domingo, dezembro 05, 2010

VINICIUS TORRES FREIRE

Um ministério para chamar de seu
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SÃO PAULO - 05/12/10


PT "histórico" toma o soro fisiológico do sedento PMDB "autêntico" que, sem cargos bastantes, pode aprontar


A SEMANA confirmou os indícios de que a reforma ministerial de Dilma Rousseff dará uma catadura mais petista ao novo governo. Não faz mais que uma quinzena, imaginava-se que o gabinete teria muitas fuças e focinhos peemedebistas. A presidente eleita de certo modo surpreendeu tanto nas nomeações como na dureza no trato com o PMDB e assemelhados, além de ter começado a anunciar seu ministério bem cedo. O público agora espera ansioso conhecer o programa de governo, escondido durante a campanha.
Os "ministros da casa" são petistas de raiz, Antônio Palocci na Casa Civil e Gilberto Carvalho na Secretaria-Geral da Presidência. Saúde e Educação devem ficar com o PT. A "equipe econômica" é petista praticante, e mesmo o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, se não é simpatizante tem a simpatia dos seus colegas de área. O partido ocupou ainda o problemático Ministério das Comunicações e a importantíssima, mas desprezada, pasta de Ciência e Tecnologia.
Como dizia um clichê recorrente dos anos FHC, o "núcleo duro" do governo é do PT. O PMDB não ocupou os ministérios que pretendia, em especial "ministérios que furam poço", parafraseando a frase imortal de Severino Cavalcanti (PP-PE), presidente da Câmara dos Deputados eleito e também deposto num dos momentos mais nanicos dessa casa do Parlamento, em 2005.
Cavalcanti, amigo da ditadura militar e malufista, reivindicou um dia uma diretoria da Petrobras para o seu curral, mas "uma diretoria que fura poço" (isto é, com dinheiro). O PMDB "autêntico" por ora leva poucos "poços", não muito mais que Turismo, Previdência, Agricultura e Minas e Energia, este último com "infiltrados" da presidente eleita. Por falar em PP, de furar poços e de outros furos, a enrolada e crucial pasta dos Transportes deve ficar com os colegas de Severino do PP.
A dúvida que resta no ar agora é, digamos, o grau de satisfação do consumidor, o PMDB. O partido entrou barulhento na disputa da boquinha, alardeou até um "blocão" no Congresso e, desde então, baixou o tom ou ficou quieto. Blefaram, pedindo muito apenas para levar o suficiente ou o mínimo aceitável, imaginando desde sempre que a conversa com Dilma seria dura? Dado o caráter da turma, duvida-se que o pessoal tenha ficado satisfeito.
Uma alternativa a cadeiras ministeriais são postos estratégicos em diretorias de estatais, autarquias e fundações que dispõem de poços para serem furados, especialmente aquelas que distribuem dinheiros picotados, de difícil fiscalização, ou permitem acomodar nomeações de milhares de capiaus pelo país afora.
Como Dilma mal nomeou seu ministério, ainda não se pode dizer se e onde haverá barganha de segundo escalão. De resto, há ainda que acomodar os amigos de Sérgio Cabral, o governador do Rio (PMDB), os milicianos de Renan Calheiros e cia. (também PMDB), o pessoal do emergente PSB e, enfim, há que arrumar "lembrancinhas" para a arraia miúda partidária restante.
Porém, os partidos da coalizão governista, de qualquer governo, não gostam de restos a pagar nem de calotes fisiológicos. Caso não recebam as encomendas, o que vão aprontar no início do ano legislativo de 2011? Não há almoços, jantares e desfeitas grátis no mundo moralmente nanico do Congresso.

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