sábado, março 12, 2011

WALTER CENEVIVA

Teófilo Cavalcanti: o antecessor
WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 12/03/11

No campo do direito, os anos de Teófilo no jornalismo foram marcados por muitas mudanças


ESCREVO PARA a Folha desde meados dos anos 70, mas comecei a redigir esta coluna, originalmente chamada de "Letras Jurídicas", em 1978, sobre a vida do direito em nosso país e de muitos de seus personagens. Dado o tempo decorrido, pode acontecer que o leitor -e muitos dos que acompanharam os longos anos percorridos- suponha que fui o criador da coluna. Não fui.
Quem começou a dar forma a ela, no comentário dos temas do direito, foi Teófilo Cavalcanti Filho, jornalista, livre-docente em "Introdução à Ciência do Direito" e professor-adjunto no Departamento de Filosofia na velha Academia do largo São Francisco. Ele mesclou dois caminhos na vida, contraditórios na aparência. Foi, simultaneamente, autoridade sobre a teoria jurídica -com as dificuldades de sua aplicação- e qualificado repórter e redator da Folha.
Em ambos os segmentos, mostrou-se expositor claro e sintético. Agora, que a Folha tem seus 90 anos de vida digitalizados, abrem-se ao alcance de todos que queiram ler suas colunas, desde o começo delas. Assim se viabilizou, na prática, a velha ideia de rememorar aspectos da integração de Teófilo a São Paulo (ele nasceu em Crato, no Ceará) e à vida do direito, em períodos conturbados da vida brasileira.
Teófilo começou em 1960, noticiando, em seu primeiro trabalho, o novo sistema de indulto a condenados a penas iguais ou inferiores a três anos, além de breve comentário sobre a efetiva aplicação da Justiça e os esforços das entidades da advocacia para o mesmo fim.
Os anos da ligação de Teófilo com o jornalismo foram marcados, no campo do direito, por muitas mudanças. Somaram-se as variáveis da intranquilidade social nos anos subsequentes. Interferiram diretamente sobre a elaboração das leis - impostas pelo Poder Executivo- depois de 1964, seguindo-se por mais de 20 anos, restrições à liberdade de informação e ao sacrifício dos direitos individuais. Para o leitor que queira ter a visão completa sobre os fatos diários ou da história jurídica do país, na perspectiva de meu antecessor, basta entrar em acervo. folha.com.br, clicar em "Busca detalhada" e, finalmente, no campo "Com a frase exata", digitar Teófilo Cavalcanti Filho.
Além do contato com Teófilo por alguns anos, tive o prazer de advogar para pessoas de sua família, o que me permitiu que melhor conhecesse sua qualidade de cidadão interessado pelos fatos e pela compreensão do direito, na área da filosofia e do direito público. Seu trabalho sobre assuntos forenses foi mais ligado, no dia a dia, ao direito penal e enquanto comentarista de fatos e temas em várias áreas do direito.
Foi traço marcante de sua orientação transmitir o direito aos leitores, mesmo aos não ligados às profissões jurídicas, em termos acessíveis, quando necessário para sua compreensão integral.
É o que se percebe claramente, por exemplo, em texto de 1976 no qual perguntava "Pode analfabeto prestar fiança?". Sua resposta, incluindo questão do direito de família, traz solução cujo alcance prático se destacou ao delinear a mescla precisa entre o conhecedor do direito e o jornalista capaz de transmitir a clara avaliação final.
Completaria 90 anos no próximo dia 22, mas faleceu em 13 de abril de 1978, deixando obra expressiva que merece ser lembrada.

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