terça-feira, fevereiro 01, 2011

BENJAMIN STEINBRUCH

Mediocridade e desemprego
BENJAMIN STEINBRUCH
FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/11

Neste início de governo, o Brasil está envolvido por um discurso conservador que pode fazer muito mal


VÃO SAINDO aos poucos as estatísticas econômicas de 2010 sem deixar nenhuma dúvida de que o país viveu um ano excepcional. Depois de algumas décadas, a velocidade do PIB brasileiro voltou a superar 7%, mostrando quanto é confortável o crescimento econômico.
Nada espelha melhor esse conforto do que o emprego. No ano passado, foram criados 2,5 milhões de vagas formais na economia brasileira. Mas o importante não é o número.
Importante é que o país vive um momento de pleno emprego, situação que contrasta com a dos países industrializados -apesar da volta do crescimento, 203 milhões de pessoas continuarão desempregadas no mundo até o fim deste ano, entre elas 78 milhões de jovens.
Não custa lembrar que o objetivo do crescimento econômico é o bem-estar da população. Então nada pode ser mais reconfortante do que observar que o ritmo de expansão da produção brasileira proporciona emprego e renda a quase todos os que se apresentam ao mercado de trabalho.
Não quero encher o leitor de números e sim ressaltar que o país só chegou a esse bom momento em matéria de emprego e renda por razões muito objetivas.
Só foi possível viver esse momento porque o país acreditou na importância de estimular o crédito e o consumo em plena crise global. Mecanismos de concessão de crédito foram criados para sustentar vendas em vários setores, principalmente na indústria automobilística, na eletroeletrônica e na construção civil.
Esse momento só foi possível, também, porque o BNDES desempenhou bem seu papel de estimulador de desenvolvimento econômico em 2009 e 2010. No ano passado, ampliou em 25% seus desembolsos, para um total de R$ 168,4 bilhões.
Só foi possível porque a Petrobras, em setor estratégico, tocou pesados investimentos -fez capitalização de US$ 67 bilhões- e ampliou sua produção e faturamento, a ponto de se pôr em terceiro lugar entre as maiores petroleiras do mundo.
Só foi possível ainda porque o setor privado, olhando a expansão da demanda, acreditou e investiu no aumento da produção.
Foi possível, enfim, porque se criou um marketing favorável ao Brasil, que aliás começou lá fora e se espalhou internamente. A comunidade internacional começou a falar bem do Brasil e os brasileiros passaram a acreditar em seu potencial.
Todo esse introito se destina a observar que o país está, neste início de governo, envolvido por um discurso conservador que pode fazer muito mal aos brasileiros.
Esse discurso dominante tem o poder de adicionar pessimismo e impulsionar decisões radicais que podem corroer o bom momento da economia. Se fosse dar ouvido a esse discurso durante a crise, o país teria recuado para uma posição defensiva e, seguramente, caminhado para um desastre.
Não se trata de negar valor a políticas de austeridade fiscal e monetária -elas são necessárias para controlar a inflação, conter gastos correntes e concentrar recursos em investimentos. Trata-se de evitar radicalismos perniciosos na condução dessas políticas.
Dez em cada dez analistas do mercado financeiro queriam que o Banco Central subisse os juros na primeira reunião do governo Dilma. E o BC fez isso.
Depois, o mercado continuou e continua pedindo mais juros. Mas será que essas elevações são realmente indispensáveis? Será que os juros brasileiros, já altos demais -6% ao ano em termos reais-, não estão na base do torturante problema cambial do país? O risco da predominância do discurso conservador é que ele pode levar a um desaquecimento indesejável da economia, com a volta de todos os problemas que o país enfrentou no passado recente.
A indústria já trabalha em ritmo mais lento em janeiro, o crédito já foi reduzido em todos os setores, do consignado ao de veículos. As taxas de juros no financiamento ao consumidor já deram um salto. O investimento público, inclusive em programas sociais, já sofreu uma freada. E o BNDES está sob pressão para emprestar menos. Essa avalanche radical-conservadora, se continuar, vai acabar por derrubar a confiança dos agentes econômicos. E já sabemos como é o fim desse filme: crescimento medíocre e desemprego.

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