domingo, março 28, 2010

PAINEL DA FOLHA

Vento sul

Renata Lo Prete
Folha de S. Paulo - 28/03/2010
 
A campanha de José Serra tentará aproveitar o bom resultado no Sul (crescimento de dez pontos no Datafolha) para equacionar seus palanques na região.
No Rio Grande do Sul, o fôlego tomado permite sonhar com dois cenários: a) que José Fogaça (PMDB), líder nas pesquisas, pense duas vezes antes de apoiar Dilma Rousseff (PT); b) que Fogaça, diante da recuperação ensaiada por Yeda Crusius (PSDB), desista de trocar a segurança da Prefeitura de Porto Alegre pela incerteza da disputa, levando o PMDB para a órbita de Serra já no primeiro turno. Em Santa Catarina, os números reaproximam o PSDB e do PMDB, que flertava com Dilma. No Paraná, o PT fica mais dependente de uma eventual aliança com Osmar Dias (PDT).

Fortaleza 1. Embora responda por apenas 15,6% do eleitorado nacional, a região Sul importa para a campanha de Serra por ser, na era Lula, reduto do voto oposicionista.
Fortaleza 2. Entre os poucos Estados nos quais Geraldo Alckmin saiu vitorioso no segundo turno da eleição presidencial de 2006, foi no Rio Grande do Sul que o tucano obteve sua maior vantagem sobre Lula: 53% a 42%.
Sinto muito. Diagnóstico de quem conhece bem tanto Eduardo Campos quanto Ciro Gomes: o presidente do PSB está fazendo pacientemente todo o roteiro de conversas com possíveis aliados para no final poder dizer ao pré-candidato algo como: "Tentamos de tudo, mas não deu".
Rajada de balas. E Ciro vai sair da disputa presidencial em silêncio ou atirando? "Para todo lado", responde o mesmo especialista.
Liga... Depois de pôr pilha em José Alencar (PRB) para assustar adversários e aliados em Minas Gerais, o PT se deu conta de que pode acabar lhe faltando lugar na chapa e agora apela a Lula para convencer o vice-presidente a desistir de toda e qualquer candidatura.
...e desliga. A conversa mais recente para atingir tal objetivo é a de que seria "muito importante" Alencar ficar no governo, de modo a permitir que o presidente se dedique mais -eventualmente até por meio de pequenas licenças- à campanha de Dilma.
Na oposição. Comentário bem-humorado de José Alencar, quando a equipe médica polidamente se recusou a expedir um atestado segundo o qual o vice estaria em "processo de cura" do câncer: "Vocês são uns tucanos!".
Popular... Noviço em palanques, o vice-governador de Minas, Antonio Anastasia (PSDB), começa a se soltar. Dias atrás, empolgado ao final de um discurso, pediu licença para cantar Gonzaguinha: "É a vida, é bonita e é bonita!".
...e erudito. Mas Anastasia ainda faz jus ao título de "professor" pelo qual todos o chamam. Na quinta passada, ao falar na última grande reunião de governo comandada por Aécio Neves (PSDB), o pré-candidato referiu-se aos mineiros do Vale do Jequitinhonha como "nossos concidadãos que moram em regiões menos afeitas a um bom regime pluviométrico".
Endereço. Se mantiver a rotina de passar quase todos os finais de semana em São Paulo, o ministro Cezar Peluso inovará na presidência do Supremo. Na história recente, praticamente todos os ocupantes do cargo fixaram residência em Brasília.
Trindade. Poupada da gerência do PAC, que ficará a cargo de outros ministros, Erenice Guerra elegeu três projetos prioritários para seus nove meses de Casa Civil: a hidrelétrica de Belo Monte, a ferrovia Transnordestina e o trem-bala São Paulo-Rio.
Trancado. A Rede Globo pode dormir tranquila. Não há chance de sair do limbo, na Assembleia paulista, o projeto que proíbe o término dos jogos de futebol depois das 23h.

com SILVIO NAVARRO e LETÍCIA SANDER
Tiroteio
"Chamem o Paulo Okamoto. Com certeza sobrará para ele pagar as multas aplicadas a Lula pela Justiça Eleitoral."


Do senador ACM JÚNIOR (DEM-BA), sobre o pouco caso manifestado por Lula diante da punição de pagar R$ 5.000 por fazer campanha antecipada; no passado, o presidente do Sebrae declarou ter assumido uma dívida de R$ 30 mil do amigo.
Contraponto
Vara especial Na quarta-feira passada, um grupo de parlamentares oposicionistas entregou ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, um pedido formal de investigação sobre as conexões entre os escândalos do mensalão e o caso Bancoop, que envolve o tesoureiro do PT, João Vaccari.
Para quebrar o gelo, o líder do PSDB na Câmara, João Almeida, começou por dizer que os tucanos não tinham a intenção de sobrecarregar o procurador-geral:
-Não queremos abusar...
Gurgel tratou de deixar os visitantes à vontade:
-Fiquem tranquilos. Eu soube que, quando vocês estavam no governo, chegou a se discutir aqui a abertura de um protocolo para uso exclusivo do PT!

DORA KRAMER

Um País de todos

O Estado de S. Paulo - 28/03/2010
 
Até agora o presidente Luiz Inácio da Silva jogou sozinho em campo. À vontade, sem oposição, sem entraves judiciais, com popularidade em alta, apoio político para dar e vender, bajulado em toda parte, falando o que lhe vem à cabeça, uma beleza.


Tão favorável é o ambiente que nem o principal opositor se anima a lhe fazer oposição. Prefere contemporizar e dizer que o presidente está terminando o governo "muito bem".

Claro, José Serra não menospreza as pesquisas: um terço das pessoas que avaliam bem o governo federal votam na oposição para presidente. Então, para que brigar se não é Lula o candidato?

Aparentemente o presidente está com a vida ganha. Sua candidata saiu do ostracismo para a situação de quase empate com o há dois anos favorito Serra e dizem por aí que agora a franca favorita é ela, Dilma Rousseff.

