segunda-feira, fevereiro 07, 2011

MARIA INÊS DOLCI

Empresas nocauteadas na rede
MARIA INÊS DOLCI
Folha de S. Paulo - 07/02/2011

RECENTEMENTE, COMENTEI nesta Folha o livro "O Cliente É Quem Manda", de Pete Blackshaw. Ele também foi o autor da expressão "mídia criada pelo consumidor" (CGM, em inglês). No livro, Blackshaw traça um roteiro para que as empresas entendam o novo cenário CGM e saibam interagir com o consumidor midiático.
Não sei se o senhor Oswaldo Borrelli conhece a CGM, mas agiu totalmente de acordo com suas máximas ao divulgar um vídeo nas redes sociais, demonstrando que "a Brastemp não é uma Brastemp". Ironizou o antigo comercial daquela companhia, que diminuía a concorrência por não ser uma Brastemp.
Borrelli ficou 90 dias sem geladeira, devido ao péssimo atendimento da assistência técnica daquela empresa, e ao "enrolation" do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC). A novela já teve final feliz para o consumidor, após tanto sofrimento e gastos, mas centenas de milhares viram o vídeo advertindo os internautas a evitar aquela marca.
O link é www.youtube.com/watch?v=riOvEe0wqUQ.
Há mais tempo, o músico David Carroll colocou um vídeo no YouTube contando como a United Airlines o desrespeitou após quebrar seu violão Taylor. O clipe (ele fez uma música relatando o caso) foi assistido por muita gente -1,2 milhão em uma de suas postagens.
Afetou até as ações da companhia. Bastaria que a United tivesse reconhecido a falha ao manusear a bagagem e indenizasse o músico para evitar a retaliação.
A Brastemp poderia ter amenizado a insatisfação do consumidor se tivesse entregado imediatamente a nova geladeira que ele comprou, na troca com troco. Ele entregou a geladeira com defeito e adquiriu a nova por preço de custo. Só a recebeu após a repercussão de sua reclamação divulgada aos internautas.
Obviamente, o atendimento lastimável não é triste privilégio da Brastemp e da United Airlines, nos casos já referidos.
Por atuar na defesa do consumidor, recebo centenas de contatos de pessoas que compraram móveis, telefones celulares, eletroeletrônicos e não os receberam no prazo combinado. As empresas também não respeitam os consumidores que se cadastraram para não receber ligações de telemarketing.
Há exceções, que demonstram como poderiam ser resolvidas estas situações de consumo.
Um amigo enfrentou problemas com duas companhias devido a compras pela internet: com o Ponto Frio e com o Magazine Luiza. No primeiro caso, a loja afirmava que havia entregado o celular que ele comprou. O caso só se resolveu porque a pessoa que recebeu a encomenda errada na região em que ele mora, em meio a presentes de casamento, ligou para meu amigo e o avisou do equívoco (o número de celular estava na nota fiscal).
Este consumidor, ao enfrentar problemas com o Magazine Luiza, na compra de um aparelho para fondue, e não conseguir solução via SAC, lembrou-se de uma palestra de Luiza Helena, presidente da empresa. Ela contara que costumava receber e-mails de clientes quando o atendimento não era adequado.
Ele encontrou o e-mail dela no site, entrou em contato e recebeu o produto. Aliás, ficou surpreso, porque recebeu uma ligação dela uns 30 minutos após o envio do primeiro e-mail. Primeiramente, depois de confirmar que falava com o cliente que enviara o e-mail, ela pediu perdão pelo problema.
São visões de negócios, formas diversas de agir.
O que percebemos nos SACs é a dificuldade dos atendentes de sair do roteiro, do script do atendimento. Há de tudo, inclusive chefetes grosseiros, que desrespeitam os clientes.
Talvez os presidentes, todos, fossem mais atenciosos, como dona Luiza. Mas eles não teriam como atender milhares de pessoas por mês. Então, invistam mais na qualidade dos profissionais que nos atendem. Paguem melhor e os treinem frequentemente.
O consumidor agradecerá, em lugar de ser obrigado a reagir pelas redes sociais, causando graves danos à confiabilidade das marcas. Se não atendem bem por cortesia e respeito, que o façam para não perder credibilidade e negócios.

MARIA INÊS DOLCI, 54, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores.

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