segunda-feira, janeiro 10, 2011

RUY CASTRO

Do bota-abaixo ao bota-acima
RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 10/01/11

RIO DE JANEIRO - Com centenas de projetos e investimentos na agulha, em função dos próximos eventos que terão a cidade como sede -Jogos Mundiais Militares em 2011, Copa das Confederações em 2013, Copa do Mundo em 2014, Jogos Olímpicos em 2016, sem falar na integração ou reintegração de bairros inteiros, no morro e no asfalto-, o Rio poderá viver um novo bota-abaixo, só que ao contrário.
O bota-abaixo foi a reforma promovida entre 1902 e 1906 pelo prefeito Pereira Passos, que, inspirado em medidas semelhantes em Paris e Londres, arrasou a decaída e insalubre cidade imperial e construiu por cima a cidade republicana, com jardins, avenidas e bulevares. O bota-acima, que se antecipa para muito breve, pode mudar a face do Rio, com consequências imediatas principalmente na zona portuária, na Barra e em Jacarepaguá.
Mas todo cuidado é pouco. Com tantos e tão súbitos bilhões a ser injetados na cidade, aconselha-se a criação de um órgão isento, para filtrar os projetos e impedir a proliferação das ideias de jerico e daquelas que atendem mais à vaidade de muitos arquitetos, de querer competir com a paisagem carioca.
No Rio, essa mania é velha e recorrente. Vem desde Le Corbusier, que, em 1930, projetou um monstruoso minhocão que serpentearia por toda a cidade, e prosseguiu com seus pupilos brasileiros, como Lucio Costa, que queria levantar os enormes edifícios da Cidade Universitária sobre pilotis bem no meio da lagoa Rodrigo de Freitas. Por sorte, mas por pouco, esses projetos nunca saíram do papel.
Um novo projeto, às vésperas de ser apresentado, enquadra-se naqueles dois requisitos: parece uma ideia de jerico e atende à vaidade dos arquitetos de querer competir com a paisagem carioca. É um teleférico que sairia da Lagoa e, 710 metros e quatro indescritíveis estações depois, chegaria ao Corcovado. O Rio não merece.

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