Portanto, melhor não poderia estar. Mas o presidente parece que precisa que esteja tudo como ele quer, sem revezes, sem um mínimo de contestação ou contrariedade.

Bastou a Justiça Eleitoral dar um pequeno sinal de vida nas preliminares da partida para Lula perder a esportiva do dia anterior, quando fazia piadas com multas judiciais. Não parece lógico acreditar que um político com a experiência dele imagine que possa jogar sozinho o tempo inteiro sem adversário.

Sua reação na sexta-feira à multa de R$ 10 mil aplicada pelo Tribunal Superior Eleitoral foi de quem supõe que a oposição vá disputar uma eleição presidencial parada.

"O fato concreto é que todo esse barulho é feito pela oposição por razões políticas", indignou-se em tom de transcendental revelação.

Óbvio que as razões são políticas. Assim como são políticas as razões que o levam a transgredir sistematicamente não só a Lei Eleitoral como a Constitucional no que tange ao princípio da impessoalidade na condução da máquina pública.

Ou do que se trata quando Lula diz que sua prioridade agora é eleger a sucessora?

Quanto ao "barulho" trata-se do legítimo recurso à Justiça facultado também ao governo e aos partidos governistas sempre que achar que seus adversários extrapolaram os limites legais nas atividades de campanha.

Ou o presidente vê alguma deformação em ações judiciais?

Ademais, a única novidade são as decisões em si, porque as ações vêm sendo apresentadas pela oposição há muito tempo sem que o presidente reclamasse enquanto não eram julgadas procedentes. A queixa real, portanto, não é contra os oponentes políticos, mas contra o Judiciário.

Só que isso Lula não faz. Porque pode provocar mais problemas à frente no tribunal e porque não lhe rende dividendos eleitorais. Não se presta ao plebiscito "nós contra eles" em cujo modelo ele, no controle da máquina de governo, uma estrutura de comunicação monumental, redes sociais com cobertura em todo o País, sindicatos e ONGs é quem representa a vítima fraca e oprimida contra a força dos poderosos.

Ainda outro dia o presidente pregou civilidade na campanha. Referia-se à conduta entre candidatos. Mas o conceito vale também, ou principalmente, em relação ao respeito às regras, à obediência à lei propriamente dita.

O ideal seria que a campanha tivesse uma levada de classe. Se não for possível, compreender que se trata de uma disputa em que todos têm direito e às vezes encarar as coisas um pouco na esportiva já ajudaria muito a preservar o País de um tipo de luta a que os brasileiros não estão acostumados.

Cerco. Os sindicatos filiados à CUT negam motivação eleitoral nas greves e manifestações de protesto contra o governo de São Paulo, embora tenham deixado para explicitar de forma assertiva suas questões com o Estado depois que José Serra confirmou a candidatura a presidente.

Enquanto existia uma tênue esperança de que ele pudesse desistir para disputar a reeleição em São Paulo nada era tão urgente em termos de reivindicações trabalhistas.

Nesse aspecto, já se comprova o acerto da resistência do governador em não antecipar o anúncio da candidatura. Teria antecipado o cerco e alongado o período de protestos, sem necessariamente recolher benefícios em forma de pontos nas pesquisas.

FERREIRA GULLAR

A cara do cara
FOLHA DE S. PAULO - 28/03/10

Teríamos que ver Lula não como o estadista, que pretende ser, e, sim, como um espertalhão?

Devo admitir que, de algum tempo para cá, a personalidade de Lula tornou-se, para mim, motivo de surpresa e indagação. Trata-se, sem dúvida, de um personagem inusitado na história política do país. Contribui, para isso, obviamente, sua origem social, a condição de líder operário que, embora pouco afeito aos estudos e à leitura, chegou à mais alta posição que alguém pode alcançar no Estado brasileiro.

A trajetória que ele percorreu é, no entanto, compreensível, se se levam em conta os fatores que determinaram o processo político brasileiro durante os anos do regime militar. A repressão que a ditadura exerceu sobre os trabalhadores organizados, alijando dos sindicatos às lideranças surgidas do getulismo e do janguismo, propiciou o surgimento de uma liderança sindical, desvinculada tanto do peleguismo quanto dos comunistas que, por isso mesmo, prometia uma nova era na luta dos trabalhadores.

A figura principal desse movimento era Luiz Inácio Lula da Silva que, envolto nessa aura, fez renascer a esperança de velhos militantes incompatibilizados com o comunismo soviético, como também o entusiasmo de uma nova geração que se inspirava na Revolução Cubana. Não por acaso, Lula passou a usar a mesma barba que caracterizava as figura de Fidel e Guevara.

Enquanto durou a ditadura militar, ele e seu partido, o PT, mantiveram-se na luta pela restauração da democracia, ao lado do partido de oposição e de outras forças de esquerda. Finda a ditadura, Lula e seu grupo começaram a mostrar sua verdadeira face: tornaram-se adversários de todos os governos que se formaram, a partir de então. A própria Constituição de 1988 não contou com seu apoio, pois se negou a assiná-la.

De 1990 a 98, Lula fracassou em três tentativas de eleger-se presidente da República. Em 2002, deu um ultimato ao PT: para perder de novo, não se candidataria e, com isso, o partido abriu mão da postura radical, permitindo a Lula, inclusive, adotar como vice um empresário e comprometer-se com a política econômica de FHC, que haviam combatido ferozmente. Eleito, Lula repeliu a aliança com o PMDB e aliou-se a partidos menores, que seriam comprados com o mensalão. Quando o escândalo estourou, disse que não sabia de nada e obrigou seus auxiliares mais próximos a assumirem a culpa.

Depois, os absolveu e, recentemente, afirmou que o mensalão foi fruto de uma conspiração contra seu governo. Não houve.

