terça-feira, abril 12, 2011

BENJAMIN STEINBRUCH - Uma grata novidade


Uma grata novidade 
BENJAMIN STEINBRUCH

FOLHA DE SÃO PAULO - 12/04/11

OUVI DE um amigo uma piada muito engraçada. Um cidadão americano entrou em uma agência bancária de Nova York e pediu um empréstimo de US$ 6.000 para fazer uma viagem de negócios à Índia.
O gerente o recebeu gentilmente, mas argumentou que, não sendo cliente do banco, embora a quantia não fosse elevada, teria de apresentar garantias reais para receber o pronto financiamento. O homem então apontou para a rua e mostrou uma Ferrari vermelha estacionada em frente ao banco: "A garantia poderia ser meu carro?".
O funcionário pediu que a Ferrari fosse levada até a garagem do banco, conferiu a documentação do veículo e emprestou o dinheiro.
Quinze dias se passaram até que o cidadão voltasse à agência para quitar o financiamento. Ele cumprimentou o gerente, pagou os US$ 6.000 e mais US$ 16,31 de juros e já estava ao volante da Ferrari quando o funcionário resolveu perguntar:
"Desculpe a curiosidade, mas checamos seus dados cadastrais e descobrimos que o senhor é uma pessoa rica. Poderia explicar por que precisou pedir US$ 6.000 emprestados para viajar à Índia?".
A resposta veio com uma pergunta: "Onde eu poderia estacionar minha Ferrari em Nova York, com toda a segurança, durante duas semanas, por apenas US$ 16,31?".
Peço desculpas se, para você, essa é uma "piada velha", mas a conto porque ela tem a ver com o atual momento da economia global. Passados mais de dois anos desde o início da mais grave crise econômica desde 1929, os juros básicos continuam incrivelmente baixos em todo o mundo. Nos EUA, estão entre zero e 0,25% ao ano, a ponto de, relevadas as imprecisões técnicas da piada, parecer mais barato tomar um empréstimo de US$ 6.000 do que estacionar um carro por 15 dias.
Na semana passada, a OCDE informou que os países do G7, grupo das sete economias mais desenvolvidas mundo, com exceção do Japão, cresceram a uma taxa anual de 3,2% no primeiro trimestre. Apesar dessa recuperação e da previsão de uma taxa de 2,9% no segundo trimestre, as autoridades ainda não estão seguras para abrir mão do estímulo monetário que impulsiona a recuperação da economia no mundo rico e no emergente.
Os primeiros movimentos de elevação dos juros estão começando agora, com muita cautela. O BC Europeu fez o primeiro aumento na quinta-feira, mas a taxa ficou em módico 1,25% ao ano. A China também elevou sua taxa na semana passada para 6,3% para empréstimos, índice aparentemente alto, mas que, na realidade, está apenas um pouco acima da inflação prevista para 2011, de 5%.
Deu e ainda dá resultado a política adotada no Primeiro Mundo para sustentar a volta do crescimento econômico. Só Grécia, Irlanda, Portugal e Japão, entre ricos e emergentes, estão com previsão de recessão.
Soam desafinadas, portanto, as vozes do mercado financeiro brasileiro que pressionam o ministro Guido Mantega e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, a seguir no arrocho monetário. Só porque ficaram um tiquinho menos ortodoxos e adotaram as ditas medidas macroprudenciais, como as restrições ao crédito, e ameaçam estacionar a taxa de juros nos atuais 11,75% ao ano a Fazenda e o BC vêm sendo muito criticados.
O mercado quer mais juros, ainda que a combinação da taxa atual elevada com o bom momento vivido pela economia brasileira já represente um grande atrativo para poupanças externas, com desastrosos efeitos cambiais. No primeiro trimestre, houve o ingresso líquido de US$ 35 bilhões no país. Com isso, não há como segurar a valorização do real, esta, sim, uma enorme dificuldade da economia no momento.
O governo tomou na quarta-feira novas medidas para tentar controlar a entrada de capital, procedimento que já conta até com aval do FMI. Na quinta, anunciou o aumento do IOF sobre o crédito interno.
O encarecimento do crédito tem impacto direto na atividade econômica, mas as medidas estão na direção correta, para segurar o avanço da inflação. Espera-se que elas deem o resultado esperado. Deve-se louvar o fato de o Banco Central ser agora um pouco menos ortodoxo e mais consciente de suas responsabilidades de controlar a inflação sem comprometer o crescimento econômico. Eis, portanto, uma grata novidade do governo Dilma.

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