domingo, fevereiro 13, 2011

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO

Copa: preparativos abagunçados
EDITORIAL

O Estado de S.Paulo - 13/02/11

Orçamentos estourados, obras atrasadas, falhas graves nos projetos, risco de prática de sobrepreço e falta de clareza nos documentos e atos oficiais são algumas das irregularidades detectadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) nas ações para a Copa do Mundo de 2014. No primeiro relatório consolidado sobre os preparativos para a Copa, assinado pelo ministro Valmir Campelo, o TCU adverte que os problemas já identificados criam condições para que se repita o que ocorreu com as obras dos Jogos Pan-Americanos de 2007 no Rio de Janeiro, cujo custo foi 300% maior do que o previsto.

No início de 2010, o governo federal assinou com os governos estaduais e as prefeituras das cidades que sediarão os jogos da Copa as "matrizes de responsabilidade", que fixam as competências de cada nível de governo, definem o cronograma das ações e apontam os valores a serem investidos em cada projeto. O relatório do TCU adverte que essas matrizes "não estão sendo rigorosamente observadas pelos diversos entes federativos envolvidos no evento, dado que existe divergência nos valores previstos e descumprimento de diversos prazos determinados". Esse fato, de acordo com o relator, indica "possível fragilidade no processo de acompanhamento por parte do Ministério do Esporte, característica que dificulta muito as ações de controle".

Um dos integrantes do governo Lula mantidos no cargo pela presidente Dilma Rousseff, o ministro do Esporte, Orlando Silva, ocupa o Ministério desde 2006, tendo sido responsável, na esfera federal, pelas obras do Pan-2007. No caso dos preparativos para a Copa, ele ainda não enviou ao TCU as "matrizes de responsabilidades" para as obras nos portos e aeroportos, elaboradas em julho do ano passado, "dificultando a transparência das ações", observou Campelo.

Grandes diferenças entre o valor registrado na "matriz de responsabilidade" e o valor do contrato foram constatadas pelo TCU. As obras do novo estádio da Fonte Nova, em Salvador, por exemplo, estavam orçadas em R$ 591 milhões, mas foram contratadas por R$ 1,6 bilhão. O projeto de construção do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) em Brasília tinha orçamento de R$ 364 milhões na "matriz de responsabilidade", mas a obra foi contratada por R$ 1,55 bilhão.

Na reforma do Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, o TCU constatou diferença de preços (orçada em R$ 600 milhões, a reforma foi contratada por R$ 705 milhões), mas esse não é o principal problema do contrato. Faltam detalhes das obras. Nas reformas dos Estádios Verdão, em Cuiabá, e Mineirão, em Belo Horizonte, foram apresentadas, respectivamente, 702 e 1.309 plantas. Na do Maracanã, apenas 37.

"Como não há projetos de engenharia suficientes para caracterizar os serviços contratados, a planilha (de custos) beira a mera peça de ficção", afirma o relatório. A fragilidade da planilha pode dar margem a diversas revisões contratuais, de modo que o custo final poderá ser muito maior do que o valor contratado. "Não há qualquer segurança de que a planilha contratual, derivada do orçamento-base, contemplará o custo real e efetivo da obra", adverte o relatório.

Por causa disso, o TCU recomendou ao BNDES que libere apenas 20% do financiamento de R$ 400 milhões para a reforma do Maracanã (o governo fluminense entrará com os R$ 305 milhões restantes).

Também contratos na área de transportes apresentam falhas, atrasos e estouro nos orçamentos. Das obras anunciadas, algumas nem têm projeto básico, como a do monotrilho de São Paulo. No caso do monotrilho de Manaus, a Controladoria-Geral da União emitiu nota demonstrando a inviabilidade do projeto, por causa de seu alto custo e do risco de não ser concluído até a Copa. Além do custo excessivo, o contrato do VLT de Brasília apresentou irregularidades que exigiram a suspensão e a paralisação da obra, da qual só foram executados 2%.

Medidas preventivas foram sugeridas pelo TCU aos responsáveis pelas obras, para evitar que elas sejam paralisadas no futuro por irregularidades. Resta saber se elas serão suficientes para proteger com rigor o dinheiro público.

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