A coragem de fazer tal afirmação, quando a denúncia daquelas falcatruas foi feita pelo procurador-geral da República e aceita pelo Supremo Tribunal Federal, é quase inconcebível em alguém que ocupa a Presidência da República. Mas esse é o Lula que, após assumir o governo, afirmou nunca ter sido de esquerda e, enquanto abre o cofre do BNDES à grandes empresas, alia-se ao antiamericanismo de Chávez e Ahmadinejad e abraça-se a Bush, a Fidel e Sarkozy. Dá seu apoio às eleições corruptas do Irã e se nega a reconhecer o presidente legitimamente eleito de Honduras.

Mas nada chocou tanto a opinião pública, dentro e fora do Brasil, quanto sua afirmação de que é inaceitável que alguém se deixe morrer numa greve de fome. E, como se não bastasse, comparou os prisioneiros políticos, condenados por delito de opinião, aos criminosos comuns, presos por roubar ou matar. O ministro Amorim tentou defendê-lo, dizendo que Lula, por já ter feito greve de fome, estava agora fazendo uma autocrítica.

Na verdade, Lula fingiu fazer greve de fome, em 1980, pois, como se sabe, comia escondido. Não se trata, pois, de autocrítica, mas da tentativa de desqualificar quem demonstrou a grandeza moral que ele não teve. Teríamos que vê-lo, não como o estadista, que pretende ser, e, sim, com um espertalhão, capaz de qualquer coisa que sirva a seus objetivos?

Seria, talvez, simples demais afirmar que sim. No entanto, como entender sua atitude, na visita recente ao Oriente Médio, quando se ofereceu, publicamente, para mediar o conflito entre judeus e palestinos, tarefa já entregue a um "quarteto" de alto nível composto pelos EUA, a comunidade europeia, a Rússia e a ONU? Como era de esperar, o oferecimento foi rejeitado pelos dois lados.Lula certamente não contava com isso, mas, esperto como é, tampouco se julgaria capaz de resolver tão complexo problema. O que lhe interessava era posar de estadista preocupado com as grandes questões mundiais. É o mesmo cara que inaugura obras não concluídas e acha que só um retardado mental faz greve de fome para valer.

Teme a era pós-Lula.

AUGUSTO NUNES

A lição de um país civilizado ao grotão dos culpados incomuns


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Confrontado com um caso de polícia, o presidente Lula criou uma nova categoria de inimputáveis ─ a dos homens incomuns ─ para desviar do camburão o chefe do bando. “O Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum”, deliberou em junho o camelô dos palanques, de passagem pelo Cazaquistão, ao saber das bandalheiras nas catacumbas no Senado.
Confrontado com a ação movida contra o Estadão pelo empresário Fernando Sarney, o desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, decidiu que, se o pai é incomum, como tal o primogênito também deve ser tratado. Em homenagem à família chefiada pelo patriarca José, de quem ganhou o emprego, o juiz amordaçou o Estadão com a censura prévia.
Confrontado com a reportagem da Folha que denunciou a existência da conta com 13 milhões de dólares no Suíça, o tesoureiro da capitania hereditária do Maranhão fez outra retirada audaciosa nos fundos da arrogância. “Não me manifesto sobre o que não acontece”, tentou encerrar a conversa com o repórter, com a empáfia de quem se julga condenado à impunidade.
Confrontada com delinquências financeiras de Fernando Sarney, a presidente da Suíça, Doris Leutrard, escancarou com uma frase o abismo que separa uma nação civilizada das paragens afundadas no primitivismo. “Aqui tratamos todos de forma igual”, resumiu. “Aqui pouco importa se a pessoa é rica ou pobre, famosa ou não”.
As regras que tratam do sigilo bancário ─ algumas absurdas desde sempre, outras devastadas pela esclerose ─ imploram por mudanças urgentes. Mas ninguém na Suiça é incomum. Os governantes de lá não têm bandidos de estimação. O presidente não ousa atropelar ostensivamente a lei. Não há meliantes especiais. Nem existem sobrenomes intocáveis.
Dias antes da decretação do bloqueio judicial, como apurou o jornalista Lauro Jardim, o sempre ágil Fernando emagreceu a conta suspeitíssima em 10 milhões de dólares, transferidos para outro esconderijo em Lichtenstein. Foram retidos 3 milhões. Não é muita coisa perto das cifras com que lida a turma liderada por Madre SuperioraMagro VelhoBomba e outros codinomes bisonhos. Mas é mais que suficiente para amparar a pergunta que resume outra ópera do malandro: se o dinheiro não é fruto da ladroagem, por que está escondido da Receita Federal e homiziado na Europa?
Estadão está sob censura há 239 dias. Ninguém no clã dos Sarney sabe o que é sequer uma hora de cadeia. A credibilidade do Poder Judiciário, em seu conjunto, pode entrar em colapso se a população carcerária não incorporar outras estrelas do universo dos corruptos além de José Roberto Arruda, engaiolado provisoriamente. A diferença entre o ex-governador do Distrito Federal e os colegas de ofício é que a Turma do Panetone foi copiosamente filmada em ação.
No século passado, convencida de que não conseguiria reunir provas suficientes para prender Al Capone por delitos ainda mais graves, a Justiça americana tratou de enquadrar o chefão mafioso em crimes contra o Fisco. A movimentação do dinheiro no exterior não deu as caras nas declarações de renda de Fernando e sua mulher. Que tal percorrer a estrada pavimentada há quase 80 anos?
Ainda existem juízes no Brasil, e um deles é o ministro César Peluso, novo presidente do Supremo Tribunal Federal. Único integrante da Corte que foi juiz de primeira instância, cumpre a Peluso liderar a luta pela sobrevivência moral do Poder Judiciário. Ele sabe que não pode contar com o Executivo e o Legislativo.
O presidente da República e o presidente do Senado estão a milhões de anos-luz da Suiça. Lula desafia acintosamente o Tribunal Superior Eleitoral. Sarney é o chefe da família retratada de frente e de perfil na entrevista com o jornalista Palmério Dória, aqui nesta página. Os dois políticos que melhoraram bastante de vida são atropeladores compulsivos de normas legais e códigos éticos. Também por isso descobriram recentemente que eram amigos de infância.
Pelo menos tão cedo o presidente do STF tampouco deve contar com a opinião pública. No Brasil do terceiro milênio, só o julgamento do casal Nardoni conseguiu induzir a multidão a clamar pelo castigo dos culpados. É compreeensível que o assassinato de uma criança provoque tanta comoção. Mas o triunfo dos bandidos incomuns sobre a Justiça consumará o assassinato da esperança dos brasileiros decentes.
Nenhum outro crime é tão hediondo.

