeito ainda são parte da nossa profissão."
Pessoas, é dramática a situação dos cães e gatos abandonados do estado, desde as enchentes da Serra. Neste domingo, no Parcão da Lagoa, das 10h às 16h, haverá feirinha de adoção, com um bicho mais lindo do que o outro esperando um bípede para chamar de seu. A Ama Animal, que organiza o evento, fará também um bazar beneficente e pede doações de todos os tipos: remédios, ração, caminhas, coleiras e guias, produtos de limpeza e produtos pet em geral. Vamos lá? 

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