segunda-feira, maio 03, 2010

BRASIL S/A

Caça ao eleitor
Liana Verdini

CORREIO BRAZILIENSE - 03/05/10

Resultado da Previdência, com um rombo considerável, foi o que mais contribuiu para o buraco nas contas públicas do governo como um todo


Está aberta a temporada de caça ao eleitor desavisado. O que os políticos buscam é conquistar a simpatia dessa coisa esquisita que é o ser humano brasileiro, que muito reclama, pouco cobra e sempre quer levar vantagem em tudo, certo? O momento, portanto, é de abrir o saco de bondades e deixar que as pessoas aproveitem o ano eleitoral da melhor forma possível.

Vejam: foi aprovado na semana passada na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado um projeto de lei que permite ao empregador deduzir do Imposto de Renda da Pessoa Física toda despesa com plano de saúde pago para o trabalhador doméstico. Se nenhum parlamentar pedir votação em plenário, o projeto seguirá direto para apreciação da Câmara ainda este mês. A proposta é injusta? Não. Mas só avança em ano eleitoral, graças a um súbito senso de dever que toma conta dos políticos nesse período.

Outro projeto, também oriundo do Senado, mas já em análise na Câmara, é um que libera o saldo da conta individual do PIS-Pasep para o trabalhador desempregado há pelo menos três meses. Para o senador Paulo Paim (PT-RS), autor da proposta, é importante reforçar o orçamento do desempregado, já que o seguro-desemprego cobre no máximo cinco meses e o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), em muitos casos, é insuficiente para fazer frente às despesas familiares em caso de longos períodos de desemprego. Mais uma vez: injusto? Claro que não. E por que não veio antes? Ninguém pensou nos desempregados deste país?

Mexendo com a Previdência
Os exemplos são muitos, mas vamos a mais dois: há uma medida provisória em análise na Câmara para reajustar em 6,14% o valor das aposentadorias superiores a um salário mínimo. Os deputados querem aumentar o percentual de correção. As centrais sindicais, por exemplo, defendem um índice de 7,7%, que corresponderia à recomposição da inflação mais um ganho equivalente a 80% do aumento do Produto Interno Bruto (PIB). Já o relator da proposta e líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), quer propor a taxa de 7%.

E outra que mexe com a Previdência é uma emenda apresentada pelo líder Fernando Coruja (PPS-SC) à Medida Provisória 475/09, essa do reajuste dos aposentados explicada acima. A proposta põe um fim ao fator previdenciário, que reduz as aposentadorias do regime do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ao qual são vinculados trabalhadores do setor privado e servidores públicos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Depois de indeferida preliminarmente pelo presidente da Câmara, Michel Temer, alegando que o tema da emenda é diferente do da MP, o PPS aprovou um recurso em plenário para que todos os deputados analisem e votem a emenda.

Números não divulgados
Todas as propostas citadas acima não parecem injustas sob o ponto de vista social. A questão é que bolso e conta bancária têm limite. Tanto que na sexta-feira o Banco Central anunciou o pior resultado das contas públicas para os meses de março e para o primeiro trimestre desde 2001, quando a série histórica foi iniciada. E o governo corre, inclusive, o risco de não cumprir a meta de superavit primário prometida para 2010. Bem ruim, não? Mas o governo bem poderia cortar despesas para fazer esse carinho nos eleitores…

Enquanto isso não acontece, o governo está fazendo como o ex-ministro Rubens Ricúpero ensinou: “O que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”. Não se sabe se é por seguir esse conselho ou não, mas no mês passado o Ministério da Previdência não divulgou as informações do INSS, como usualmente fazia. Problema da agenda atribulada do novo ministro, Carlos Eduardo Gabas, que faz questão de divulgar ele próprio o tal resultado, ao lado do novo secretário de Políticas de Previdência Social, Fernando Rodrigues. Só não combinou com o Ministério da Fazenda, que, ignorando o desejo do colega, revelou na semana passada o tamanho do rombo nessas contas.

Deficit de R$ 6,7 bilhões
De acordo com os dados do Tesouro Nacional, o rombo da Previdência Social foi decisivo para o péssimo resultado fiscal, levando até a um resultado primário deficitário em março no valor de R$ 216 milhões. Só a Previdência teve um deficit de R$ 6,726 bilhões no mês em questão. É um resultado surpreendente, considerando que em fevereiro o INSS havia registrado um rombo de R$ 3,781 bilhões, praticamente igual ao de janeiro, de R$ 3,734 bilhões. Sem a entrevista, ficou-se sem as explicações para tamanha piora.

Para este ano, o deficit estimado pela Previdência é de R$ 54 bilhões. Esse buraco diz respeito somente à previdência dos trabalhadores da iniciativa privada, com benefício médio de R$ 714. Com relação aos servidores públicos a situação também não é confortável para o governo e o deficit não para de crescer. Segundo dados do Ministério do Planejamento, em 2009, o deficit nessa conta, coberto pelo Tesouro Nacional, foi de R$ 38,1 bilhões. Em 2001, foi de R$ 22,8 bilhões. Bom lembrar que o valor médio das aposentadorias dos servidores e militares é de R$ 5 mil.

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