LUIZ SÉRGIO HENRIQUES

Havana não é só de Fidel
O Estado de S.Paulo - 28/03/10

As "Damas de Branco" - umas poucas dezenas de mães e mulheres de prisioneiros de consciência deliberadamente espalhados por vários cárceres - são o mais recente índice de uma situação que evoca a queda do Muro de Berlim e o colapso de um certo "socialismo de caserna". Uma situação que, previsivelmente, ou evolui no sentido de algum tipo de transição para a democracia, assegurando aquilo que for razoável do impulso igualitário inicial da revolução, ou está condenada a apodrecer, arrastando a sociedade e o Estado cubano para o beco sem saída de um enrijecimento das atuais instituições totalitárias - o que seria, diga-se de passagem, só a antessala de uma restauração selvagem da economia de mercado.

"As ruas são de Fidel", é o que lhes gritavam, numa das recentes aparições das "Damas de Branco", manifestantes e agentes de segurança, de resto, em número muito superior ao daquelas mulheres. Fácil demais para esses agentes interromper o protesto pacífico em dias sucessivos, usando violência física e simbólica que, a esta altura, deveríamos considerar intolerável do próprio ponto de vista do socialismo.

Talvez tenha até passado o tempo de replicar de modo inequívoco, ainda que sem nenhuma vontade de provocação ou de "épater le proletaire": as ruas de Havana pertencem a todo o povo cubano, sem exceção, inclusive à diáspora. Ruas e praças pertencem tanto aos apoiadores quanto aos oposicionistas do regime, e todos fariam muito bem em se preparar o quanto antes para a convivência segundo os princípios da dialética democrática, que, mesmo sendo dura e conflituosa, em princípio não exclui ninguém.

O tratamento da questão cubana supõe, da parte das nossas esquerdas, um rigoroso autoexame, que muitos ainda se mostram obstinadamente incapazes de fazer. Não raramente, adotam-se procedimentos que equivalem a contornar o problema ou lhe dar um perfil fantasioso. De nada adianta agitar o espantalho do imperialismo, álibi já envelhecido. Pode-se muito bem ser contra o histórico de intervenções dos Estados Unidos na América Central e, particularmente, o anacrônico bloqueio a Cuba, e, mesmo assim, denunciar um igualmente envelhecido padrão socialista de matriz stalinista. Um padrão que, em última análise, é o responsável pela contínua negação dos direitos civis e políticos, tal como, aliás, ocorria no "socialismo real".

Guantánamo e seu papel na "guerra" americana contra o terror são indefensáveis. Mereceram, e merecem, o repúdio de todos os democratas, nisso respaldados por instituições conhecidas e admiradas pelos brasileiros desde o tempo dos nossos anos de chumbo. É o caso, por exemplo, da Anistia Internacional ou da Human Rights Watch, que, entre outras, são os olhos e ouvidos de uma novíssima "sociedade civil internacional", atenta ao desrespeito dos mais básicos direitos, onde quer que esse desrespeito se manifeste - inclusive nas celas improvisadas de Guantánamo, para mencionar uma situação frequentemente agitada por quem procura pretexto para desculpar a longeva ditadura de Fidel e Raúl Castro.

O certo é que parte considerável da esquerda brasileira resiste a uma abordagem mais contemporânea da questão cubana. Cabe perguntar por que isso acontece, para além dos laços afetivos que prendem essa mesma esquerda às vicissitudes do socialismo - dessa forma primitiva de socialismo - na ilha.

Uma primeira constatação diz respeito à insistência em manter o paradigma da "revolução" - um evento mítico, explosivo, que traria a regeneração social de alto a baixo e, por definição, requer formas extremadas de poder -, desprezando ou mesmo recusando o paradigma da "democracia", o único no qual uma esquerda moderna se pode mover, por assegurar estavelmente a presença dos "de baixo" nos processos de democratização.

Mas não só disso se trata. Existem laços afetivos, existe a recusa a aderir ao paradigma da democracia, mas também podemos ir adiante. Considerando a acidentada história do socialismo no século 20, a partir de um certo momento, em meados dos anos 1950, abriu-se a possibilidade da superação do stalinismo: das suas categorias, do seu lodo de fazer política, do tipo de Estado que havia gerado.

Começou-se a falar de uma "via pacífica" para o socialismo - o que, apesar de recuos e contradições, parecia inaugurar um modo novo de pensar a mudança social. Salvador Allende, no Chile, também desbravava um caminho inédito, tragicamente interrompido em 11 de setembro de 1973. E nesse panorama, que sugeria o desbloqueio de velhos hábitos, Cuba repropunha a luta armada, tratada como "forma superior" de luta, incendiando - romanticamente - parcela da juventude politizada.

Não tinha nada de "universal" aquela revolução. Adotar seus procedimentos e até seus símbolos, como se fez generalizadamente, não constituiu só um erro de oportunidade, uma avaliação tática equivocada: constituiu um erro de princípio. O método era equivocado e previsivelmente desembocaria em outro tipo de autoritarismo. Em vez de ser uma "revolução na revolução", o exemplo cubano e as tentativas da sua exportação contribuíram para impedir o aggiornamento da esquerda, de que tanto nos ressentimos ainda hoje.

