domingo, agosto 08, 2010

DORA KRAMER

No macio azul do mar


DORA KRAMER
O ESTADO DE SÃO PAULO - 08/08/10
O alto comando da campanha de Dilma Rous seff, aquele residente um andar abaixo do ocupado pelo presidente Luiz Inácio da Silva, gostou do debate realizado pela TV Ban dei rantes não só porque a candidata sobreviveu sem ferimentos graves.
O que agradou mesmo foi o clima “morninho”, como definiu menos de 24 horas depois um mandachuva da equipe.
“Para nós está bom assim, o rio correndo para o mar. Se continuar no mesmo ritmo a eleição está ganha.”
Quer dizer, sem sobressaltos, sem lances espetaculares, sem arroubos emocionantes, sem movimentos bruscos. Um arroz com feijão bem feito parece ser a receita predileta da campanha petista, cujo coordenador em tela acha que já esgotou sua cota de tiros no pé.
“Demos todos os que tínhamos direito.” Por exemplo, o registro na Justiça Eleitoral do documento “A grande transformação” aprovado em congresso do PT, como programa de governo, com restrições à liberdade de imprensa e violações ao direito de propriedade entre outros pontos eivados daquele modo todo especial que o PT tem de espantar eleitor em seus momentos xiitas.
Justo com Dilma, que não pode, segundo avaliação interna, dar margem a interpretações de que se eleita fará um governo marcadamente de esquerda. “Se Lula não pôde, ela muito menos. Não terá espaço para concessões à esquerda.”
Pelo mesmo raciocínio do quanto mais frio melhor, boa parte do estoque de tiros no pé foi gasta nos primeiros 15 dias depois que Dilma deixou o ministério.
Ela vestiu o figurino de combate, “acreditou” no papel e saiu de pau e pedra para cima do então pré-candidato do PSDB, José Serra. Respondia a tudo, polemizava, fazia frases (“lobo em pele de cordeiro”), brigava sozinha, perdia o em bate para si e o tucano só fazendo pose de bom moço.
Não falava mal de Lula e chegou a espalhar pânico nas hostes inimigas. “Ele estava assustadoramente perfeito.”
O que foi assim tão perfeito? A atitude amena, que deixava os petistas na difícil situação de precisar criticar um adversário que elogiava o presidente. Foi na época em que Dilma repetia que Serra era ambíguo sobre ser ou não oposição. “Era um rebate fraco, nada convincente.”
De acordo com a análise do comando petista, as coisas melhoraram depois que a candidata parou de responder a José Serra e ao mesmo tempo o tucano endureceu o discurso.
Na campanha governista o que se diz é que quanto mais oposicionista Serra se mostrar, melhor para Dilma.
Isso tanto pode ser a mais pura verdade como pode ser também um truque para levar o oponente para o lado que mais interessa.
Como distinguir? Im pos sí vel, melhor mudar de assunto.
Falar, por exemplo, sobre a expectativa em relação ao programa do horário eleitoral que estreia daqui a dez dias.
O centro dessa questão obviamente é o presidente Lu la. A campanha quer dosar sua participação. Nem tanto que faça a candidata desaparecer nem tão pouco que não seja suficiente para dar uma deslanchada nas pesquisas.
Mas Lula em qualquer dose não é bom?
Depende.
O QG petista cita o exemplo recente da campanha para a prefeitura de Belo Horizonte. Tanto o então governador Aécio Neves e o então prefeito Fernando Pimentel apareceram na propaganda que o candidato Márcio Lacerda sumiu. Por pouco não perdeu a eleição.
Portanto, overdose de Lula nem pensar. São 45 dias de programas. Será feito um teste: dependendo do resultado nas primeiras duas semanas, a participação do presidente aumenta ou diminui.
Retomando aquela ideia do início de que a “eleição está ganha” se tudo transcorrer em ambiente morno – o que contraria o argumento de que a agressividade da oposição favorece Dilma –, vamos conferir as contas em relação à possibilidade de vitória no primeiro turno.
Há dois tipos de avaliação. A da maioria, mais otimista, aposta em 50% de chance. A do nosso interlocutor, porta-voz dos prudentes, cai para 5%.
Cálculo de gato escaldado, lembrando que em 2002 e 2006 as pesquisas indicavam vitória de Lula no primeiro turno e nas duas vezes a eleição foi decidida no segundo.
Temente a água fria, não se ilude facilmente: “Eleição en gana muito a gente.”

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