quinta-feira, janeiro 20, 2011

VINICIUS TORRES FREIRE

Crescer, comprar, inflar

VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/01/11


Economia está com todos os aceleradores no limite de consumo e, provavelmente, de expansão no curto prazo

A INFLAÇÃO anda zanzando perto dos 6% no Brasil. Aumentos médios anuais de preços de 6% não parecem, por si só, desorganizar economias. Aliás, nem de longe parece ser o caso. Mas a inflação está alta demais? Quais os fatores que podem fazer o IPCA saltar além dos 6%? O que é "demais"?
A meta de inflação definida para o BC é de 4,5%, com tolerância de dois pontos para cima e para baixo. A inflação presente está, pois, na casa da tolerância, digamos. Mas essa casa está além do mais ameaçada de enchente e de transbordamentos de preços. Por quê?
1) A economia brasileira é ainda muito indexada. Inflações passadas contaminam facilmente as do futuro. Além do mais, ainda somos "mentalmente indexados". Os preços estão subindo 5%, 6% na média (para nem mencionar os índices de atacado rodando a mais de 10%)? Reajustemos os nossos em 10% no ano que vem, para arredondar. Enfim, como dizem os economistas, as expectativas de inflação se deterioram. Trocando em miúdos, quase ninguém está achando que a inflação vai diminuir, e se aproveita a oportunidade de reajustar preços, pois, por assim dizer, há "dinheiro sobrando" para aceitar pedidos ou imposições de aumentos;
2) No que diz respeito a oferta e demanda, não estamos vivendo uma situação de choques ou anormalidades passageiras. A taxa de juros real, embora indecente, está no degrau mais baixo, em termos históricos. Há crédito barato sobrando no BNDES e no mercado internacional. O gasto contratado do governo é alto e dificilmente será achatado no curto prazo. Juros e gastos faz tempo aquecem a dita demanda. O desemprego está baixo, num nível desconhecidamente baixo. A capacidade produtiva está apertada. O deficit externo cresce, sinal de consumo excessivo. Todos os indicadores apontam que estamos numa vulgar situação de demanda demasiada e de crescimento não inflacionário no limite, ao menos no curto prazo;
3) O câmbio já deu sua contribuição ao controle de preços. O real não vai (nem deveria) se valorizar o bastante de modo a contribuir para segurar os preços de produtos "comercializáveis" (sujeitos à influência do comércio internacional);
4) Preços muito importantes, como o das commodities, não param de subir: trata-se de combustíveis, comida, minérios, metais e até fibras de tecidos (algodão). Muitos desses preços voltaram ao nível maníaco de setembro de 2008, antes da crise, sendo a exceção mais gritante, por ora, a do petróleo. Mas os preços continuam subindo -a economia mundial está mais animada, há choques climáticos a turbinar vários preços e, enfim, dinheiro a juro baixíssimo para especular com índices de commodities.
Isto posto, diga-se, porém, que não há sinal de problema grave à vista, de "descontrole inflacionário" e outras loucuras que se ouve vez e outra. Mas a administração da economia vai ser mais enjoada na primeira metade do governo Dilma, como já se dizia desde o final do ano passado (embora o risco de nova tragédia mundial tenha diminuído muito). Vai ser interessante ver como o governo Dilma Rousseff vai se virar para entregar um crescimento de 6% ao ano, como o prometido na primeira reunião ministerial. Até agora, não apareceram planos coerentes para mostrar como isso vai ser possível.

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