Por isso, para muitos, distanciar-se do mito cubano é também distanciar-se do próprio passado, romper com dogmas quase religiosos, abandonar a pequena navegação de cabotagem e lançar-se - teórica e politicamente - em mar aberto. Criticar a situação a que Cuba se reduziu é dispor-se a um doloroso processo de autorrenovação que nos afaste da vocação ditatorial de certos socialismos, mesmo os que, hoje, se querem "do século 21". Uma tarefa que não é fácil. Sem realizá-la, porém, testemunharemos a emergência de um falso "novo", contaminado patologicamente por aquilo que não tem mais razão de existir.

ELIANE CANTANHÊDE

Cara a cara

Folha de S. Paulo - 28/03/2010
 
O Datafolha de ontem é um susto para o governo e um alívio para a oposição, mas apenas confirma o principal dado da campanha: o governo tem as melhores condições, e a oposição, o candidato mais sólido. Dilma Rousseff, apesar de tudo, oscila um ponto para baixo e está com 27%. Serra, apesar de todos, recupera quatro pontos e volta aos 36%.
A campanha fecha março e chega a abril tensa, nervosa, quente. Na quarta, 31, Dilma sai da Casa Civil e Serra deixa o Bandeirantes, preparando-se para o lançamento público em 10 de abril, em Brasília. Os dois vão se enfrentar cara a cara pelo Brasil afora, com Ciro Gomes encrencado no seu próprio PSB e Marina Silva e o PV tentando ganhar fôlego e musculatura.
O melhor exemplo da premissa de que o governo ganha nas condições e a oposição ganha no candidato é o confronto entre a popularidade de Lula e a oscilação negativa de um ponto percentual de Dilma. Ele sobe para 76% e é o recordista entre os presidentes desde 1990. Mas Dilma, em vez de acompanhar o movimento, estaciona.
Planalto e PT têm Lula e estão mais organizados, com mais estrutura, um leque muito maior de alianças partidárias, mais tempo na TV. Mas José Serra, mesmo quando balança, não cai. Mantém-se teimosamente acima dos 30%.
Mesmo agora, a previsão era a de que as linhas se cruzassem -com Serra caindo e Dilma chegando à liderança-, o que não se confirma.
Ao contrário, Serra abre 28 pontos de vantagem no Sul, que, ao lado de São Paulo, neutraliza Norte e Nordeste. Os holofotes, portanto, concentram-se em Minas, onde a partida tende a ser decidida.
Neste momento, o que o Datafolha diz aos adversários é simples: a oposição tem de criar a estrutura e fortalecer as condições do seu candidato, enquanto ao governo convém o contrário: melhorar a imagem, a desenvoltura e a empatia da sua candidata com o eleitor.

ROGER AGNELLI

Inflação para quem, cara pálida?

Folha de S. Paulo - 28/03/2010
 
Fala-se muito do efeito que o aumento do minério de ferro terá sobre a inflação, mas não se fala nos ganhos para o país

NOS ÚLTIMOS dias, tenho acompanhado as notícias sobre o possível impacto do aumento do preço do minério de ferro sobre a inflação. Procurei na imprensa da Austrália, da África do Sul e do Canadá (grandes exportadores de minério de ferro, carvão, níquel, enxofre, entre outros) menções sobre o impacto do preço desse tipo de produto na inflação, e nada encontrei. No Brasil não se comentou o aumento de mais de 100% do preço do carvão, cuja quase totalidade consumida é importada. Não li também qualquer notícia dos efeitos da quadruplicação do preço do enxofre (de US$ 60 para US$ 240 por tonelada) sobre a inflação.
Porém, quando a maior empresa exportadora de minério do Brasil propõe um sistema de preços que reflita as condições de mercado, rapidamente há o debate sobre os potenciais efeitos na inflação, e nenhuma menção aos ganhos auferidos pelo país no seu comércio exterior. Da mesma forma, o Brasil proporcionalmente importa muito mais carvão e enxofre do que consome de minério de ferro e, estranhamente, não se diz que o preço daqueles produtos vai afetar a balança comercial.
A Europa, como os demais países, defende a política do livre mercado -e concordo. Mas dá subsídios aos agricultores, o que distorce a competição internacional. Em relação ao minério de ferro, quando o preço caiu e tínhamos com os clientes contratos de longo prazo, eles olharam para nós e disseram: "O mercado e as condições mudaram, o preço à vista caiu, o contrato de longo prazo não pode valer". Engolimos o argumento e revimos nossos preços. Agora que o preço à vista subiu muito, querem manter o modelo anterior. Essa assimetria não é razoável.
Os preços relativos dos produtos têm mudado pelo fato de a China estar experimentando um crescimento muito forte. Criou mercado para todos os produtos e, hoje, praticamente determina o preço em todos os setores, inclusive o do minério de ferro, cujo mercado à vista surgiu como consequência do desequilíbrio entre demanda e oferta.
Quando os preços do café, da laranja e das carnes sobem, é bom para o Brasil; com o minério de ferro não é diferente e todos geram divisas para o país importar o que é preciso, além de renda e investimentos. Tanto é que a Vale, nestes últimos anos, com a subida do preço e com o reflexo do mercado externo, é a empresa que mais exporta, a que mais investe no Brasil e a que mais contribui para o superavit comercial.
A exportação de commodities é benéfica ao país, com alto conteúdo tecnológico e efeitos fortemente positivos em toda a cadeia produtiva, seja no caso da agricultura, da mineração ou do petróleo. Alguns defendem que o Brasil exporte mais manufaturados. Concordo. Mas eles não são excludentes, pelo contrário.
É bom citar que o preço do minério é compartilhado com os governos federal, estaduais e com os municípios onde atuamos, o que pode gerar mais desenvolvimento, crescimento e novos empregos, inclusive pelas contratações para implementar os projetos de investimento. A mudança do preço relativo dos produtos nos quais somos competitivos representa a chance de reverter um quadro histórico, trazendo valor e recursos para o Brasil.

