terça-feira, março 22, 2011

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Cenas dos últimos capítulos 
VINÍCIUS TORRES FREIRE


FOLHA DE SÃO PAULO - 22/03/11

O FIM do mundo esteve próximo duas vezes neste ano, em menos de um trimestre -em dois meses, aliás.
O mundo acabaria em fogo, no incêndio político que fecharia poços de petróleo do Oriente Médio e norte da África. O mundo acabaria derretido num cadinho de urânio, na fusão das varetas radioativas das usinas nucleares japonesas.
Pelo menos era o que a gente podia depreender da variação alucinada de indicadores financeiros e das não menos alteradas declarações de porta-vozes dos donos do dinheiro grosso, operadores, "analistas" e gestores do "mercado".
Mais específico, mas não menos bombástico, começaria uma nova era na produção mundial de energia. As usinas nucleares teriam como destino a lata de lixo atômico da história. Caíam as ações de empresas produtoras de reatores atômicos e urânio, por exemplo.
Ontem, subiam as ações das empresas produtoras de reatores atômicos e de urânio.
O "risco de recessão mundial" em tese aumentado pela síndrome do Japão derrubou preços de minérios, metais, combustíveis. E de ações.
Ontem, a conversa era aberta sobre as "oportunidades da reconstrução japonesa", sobre altas de preços de metais. Mais, que o horror japonês e o paniquito subsequente enfim deram uma oportunidade de xepa, de compra de ativos na baixa.
O petróleo (tipo Brent) anda pela casa de US$ 115 o barril. Ainda caro, tendo subido mais rápido que o previsível pelo ritmo observado no trimestre final do ano passado e no início deste ano, antes do tumulto no mundo árabe. Mas o petróleo chegou a bater em US$ 120.
Agora, o "tumulto árabe já está no preço", como se diz no mercado. Ou seja, é preciso confusão nova e perigosa para que o pessoal literalmente aposte em preço mais alto.
Que estejam passando fogo na Líbia e tentando matar Gaddafi "por acidente" não faz diferença. Que a Arábia Saudita passe fogo nos manifestantes do Bahrein, também não. Aliás, a chacina patrocinada pelas monarquias árabes pode ser um fator de estabilidade.
Na Arábia Saudita, um trocado na mão e uma metralhadora apontada para a cabeça podem pacificar de vez os ânimos. Pode evitar revoltas democráticas: os súditos do feudo dos Saud receberam uma doação (grana) da monarquia e foram subliminarmente avisados de que levarão bala se se meterem a bestas. O Bolsa Petróleo e balaços contêm a tensão no mercado de energia.
Quão caro deveria ficar o petróleo para zerar o crescimento no mundo rico? US$ 150 o barril, por um ano, dizia-se nos dias mais quentes do tumulto árabe (na mediana dos chutes). Agora se fala em US$ 200.
As crises do fim do mundo, a crise arábica e a japonesa, pareciam ontem um pesadelo ruim nas praças dos mercados. O crescimento do mundo rico aumenta aos poucos. A União Europeia enfim acertou a criação de uma megafundo para amortecer calotes e temores de calotes dos governos superendividados de Grécia, Irlanda e Portugal.
A fusão das teles AT&T e T-Mobile, nos Estados Unidos, negócio de US$ 39 bilhões, animou o povo dos mercados. Se estão colocando essa dinheirama monstro num negócio, é que tem gente bem otimista, contagia-se o pessoal do mercado.
Arrependei-vos, irmãos. O fim não estava próximo.

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