quarta-feira, dezembro 08, 2010

FERNANDO DE BARROS E SILVA

Goteira como metafóra
FERNANDO DE BARROS E SILVA

folha de são paulo - 08/12/10

SÃO PAULO - Um cano estourado provocou vazamento de lama no subsolo do Palácio do Planalto. Não é piada. Aconteceu anteontem. Três meses depois de uma reforma que consumiu R$ 111 milhões (muito além do previsto inicialmente) e mais de um ano, o palácio exibe vários sinais de desmazelo: alagamentos em banheiros e na garagem, infiltrações, paredes descascadas, deformações no teto de gesso, fechaduras novas estragadas...
Um dos objetivos da reforma era eliminar os "puxadinhos" que descaracterizaram a arquitetura original. Mas parece que o Brasil voltou pela porta dos fundos. O representante de Oscar Niemeyer em Brasília foi até gentil: "Faltou refinamento aos órgãos responsáveis para fazer um restauro de qualidade".
De goteiras e infiltrações o senador Gim Argello (PTB-DF) entende. O relator do Orçamento da União destinou R$ 3 milhões em emendas de sua cota individual para entidades fantasmas do DF, conforme revelou "O Estado de S. Paulo".
Em geral, funciona assim: o parlamentar faz uma emenda reservando recursos públicos para shows ou eventos culturais; o dinheiro é destinado a um instituto fantasma; este, por sua vez, repassa a verba para empresas fictícias em nome de laranjas. Tudo, como se dizia antigamente, "numa nice". O governo não fiscaliza nada.
A Folha noticiou ontem que Argello incluiu entre suas emendas para 2011 um repasse de R$ 250 mil para a ONG de uma amiga. E que amiga: condenada por evasão de divisas no escândalo dos Anões do Orçamento, nos anos 90, ela ficou presa por seis meses em 2007. Este ano, foi impedida graças à Lei da Ficha Limpa de disputar uma vaga à Câmara Legislativa do DF.
Ontem, Argello renunciou à Comissão de Orçamento. É muito pouco. Virão outros "gins" no lugar. Até quando vamos tolerar as goteiras das emendas e o "puxadinho" de descalabros que é a Comissão do Orçamento? É preciso uma reforma. Mas não como a do Planalto.

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