RUBENS RICUPERO

Por uma cabeça

Folha de S. Paulo - 28/03/2010
 
As lições do Plano Cruzado no governo Sarney serviram, oito anos depois, para ajudar no êxito do Plano Real

FALTOU MUITO pouco para que o governo Sarney derrotasse a inflação logo no início da Nova República. Ao lado do presidente assisti, do ônibus que nos conduzia à comemoração do primeiro aniversário da morte de Tancredo em São João Del Rey, à alegria da multidão cansada de sofrer que ocupava cada palmo da estrada desde o aeroporto de Barbacena. Não foi daquela vez, mas, como de tudo fica um pouco, as lições do Plano Cruzado serviram, oito anos depois, para ajudar no êxito do Plano Real.
Sarney foi audacioso com a inflação e voltaria a sê-lo ao suspender o pagamento da dívida. É fácil hoje dizer que não se deveria ter chegado a tanto. Os tempos eram, porém, heroicos e havia poucas alternativas. No recém-publicado diário da viagem de Tancredo, pode-se ver que ele mesmo, a encarnação da prudência, admitiu que poderia ser obrigado, contra a vontade, a romper com o sistema financeiro internacional.
Foi em Washington, quando o secretário de Estado Shultz lhe comunicou que o FMI (Fundo Monetário Internacional) ia denunciar o acordo com o governo Figueiredo, impedindo que se concluíssem as negociações com os bancos privados e o Clube de Paris. O presidente tomaria posse com tudo em aberto e a dívida externa desestabilizaria um governo que, em vez de atender um mínimo de expectativas de país estagnado há anos, teria de sacrificar ainda mais as pessoas para pagar aos banqueiros.
Na época, o Departamento do Tesouro do governo Reagan é que ditava a política do FMI para a América Latina, e a orientação era sempre a mesma: extorquir o máximo para satisfazer aos banqueiros. Já tinha começado o domínio dos bancos sobre o governo dos Estados Unidos, que acabou dando nesta crise pavorosa. Um após outro, Argentina, Peru, Brasil, todos tiveram de pagar sua libra extra de carne fresca aos Shylocks da banca de Wall Street.
De Tancredo a Sarney, é nítida a continuidade. Não bastasse a dívida, Sarney teria o choque, no seu primeiro Sete de Setembro no Planalto, de saber que os Estados Unidos se aprestavam a aplicar sanções ao Brasil devido à Lei de Informática. A total ausência de colaboração não evitou que se aprovasse a Constituição mais democrática e avançada de nossa história, nem impediu que se desenvolvesse política exterior inventiva, base do melhor que se fez até agora: o reatamento com Cuba, resgate da última hipoteca da diplomacia ideológica do regime militar, a adesão a todas as convenções internacionais de direitos humanos, a prioridade não apenas retórica mas de realizações com a Argentina e a América Latina.
O eixo Sarney-Alfonsín permitiu concluir acordos de integração graduais e equilibrados (elaborados por Samuel Pinheiro Guimarães), cuja preservação teria evitado as distorções do atual Mercosul. Contudo o principal foi criar uma diplomacia de paz cuja força provinha da defesa firme da democracia e dos direitos humanos que ambos acabávamos de recuperar. Seu legado mais perene foi gerar as condições para liquidar os sinistros e insensatos programas nucleares secretos de militares dos dois países.
Nas condições adversas da Guerra Fria, da crise da dívida, do agravamento da inflação, venceu-se o desafio da morte de Tancredo e criou-se a base institucional e diplomática para o que hoje se colhe. Com um pouco mais de apoio, inclusive externo, talvez a colheita pudesse haver começado mais cedo.

MERVAL PEREIRA

O exemplo de Lula
O GLOBO - 28/03/10

O descaso com que o presidente Lula trata as condenações que recebeu do Tribunal Superior Eleitoral resume bem o estado de complacência moral em que o país se debate, gerando o esgarçamento de seu tecido social com graves repercussões.

Está se impregnando na alma brasileira uma perigosa leniência com atos ilegais, que acaba tendo repercussões desastrosas no dia a dia do cidadão comum, que passa a considerar a “esperteza” como um atributo importante para vencer na vida.

Em vez de usar seu imenso prestígio junto ao eleitorado para dar o exemplo de cidadania, de respeito às leis, o presidente Lula vem, não é de hoje, confrontando publicamente as instituições que considera obstáculos a seus objetivos políticos, não apenas os meios de comunicação, a chamada “mídia”, mas principalmente órgãos encarregados da fiscalização dos atos governamentais.

Já em 2008, em Salvador, chegou a dizer um palavrão em público criticando a lei eleitoral que dificulta suas viagens pelo país.

Àquela altura, ele já desdenhava das possíveis punições, fingindo ensinar ao povo como deve se comportar para não ferir a lei eleitoral.

Quando a torcida organizada começa a gritar o nome da ministra Dilma, ele se faz de desentendido: “(...) a gente não pode transformar num ato de campanha.

É um ato oficial, é um ato institucional. (...) vocês viram que eu, por cuidado, não citei nomes. Vocês é que, de enxeridos, gritaram nomes aí. Eu não citei nomes”.

Igualzinho ao que continua fazendo, mesmo depois de multado.

Nos comícios, não é raro o presidente criticar o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público, por supostos entraves que imporiam à execução de obras, e chegou até mesmo a defender a alteração da Lei das Licitações, uma legislação que foi criada depois dos escândalos do governo Fernando Collor, exatamente para coibir a corrupção.

“Aqui no Brasil se parte do pressuposto de que todo mundo é ladrão”, disse o presidente certa vez, com a mesma atitude complacente com que trata os “mensaleiros” e os “aloprados”.

Lula se incomoda quando os organismos institucionais atuam para fazer o contraponto exigido pela democracia, que é o sistema de governo de pesos e contrapesos para controlar o equilíbrio entre os poderes.

Se existe uma legislação que impede um determinado ato seu, ele tenta superála com a maioria parlamentar que obteve à custa da divisão do governo em verdadeiros feudos partidários.

