quinta-feira, março 03, 2011

MARCELO L. MOURA

Governo deve assumir ações coesas de combate à inflação

MARCELO L. MOURA
FOLHA DE SÃO PAULO - 03/03/11

Se acreditarmos no que diz a teoria econômica, a decisão do comitê de política monetária do Banco Central de aumentar a taxa de juros de curto prazo deveria elevar o custo de empréstimo das empresas e restringir o crédito para consumidores.
Esse aumento provocaria queda no investimento e em compras de bens duráveis, como casas, automóveis e eletrônicos, entre outros. Vale aqui a lógica pura e simples de que, se a demanda cai, o lado da oferta responde, reduzindo a produção e o ritmo de elevação dos preços.
A pergunta que nos cabe fazer é: por que o combate da inflação no Brasil requer doses tão elevadas de juros?
A pergunta é ainda mais relevante se olharmos para outros países emergentes, que crescem a um ritmo maior e que possuem inflação mais baixa.
A resposta passa por entender as condições nas quais a política monetária funciona bem.
Existem pelo menos duas: que a economia não sofra outros choques e que a taxa básica de juros reflita diretamente o custo de tomar dinheiro emprestado.
A economia não sofrer outros choques significa que não devem ocorrer outras políticas do governo que estimulem a demanda, anulando, assim, parte do efeito da política monetária.
Embora o governo tenha ações nessa área, sendo a mais relevante a do anúncio de um corte de R$ 50 bilhões do Orçamento, a verdade é que, na prática, o gasto do governo aumenta acima da inflação ano após ano.
Mesmo se acreditarmos no cumprimento da promessa de corte, o Orçamento que fica é ainda cerca de 7% acima do valor do ano passado, o qual já representava um nível elevado de gastos. Contando uma história longa em poucas palavras: a política fiscal joga contra a política monetária.
A segunda condição é que exista uma relação direta e forte entre taxa básica de juros e custo do empréstimo.
Essa hipótese é também questionável no Brasil. Aí entra o papel do governo via BNDES, concedendo crédito com juros subsidiados.
Também entra o fato de que, para as pessoas físicas, os juros são tão elevados que apenas pequena parcela da população toma empréstimos no sistema financeiro, seja na forma de financiamentos imobiliários, crédito direto ao consumidor, uso do rotativo no cartão de crédito ou cheque especial.
Com empresas que pouco são afetadas no seu custo de empréstimo e poucos consumidores se financiando, o efeito também será limitado.
Dito isso, cabe agora ao governo assumir uma posição mais clara de coesão de políticas que visem controlar a inflação de forma mais eficiente. É como pedir que os 11 jogadores tentem fazer gol no mesmo lado do campo. Será que é tão difícil perceber? Para o mercado, pelo menos, não é o que parece.

MARCELO L. MOURA é professor associado do Insper e doutor em economia pela Universidade de Chicago.

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