O exemplo mais recente é o projeto de lei que transforma os recursos do programa Territórios da Cidadania, que leva a regiões do interior projetos de educação, saúde, saneamento básico e ação fundiária, em transferência obrigatória da União para cidades com menos de 50 mil habitantes, mesmo havendo inadimplência financeira com o governo federal, o que fere a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O caráter político da medida pode ser compreendido quando se sabe que 90% das Câmaras de Vereadores estão instaladas em municípios de menos de 50 mil habitantes.

O Tribunal de Contas da União (TCU) é uma vítima recorrente da obsessão de Lula, que o acusa constantemente de atrasar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Para Lula, de fato “quem governa é o TCU, que diz que obra pode ser realizada”.

O incômodo é tão grande que chega a existir no Congresso, incentivado pelo governo, um projeto que reduz os poderes do Tribunal de Contas da União (TCU) na fiscalização, com o objetivo de impedir que o TCU paralise obras públicas, mesmo que a fiscalização encontre indícios de irregularidades graves.

Enquanto não consegue seu objetivo de neutralizar a ação do TCU, Lula vai desmoralizando suas decisões.

Recentemente inaugurou a primeira parte da ampliação e modernização da Refinaria Getúlio Vargas (Repar), obra apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como suspeita, um dos quatro empreendimentos da Petrobras que não poderiam receber dinheiro público em 2010 por possíveis irregularidades.

A impugnação do TCU foi incluída na Lei Orçamentária para 2010, mas recebeu o veto presidencial, que garantiu a continuidade das obras. A maioria governista na Câmara dos Deputados aprovou o veto.

Na ocasião, fez comício e tudo, com sua candidata Dilma Rousseff a tiracolo, como sempre, e usando os trabalhadores como desculpa para ter ultrapassado a decisão do TCU.

“Quem vai assumir as responsabilidades e explicar para as famílias dos 24 mil trabalhadores que tudo bem, a obra foi suspensa e a gente volta mais tarde?”, discursou Dilma, defendendo a decisão do chefe, de quem não discorda “nem que a vaca tussa”, como já disse uma vez.

Foi o TCU, um órgão do Poder Legislativo, por exemplo, que levantou os gastos exorbitantes dos cartões corporativos e exigiu maior transparência nas prestações de contas.

Outro órgão que se defronta com sérias críticas presidenciais é o Ibama.

Ainda em 2007 aconteceu a citação aos bagres, que ficaria famosa com o demonstração da veia ecológica do presidente Lula.

Em reunião com o Conselho Político, o presidente não escondeu a sua irritação com o Ibama por causa da demora na concessão de licença ambiental para construção de usinas hidrelétricas no Rio Madeira.

“Agora não pode por causa do bagre, jogaram o bagre no colo do presidente.

O que eu tenho com isso? Tem que ter uma solução”.

Dois anos depois, Lula estava em Copenhague, na reunião do clima, no papel de defensor da ecologia.

Mas esta é uma outra história de esperteza dessa autoproclamada metamorfose ambulante.

DANUZA LEÃO

Adultério consentido
FOLHA DE SÃO PAULO - 28/03/10


Fala sério: dá para dançar com os corpos grudados e não pintarem pensamentos altamente eróticos?



NOS CHAMADOS anos dourados, o comportamento de homens e mulheres era bem diferente do dos dias de hoje. Por homens e mulheres, leia-se moças e rapazes, pois ninguém tinha mais de 25 anos; 30, no máximo. A partir daí, já pertenciam a outra turma, a dos mais velhos.
A noite começava cedo e acabava tarde. Pensando agora: será que ninguém trabalhava? Tudo era desculpa para "esticar" (a noite), e quando se saía de casa - para um cinema, teatro ou restaurante -, era obrigatória, depois, uma passadinha na boate da moda; assim, para nada. A música era ao vivo, e o pianista da casa, conhecendo de cor as preferências de todos -que, aliás, eram sempre os mesmos-, tocava o que era praticamente um hino pessoal.
Muito Sinatra, muito Nat King Cole, muita Ella Fitzgerald. Com o barulho, pouco se conversava, mas, em compensação, as mulheres iam muito ao banheiro, retocar a maquiagem. Aliás, ao banheiro, não: ao toalete, e sempre em bando. Lá, passavam pó de arroz, batom, perfume atrás das orelhas (os estojos de pó, batom e perfume eram, na maioria, de ouro), cacarejavam bastante e voltavam, lindas e cheirosas.
Até então todos tinham uma postura bem anos 50: conversas vagas, pouca política, sendo que elas não falavam de quase nada, mas sorriam sem parar; como sorriam. Os volteios na pista só começavam mais tarde, e era muito gentil, da parte dos homens, convidar para dançar cada mulher que estivesse na mesa; num momento de distração, até a sua própria.
Quando começava a dança, geralmente tipo lenta, tudo mudava. Pessoas que se tratavam com uma quase cerimônia juntavam seus corpos -da ponta dos pés à raiz dos cabelos- a tal ponto que por ali não passava nem pensamento. Os rostos se colavam ("cheek to cheek", se chamava), e dependendo do que todos já sabiam, isto é, que A tinha um caso com B, as mãos se entrelaçavam, e enquanto a outra mão (dele) segurava com mais firmeza a cintura (dela), a outra mão (dela) acariciava a nuca (dele); quando se falavam, sentiam a respiração um do outro, tão próximas eram as bocas das orelhas.
Era um adultério explícito sob os olhos de seus próprios cônjuges, todos achando tudo normal. Muitos amores começaram -ou terminaram- ao som de "Night and Day". Fala sério: dá para dançar com os corpos grudados e não pintarem pensamentos altamente eróticos? É claro que não.
Morro de pena das novas gerações que frequentam as raves, que começam na sexta-feira; dançam separados, são 84 beijos por noite, mal se tocando, e transar, só no domingo à noite, quando acaba a rave. Ouso dizer que não levo muita fé no sexo dessa garotada.

ANCELMO GÓIS

Isto é Marina

O GLOBO - 28/03/10 

Semana passada, foram intensificadas, em São Paulo, as gravações de Marina Silva para a campanha eleitoral na TV, com a ajuda do diretor Fernando Meirelles (“Cidade de Deus”).

Parte da equipe trabalha de graça, aproveitando o cenário de outro comercial.

Isto é Marina II

Como a senadora tem alergia a maquiagem, as filmagens têm sido um parto.

Marina também encrencou com as roupas. Perguntou quais eram as grifes dos vestidos e adereços que usaria na gravação, pois só aceita vestir o que pode pagar — e, palavras dela, não é “nenhum fantoche”.

Fator Engenhão

A ideia de se construir ou reformar os 12 estádios da Copa de 2014 com dinheiro privado é, cada vez mais, sonho de uma noite de verão.

A turma privada desconfia de que os estádios não sejam sustentáveis economicamente após a Copa. No caso do Engenhão, erguido no Rio para o Pan de 2007, a manutenção mensal custa de R$ 400 mil a R$ 700 mil.

Porto do Rio

A Cisco, gigante da informática, quer instalar um centro de pesquisa global no Rio.

Um dos locais estudados é a Zona Portuária.

Rádio Petróleo

Ninguém duvida de que há muito petróleo no Campo de Tupi. Mas não é risco zero.

O que se diz nos corredores da estatal é que um dos poços recém-perfurados, o RJS-666, não encontrou óleo.

‘Cofrito’ de Messi

Lionel Messi, 22 anos, o cracaço argentino eleito pela Fifa melhor jogador do mundo em 2009, ergue em sua terra natal, Rosário, na província de Santa Fé, um condomínio para magnatas com área até para ancorar barcos.

Teje presa

Nomvula Mokonyane, governadora de Gauteng, província da África do Sul cuja capital é Johannesburgo, sede do Brasil na Copa, periga não conseguir receber a seleção de Dunga.

É que pode ser presa por...

abuso de velocidade. A governadora deve mais de 17 mil rands (R$ 4,17 mil) em multas.

Dois mandados de prisão só esperam a assinatura do juiz pelo não pagamento das infrações.

Segue...

Nomvula acumula 50 multas, entre 2005 e 2009, segundo a polícia viária local.

Todas por excesso de velocidade.

Quase a metade

Foi-se o tempo em que mulheres não fumavam. Em 1942, causou impacto esta cena do filme “A estranha passageira”, em que Paul Henreid acende um cigarro para Bette Davis.

Dias atrás, em apresentação da Souza Cruz na Apimec-Rio, foi dito que as mulheres já são 48% dos fumantes do Brasil.

A vez do morro

Cabral lança amanhã no PavãoPavãozinho/Cantagalo e da Rocinha o Rio Estado Digital.

É um portal para jovens destas favelas cursarem profissionalizantes, acessarem sites de empregos e postarem currículos.

Cena carioca

Quinta, por volta de 20h, passageiros de um ônibus 623 (Nova América-Penha) chegaram a se deitar a bordo para se proteger de tiros contra o veículo, na altura do Complexo do Alemão.

Depois de segundos de pânico, viram que as balas eram de...

paintball, armas esportivas que disparam tinta. Meu Deus...

Oração dos royalties

Sermão outro dia do padre Marcos Belisário, da Igreja dos Santos Anjos, no Leblon: — Alguém sabe por onde andava o dinheiro dos royalties do Rio? Pelo menos, a Emenda Ibsen serviu para levantar esta lebre.

Onde foram aplicados estes R$ 7 bilhões anuais? Faz sentido.

ZONA FRANCA

A jornalista Dora Kramer lança O poder pelo avesso”, dia 7, na Argumento do Leblon.

Luciana Schwartz Jaroslavsky recebeu a Medalha Tiradentes.

Gabriel Di Blasi lançou a 3aedição de “A propriedade industrial”.

Dedo de Moça lança site para páscoa: dedodemocadocessabores.com.br.

Ary Bergher e Rafael Mattos são os advogados do jogador Adriano.

“O Interrogatório”, com Alexandre Molfati e Xando Graça, reestreia na Casa de Cultura Laura Alvim.

Amanhã será lançado o livro “As melhores seleções brasileiras de todos os tempos”, de Milton Leite, na Travessa do Leblon.

Elymar Santos festeja hoje aniversário de sua mãe, Amelly.

O DOMINGO É de Fernanda de Freitas, 29 anos, a linda atriz que retorna à telinha dia 4 de abril no humorístico “S.O.S.

Emergência”.

Será Evelin, assistente social do hospital da história. Mulher recatada, sem vaidade, Evelin, de repente, fica toda sensual (veja na foto) depois de tomar umas pílulas estimulantes da libido, que os médicos chamam de...

“taradol”.

Benza Deus

NESTE ANO DE tantas celebrações de centenários de brasileiros notáveis, não se deve esquecer de um italiano: o cartunista Angelo Agostini (1843-1910), que veio para São Paulo com 16 anos. Sua contribuição à luta contra a escravidão seria reconhecida, depois do 13 de maio de 1888, até mesmo por Joaquim Nabuco, o líder abolicionista, cujo centenário também se comemora este ano. Nabuco pediu ao caricaturista que se naturalizasse brasileiro, “pois já o era de coração”. Como lembra a historiadora Isabel Lustosa, da Casa de Rui Barbosa, um decreto imperial de 1866 concedeu liberdade aos escravos que se alistassem nas tropas do Exército que iam combater no Paraguai. “Depois da guerra, Agostini denunciaria a contradição que era o Brasil ter, entre seus heróis, negros que voltavam da batalha cobertos de glória para se depararem com as próprias mães sendo açoitadas pelo feitor.” Veja a charge

Sempre ele

Atenção, Corpo de Bombeiros. No Galeão-To m Jobim, tem porta corta-fogo trancada com cadeado.

Fca no embarque internacional do Terminal 1.

Mas não é a única.